A volta dos lançamentos
Com o Minha Casa Minha Vida puxando o mercado, empresas voltadas ao médio e alto padrão agora começam a tirar grandes projetos do papel
Em mais um sinal positivo, empresas tiram do papel grandes projetos de médio e alto padrão no momento em que empreendimentos do Minha Casa Minha Vida já impulsionam o setor
Os lançamentos imobiliários em São Paulo cresceram 9% no acumulado de 2017 em relação ao mesmo período de 2016. Até agosto, mês do último levantamento do Sindicato da Habitação (Secovi-SP), as vendas registravam aumento de 20,8%. Profissionais do mercado lembram, no entanto, que 2015 e 2016 foram anos excepcionalmente ruins para o segmento.
O presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), Flavio Amary, acredita que a resposta aos indicadores macroeconômicos tem sido satisfatória. “Os juros caíram, a inflação está baixa, nosso PIB vai crescer, ainda que pouco. O cenário é favorável e impulsiona novos projetos.”
E eles começam a ser notados. Nos últimos dois meses, a Cyrela lançou quatro empreendimentos na capital. Um deles, na região da Represa de Guarapiranga. A empresa informa ter vendido 151 das 188 unidades em uma semana. Outros dois estão com 44% e 33% dos apartamentos comercializados, segundo o diretor de incorporação da companhia, Eduardo Leite.
Ele conta sentir mudança no comportamento do cliente. “Vemos nos plantões que a disposição para visitas aumentou bastante, sobretudo nos últimos meses.” O edifício Quadra Greenwich, na Bela Vista, recebeu em um mês cerca de 700 interessados. O início das assinaturas de contrato está previsto para os próximos dias.
A Tegra vai lançar ainda em 2017 três empreendimentos. O Pin Home Design, torre única com apartamentos a partir de 71 m², fica a menos de 200 metros da estação de metrô Fradique Coutinho, em Pinheiros. A aposta do projeto de alto padrão é no design e na localização. A região é conhecida pelas atrações gastronômicas e culturais.
O Caminhos da Lapa, também da Tegra, tem duas torres, com 400 unidades de 104 m² ou 136 m². Em 2018, a empresa fará 18 lançamentos em São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro.
Desde julho, a Gafisa, outra das 11 incorporadoras listadas na bolsa, fez quatro lançamentos, três na região metropolitana de São Paulo. Para o professor de Real Estate da USP João Rocha Lima, esses projetos são sinais de recuperação.
“É relevante notar que são grandes empreendimentos. Isso denota que as incorporadoras estão confiantes em lançamentos expressivos, porque representam um volume de vendas muito significativo”, diz.
Estande. O empresário Rodrigo Tonelli, de 44 anos, passou um ano e meio pesquisando preços. Ele estava disposto a comprar um apartamento usado, mas mudou de ideia ao visitar um estande da Tegra na Vila Anastácio, zona oeste. “Fiz uma proposta, eles aceitaram. Senti que estavam flexíveis e fechei.” A unidade de 80 metros quadrados, três quartos, sendo um com varanda, foi negociada por R$ 650 mil. A entrega é para 2020.
Tonelli é parte de uma demanda que vinha sendo reprimida há três anos, afirma Rocha Lima. “As pessoas não desistem da compra, retardam . À medida que percebem a melhora da atividade econômica e sentem que não perderão o emprego, retomam o que adiaram.”
Na mesa de negociação, o momento é favorável ao cliente. A razão é que o estoque atual, que levaria 14,6 meses para ser esgotado, é significativo. Mas um componente novo entra no cenário: como as incorporadoras passaram três anos fazendo poucos lançamentos, operadores imobiliários preveem um hiato entre a oferta de unidades e a demanda de clientes.
O ciclo de uma incorporação é longo. Da compra do terreno à entrega das chaves, passam-se, em média, cinco anos. Logo, os lançamentos atuais serão entregues após 2020 e podem não ser suficientes para atender os aqueles que decidirem voltar às compras.
Vice-presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Renato Ventura confirma a tendência. Lembra, porém, que é impossível precisar o tamanho do descolamento. “Tudo vai depender da manutenção da confiança e da volta do crédito. E temos eleições em 2018, não sabemos o que está por vir.”
Em caso de confirmação do desequilíbrio na oferta e na demanda, Amary aposta em um novo ciclo de valorização imobiliária. No entanto, para o diretor da Embraesp, Ricardo Fincatti, independentemente da conjuntura, não há espaço para elevação acentuada de preços. “Nós já atingimos patamares muito altos. Em áreas centrais da cidade o metro quadrado ainda é de R$ 10 mil a R$ 16 mil.”
Rocha Lima diz que as empresas não podem apostar na falta de estoque, ainda que futura. De acordo com ele, uma família de renda média leva de oito a dez anos para formar o capital necessário para a aquisição da casa própria. A cada aumento de 10% no valor do imóvel, acrescentam-se mais cinco anos no tempo de poupança. “Seria uma aventura forçar a mão durante uma recuperação que ainda se ensaia. O efeito poderia ser contrário: mais alguns anos de demanda reprimida.”
Um sinal dessa demanda reprimida vem do segmento econômico. Os imóveis de até R$ 240 mil lideraram quase todos os indicadores de agosto. E as empresas que constroem moradias populares enquadradas no Minha Casa Minha Vida puxam a recuperação do setor. No terceiro trimestre, três das 11 incorporadoras listadas em bolsa lançaram R$ 2 bilhões em empreendimentos. As vendas no período totalizaram R$ 2,1 bilhões, alta de 23,5%.