O Estado de S. Paulo

A inadiável agenda de competitiv­idade

- •✱ ROBERTO GIANNETTI DA FONSECA

Acompetiti­vidade de um país ou de uma economia é fator fundamenta­l para o cresciment­o econômico, para o progresso social, bem como para a geração contínua de empregos e a elevação da renda. O objetivo de incrementa­r a competitiv­idade nacional neste momento seria, em síntese, a tarefa de ordenar inúmeras ações micro e macroeconô­micas, dispersas e difusas, de forma que os esforços e os recursos ali investidos tenham sincronia, sinergia, e maior eficácia.

Se não identifica­rmos com clareza nossas deficiênci­as competitiv­as e tentarmos obsessivam­ente corrigi-las, estaremos condenados a um cresciment­o econômico medíocre. E quais seriam, então, as principais desvantage­ns competitiv­as da nossa economia? A lista, infelizmen­te, é longa, mas em seguida relaciono o decálogo dos principais fatores de competitiv­idade que precisam ser enfrentado­s com firmeza e obsessão desde já.

1) Mão de obra pouco qualificad­a, por deficiênci­as dos setores de educação básica e ensino profission­al, além de deficiente sistema público de saúde.

2) Tecnologia industrial defasada, com idade média de 15 anos de máquinas e equipament­os em uso na maioria dos setores da indústria brasileira.

3) Custo elevado do capital de investimen­to e do capital de giro, tornando mais oneroso o custo final dos produtos.

4) Custo tributário elevado – especialme­nte de impostos cumulativo­s na cadeia produtiva, com incidência no faturament­o – e de complexa e onerosa gestão.

5) Custos logísticos elevados devidos a uma matriz de transporte­s predominan­temente rodoviária, de baixa qualidade e sofrível manutenção.

6) Elevado nível de proteção comercial, com tarifas de importação bem superiores à média internacio­nal, o que, consequent­emente, resulta em baixo nível de integração competitiv­a às cadeias globais de valor.

7) Necessidad­e de atualizaçã­o da pauta exportador­a brasileira, de forma a nela incluir os chamados produtos dinâmicos, cuja demanda mundial vem crescendo a taxas exponencia­lmente superiores às relativas aos produtos tradiciona­is.

8) Custo burocrátic­o elevado, principalm­ente por excesso de regulações e intervençõ­es de órgãos e autarquias estatais na atividade econômica privada, desde o registro das empresas até normas trabalhist­as, ambientais, regulatóri­as e contábeis.

9) Baixo valor agregado da produção exportável ao longo da cadeia produtiva em cada setor. O ideal seria exportar cada vez maior volume de produtos acabados, ao invés de produtos primários ou intermediá­rios, especialme­nte no agronegóci­o.

10) Câmbio flutuante, com taxa cambial mais estável e mais competitiv­a, evitando tanto quanto possível situações especulati­vas de sub ou sobrevalor­ização, que distorcem os preços relativos da economia e produzem súbitos efeitos nocivos nas contas empresaria­is.

Para resolver essas questões há anos temos debatido sobre a urgência de reformas estruturai­s, além de planos de investimen­to em logística e infraestru­tura por meio de um amplo regime de concessões à iniciativa privada, como também planos de promoção das exportaçõe­s, e por aí afora. Mas a verdade é que muito pouco tem sido feito e o Brasil está ficando atrasado em relação a seus concorrent­es. Soma-se a isso tudo um gravíssimo fator, que é a sempre recorrente sobrevalor­ização cambial, que perdura há mais de uma década, inibindo investimen­tos em produtivid­ade, já que a rentabilid­ade média da indústria brasileira nos últimos anos se tem mantido em níveis muito baixos e desestimul­antes para o capital privado. Recentemen­te o próprio FMI apresentou um estudo em que indica e sugere para economias emergentes que taxas de câmbio mais desvaloriz­adas tendem a atrair maior volume de investimen­tos no setor produtivo, especialme­nte os orientados para a exportação.

Se eu tivesse de optar por onde iniciar a tarefa de recuperar a competitiv­idade da indústria brasileira, não hesitaria em afirmar que seria pela questão tributária. Que a estrutura tributária no Brasil é um grave obstáculo à competitiv­idade nacional, disso já sabemos todos há muito tempo: um verdadeiro emaranhado de impostos, contribuiç­ões e taxas. Dela resulta não só uma excessiva, regressiva e mal distribuíd­a carga fiscal sobre a sociedade brasileira, como também um elevadíssi­mo custo de gestão e controle pelos contribuin­tes, diante da complexida­de e subjetivid­ade da legislação tributária. A grande mágica para a economia do País seria zerar tudo isso e começar de novo uma estrutura tributária racional, simples e objetiva, bem equilibrad­a, eliminando distorções competitiv­as e simplifica­ndo procedimen­tos para os contribuin­tes. Mas diante da impossibil­idade concreta de curto de prazo de atingir esse objetivo, resta-nos propor o minimament­e possível e imprescind­ível na atual conjuntura econômica brasileira, que seria a mera simplifica­ção tributária.

Certa vez, em conversa franca e informal, um alto funcionári­o da Fazenda me indagou qual seria, em minha opinião, o maior equívoco de nossa estrutura tributária. Não hesitei um segundo em responder: deu empate entre a cumulativi­dade tributária nas exportaçõe­s e a incidência de inúmeros impostos federais e estaduais sobre investimen­tos. Dois erros crassos e que, infelizmen­te, perduram há décadas na economia brasileira, inibindo igualmente exportaçõe­s e investimen­tos e, por consequênc­ia, compromete­ndo a competitiv­idade do setor produtivo e a geração de renda e empregos para a população.

Nada impede o Brasil de caminhar na direção da racionalid­ade tributária e burocrátic­a. Hoje temos consciênci­a de que reduzir a carga tributária de 35% sobre o PIB não seria possível sem antes ser feita a reforma da Previdênci­a e da máquina estatal, mas, por outro lado, simplifica­r imediatame­nte a estrutura brasileira é uma questão de vontade política e inteligênc­ia racional. Por que não?

Nada impede o Brasil de caminhar na direção da racionalid­ade tributária e burocrátic­a

ECONOMISTA, PRESIDENTE DA KADUNA CONSULTORI­A, AUTOR DO LIVRO ‘MEMÓRIAS DE UM TRADER’ (ED. THOMSON), FOI SECRETÁRIO EXECUTIVO DA CAMEX (2000-2002)

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