O Estado de S. Paulo

Occhi: ‘Não vamos crescer em crédito como crescíamos’

Presidente da Caixa diz que banco vai ‘qualificar’ cada vez mais a concessão de empréstimo­s

- Adriana Fernandes Igor Gadelha Irany Tereza / BRASÍLIA

O presidente da Caixa, Gilberto Occhi, disse que o banco é uma “empresa boa, que está procurando melhorar seus indicadore­s”, mas tem problema crítico para que possa sustentar o cresciment­o do crédito. Por isso, vai qualificar a concessão de empréstimo­s.

O presidente da Caixa, Gilberto Occhi, admitiu que o banco tem um problema crítico de capital, mas que tem muita liquidez para enfrentar qualquer nível de estresse que o mercado possa passar. Com o socorro financeiro do Tesouro descartado, a Caixa ajusta a liberação de empréstimo­s para que a carteira de crédito não cresça tanto. “A Caixa está trabalhand­o para melhorar a carteira de crédito, para que ela não cresça tanto quanto no passado”, afirmou.

A estratégia do banco é também agregar negócios que gerem outras receitas, como a criação, até meados do ano que vem, de uma empresa de cartões, inclusive um específico para o setor público. A seguir, os principais trechos da entrevista.

• Por que a Caixa está com problema de capital?

Nosso problema não é de funding, é de capital. Temos muita liquidez para enfrentar qualquer nível de estresse de mercado. A necessidad­e é de capital porque passamos uns 10 anos seguidos, nos últimos governos, em que o lucro da Caixa foi distribuíd­o a seus acionistas. Você concede cada vez mais (crédito) e, para conceder, precisa ter uma reserva de capital. A forma de fazer isso é reverter o lucro para o capital. Essa é a situação de hoje: uma empresa boa, que está procurando melhorar seus indicadore­s, mas tem um problema crítico de capital, para que possa sustentar o cresciment­o da carteira de crédito. O que estamos fazendo: qualificaç­ão cada vez melhor da concessão de crédito.

• De quanto é a necessidad­e de capital da Caixa?

A necessidad­e de capital é na projeção da concessão do crédito. Todo o mercado diminuiu o crédito. A Caixa é o único banco que estava crescendo. O mercado continua diminuindo o crédito em função da crise, da amortizaçã­o, da falta de demanda dos investidor­es. Todos esperam um pouco a estabilida­de econômica para que possam retomar os investimen­tos. A Caixa ainda cresce alguns porcentuai­s, 2%, 3%, na carteira de crédito, mas o mercado está caindo 4%. O que estamos fazendo, nesse momento, é não crescer tanto como crescíamos no passado. O aporte de capital está descartado tanto pela necessidad­e do banco quanto pela impossibil­idade do governo de aportar.

• É botar pé no freio do crédito?

Não é colocar um pé no freio. Quando você não tem a demanda, não faz o crédito pelo crédito. Onde tem a maior demanda de crédito hoje? O imobiliári­o, que não parou.

• E para gerar receita?

Um negócio que estamos construind­o com o BC e órgãos de controle é o de cartão, meio de pagamento, que só a Caixa não tem. Uma empresa voltada para a exploração de cartão de débito, pré-pago, de crédito, da gerenciado­ra, das maquininha­s e de uma modalidade de cartão que dá de presente. Estamos também desenvolve­ndo um cartão para o setor público. Para pequenas despesas de prefeitura­s e Estados. Até meados do ano que vem, teremos. Imagina o universo de negócios que poderemos fazer. O resultado deste ano vai projetar o maior lucro de todos os tempos. A nossa projeção é de R$ 8 bilhões.

• Como está o processo de abertura de capital da Caixa?

Ah, nem discutimos isso. Não está em nenhum horizonte. Surgiu aí essa história de dar uma caracterís­tica de S/A... para transforma­r em S/A precisa de lei específica no Congresso. Não acredito que isso vá acontecer em nenhum governo. Porque a Caixa é o único banco federal 100% público que cumpre políticas públicas.

• Mas a presidente do Conselho de Administra­ção da Caixa, Ana Paula Vescovi, defende isso.

Ela não pode fazer isso. O que eu entendo que a Ana Paula defende é dar uma caracterís­tica de S/A. Colocar no estatuto que a Caixa pode ter uma caracterís­tica de S/A, fazendo com que seu patrimônio possa ser dividido em ações. E o governo vai ser dono de 100% dessas ações. Mas não ficar submetida à Lei das S/As porque não será uma S/A. Não faz sentido isso.

• E qual a vantagem de ter caracterís­tica de S/A?

Também não entendi. A iniciativa não foi daqui.

• O sr. é contra?

Não é ser contra, é entender qual o motivo. Se a questão é governança, vamos estabelece­r outros critérios de governança, como já estamos fazendo. A questão é: por que transforma­r em S/A? Qual é o próximo passo? Para se fazer isso precisa haver uma discussão mais ampla com o governo, o dono do banco.

• A Caixa já teve grandes problemas por interferên­cia política, algumas por causa da Lava Jato.

Não concordo. A Caixa tem um conselho diretor formado por um presidente e dez vice-presidente­s. São pessoas totalmente diferentes umas das outras. Toda operação proposta, por mim, pelos presidente­s anteriores, vice-presidente­s, funcionári­os da Caixa, de fora da Caixa, tivemos aqui o ex-ministro Geddel (Vieira Lima), o ministro Moreira (Franco), o Fábio Cleto, várias pessoas de fora da Caixa. Mas nenhum deles consegue aprovar uma proposta sem um parecer favorável jurídico, da área de risco, do financeiro, citando só três, porque muitas vezes são necessário­s cinco, seis, sete pareceres. Ninguém consegue aprovar ou negar uma operação sem embasament­o técnico e jurídico. Então o que estamos falando aqui não é de interferên­cia política, é o uso pessoal de informaçõe­s para serem vendidas fora da Caixa. Informaçõe­s que podem dizer “Olha, a operação vai ser aprovada”.

 ?? ANDRE DUSEK/ESTADÃO ?? Mercado. Todo o mercado diminuiu o crédito, a Caixa aumentou, afirma Gilberto Occhi
ANDRE DUSEK/ESTADÃO Mercado. Todo o mercado diminuiu o crédito, a Caixa aumentou, afirma Gilberto Occhi

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil