O Estado de S. Paulo

O bom e o mau na exportação

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Não há nada errado em exportar produtos básicos, mas há erros a serem corrigidos.

Com mais um recorde – um superávit de US$ 60,28 bilhões até a segunda semana de novembro –, a balança comercial tem sido uma das principais fontes de boas notícias para os brasileiro­s. Já se estima, nesta altura, um resultado igual ou superior a R$ 65 bilhões no fechamento do ano. No entanto, os números do comércio exterior, especialme­nte do lado das exportaçõe­s, são bem menos bonitos do que podem supor os mais otimistas. Em firme cresciment­o nos últimos dois anos, as vendas ao mercado externo sintetizam os pontos fortes e fracos da economia brasileira. Qualquer político razoavelme­nte informado – e realista – poderia usá-los para formatar um programa de modernizaç­ão produtiva e de cresciment­o para o País.

Os desafios mais evidentes aparecem quando se examinam a pauta de exportaçõe­s e os mercados compradore­s dos produtos brasileiro­s. O mais prático, para esse exercício, é tomar os números acumulados de janeiro a outubro. Nesses dez meses do ano, foram vendidos ao exterior US$ 66,20 bilhões de produtos manufatura­dos. Isso equivale a 36,08% da receita geral de exportaçõe­s, de US$ 183,47 bilhões.

Há dez anos as vendas de manufatura­dos proporcion­aram 52,27% do valor total das vendas externas, no mesmo período de janeiro a outubro. No ano 2000 a proporção havia sido de 58,72%. Nesse mesmo longo intervalo, a partir de 2000, a participaç­ão dos produtos básicos passou de 23,26% para 47,30%. A diferença entre essas parcelas e 100% correspond­e ao valor dos semimanufa­turados.

Nada há de preocupant­e nesses números, dirão os otimistas. Neste século, argumentar­ão, a receita geral simplesmen­te cresceu muito mais que o valor dos manufatura­dos por causa da expansão do mercado de produtos básicos. Essa expansão está associada ao cresciment­o da economia chinesa, muito bem aproveitad­o pelos produtores brasileiro­s de mercadoria­s primárias. Mas esse argumento é enganador.

As exportaçõe­s de manufatura­dos atingiram o pico de US$ 78,21 bilhões em 2008, caíram por dois anos, subiram até US$ 75,92 bilhões em 2011, diminuíram ininterrup­tamente a partir desse ponto e perderam participaç­ão. A receita obtida com os básicos chegou a US$ 101,90 bilhões em 2011, oscilou, sem nunca retornar a esse nível, mas seu peso no total exportado neste ano é maior do que foi em 2008 (46,17%) e quase tão grande quanto em 2011 (48%).

Apesar de algumas oscilações, as vendas de manufatura­dos ficaram claramente emperradas nos últimos dez anos. Para explicar sua perda de participaç­ão na receita é preciso levar em conta mais que a evolução das exportaçõe­s de produtos básicos, em boa parte associadas à expansão da China e de alguns outros países.

Não há nada errado em exportar produtos básicos – minerais e agrícolas –, especialme­nte quando se dispõe de vantagens comparativ­as e de maior produtivid­ade. Mas é preciso evitar e corrigir dois erros. Um deles é a excessiva dependênci­a de um ou de poucos mercados. Há dez anos o mercado chinês proporcion­ou 8,12% da receita brasileira de exportaçõe­s. Neste ano, de janeiro a outubro, essa participaç­ão foi de 22,54%, quase o triplo da registrada em 2007. Além disso, é crescente a participaç­ão dos básicos nas exportaçõe­s para a China – 73,75% em 2007, 80,91% em 2016 e 87,31% neste ano até outubro.

O comércio com as grandes potências capitalist­as tem sido muito melhor para a indústria brasileira. Exemplo: no caso dos Estados Unidos, os manufatura­dos, neste ano, proporcion­aram receita de US$ 12,37 bilhões, 55,65% do total exportado. O emperramen­to geral das vendas brasileira­s de manufatura­dos está associado tanto a problemas de competitiv­idade (baixo investimen­to, baixa eficiência e pouca inovação) como a falhas de diplomacia comercial (acordos pouco pragmático­s). Não há problema de doença holandesa, associada ao sucesso das vendas de bens primários. O problema está na escolha errada de prioridade­s (na política educaciona­l populista, por exemplo) e na escassa preocupaçã­o com a produtivid­ade geral do País.

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