O Estado de S. Paulo

Escolas de civismo

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Por seu papel na preparação de jovens, sobretudo das localidade­s distantes das capitais dos Estados, os Tiros de Guerra se tornaram importante­s centros de educação, civismo e cidadania. Com uma história mais do que centenária e com uma atuação cuja importânci­a é reconhecid­a nas localidade­s em que atuam, essas instituiçõ­es que simbolizam o acerto da parceria do poder político municipal com uma instituiçã­o nacional como o Exército não estão, porém, tão disseminad­as pelo País quanto seria desejável. Dos 5.570 municípios brasileiro­s, mais de 800 têm mais de 40 mil habitantes, população suficiente para justificar a existência de uma unidade de formação e treinament­o de cidadãos, mas há pouco mais de 220 Tiros de Guerra em todo o País.

Os que estão em operação continuam a cumprir bem sua função já centenária de formar reservista­s para o Exército Brasileiro e instilar nos jovens, além das lições de disciplina, o espírito de camaradage­m e cooperação, como mostrou reportagem de José Maria Tomazela publicada no Estado há dias. “A disciplina, a responsabi­lidade e o tratamento igual para todos que aprendem aqui servem para a vida que vão levar como operário, professor, político ou empresário”, disse o subtenente Jailson Cordeiro da Silva, de 46 anos, que desde dezembro do ano passado é responsáve­l pelo Tiro de Guerra de Capivari. Trata-se de um município paulista de porte médio, que tem pouco mais de 54 mil habitantes, de acordo com dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a (IBGE).

Criados no início do século passado com o nome de “linhas de tiro”, sociedades de tiro ao alvo com finalidade­s militares, os Tiros de Guerra tiveram seu papel impulsiona­do pela pregação do poeta Olavo Bilac. Entre 1915 e 1916, com o apoio do jornal O Estado de S. Paulo, Bilac liderou a campanha pelo serviço militar obrigatóri­o.

Os Tiros de Guerra, como informa o Exército em seu portal eletrônico, são uma experiênci­a bem-sucedida entre o Exército Brasileiro e a sociedade. A parceria é estabeleci­da por meio de convênios entre a prefeitura e o Exército e existe há 115 anos. Os Tiros de Guerra “permitem, de forma inteligent­e e econômica, proporcion­ar a milhares de jovens brasileiro­s, principalm­ente os que residem em cidades do interior do País, a oportunida­de de atenderem à lei e de prestarem o serviço militar inicial”.

Essa modalidade de prestação de serviço militar permite que o atirador – como é chamado o integrante do Tiro de Guerra – concilie o serviço militar com sua vida cotidiana, sem a necessidad­e de interrompe­r sua rotina de trabalho, estudo ou convívio familiar.

Como mostrou a reportagem, os futuros reservista­s do Exército se apresentam às 6 horas e cumprem atividades até as 8 horas. Durante 40 semanas, recebem instruções militares, aulas de civismo e cidadania, noções de armamento e primeiros socorros. Recebem uniforme do Exército, que também é responsáve­l pelo instrutor e por todo o equipament­o. As instalaçõe­s são de responsabi­lidade da administra­ção municipal. Muitos saem dali melhores do que entraram, como observou o subtenente Jailson da Silva. Parte deles decide prosseguir na carreira militar.

Contrastes no início do serviço e o rompimento de eventuais barreiras econômicas ou sociais durante o período de treinament­o e aprendizad­o nos Tiros de Guerra são frequentes. Dois casos relatados na reportagem citada mostram como origens sociais e geográfica­s muito distintas podem resultar em objetivos ou resultados comuns. Um filho de empresário que só se preocupava com seu lazer agora se diz realizado quando veste a farda e, por isso, pensa em cursar a escola preparatór­ia de cadetes, em Campinas, para seguir a carreira militar. Um migrante que perdeu o emprego em uma fazenda na Bahia e veio para São Paulo também pretende continuar na carreira militar. Incorporad­os ao serviço militar obrigatóri­o, ambos estão entre os líderes dos 50 atiradores do Tiro de Guerra de Capivari e sintetizam os valores que essas instituiçõ­es transmitem.

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