Madrastas poderão constar em certidão
Sociedade. Reconhecimento de condição socioafetiva dá os mesmos direitos e obrigações oferecidos a filho biológico ou adotivo; regulamentação ainda vale para barriga de aluguel e permite registrar a criança na cidade onde a mãe habita. Uso de CPF é amplia
Começaram a valer ontem novas regras do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para emissão de certidões de nascimento, casamento e óbito. Entre as principais mudanças, está a regra que permite o reconhecimento da paternidade e da maternidade socioafetiva sem que seja necessária decisão judicial. Esse tipo de vínculo acontece, por exemplo, quando padrastos ou madrastas são responsáveis pela criação de um enteado e querem formalizar isso. O reconhecimento estabelece os mesmos direitos e obrigações legais que o cônjuge tem em relação ao filho. E o enteado passa a contar com os mesmos direitos de um filho biológico ou adotivo.
Até agora, era preciso recorrer à Justiça para ter o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva – apenas alguns Estados previam a possibilidade sem judicialização. No caso de criança acima dos 12 anos, também é preciso que ela dê consentimento para efetivação desse vínculo. A existência de uma discussão judicial sobre o reconhecimento da paternidade ou de procedimento de adoção impede o reconhecimento da paternidade socioafetiva.
“A contribuição é importante pois uniformiza a questão com normas nacionais. Anteriormente, cada Estado tratava de um jeito”, diz Mário Luiz Delgado, diretor do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).
Segundo ele, a mudança se alinha ao que preveem as leis na área do Direito da Família. “Já é aplicado que o que fundamenta o parentesco não é o sangue, mas o afeto.”
Oficial titular do Cartório do Ipiranga, na zona sul paulistana, e diretora da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-SP), Karine Boselli diz receber de cinco a dez casos por mês para registro de paternidade socioafetiva. “Teve um cliente que veio, mas tivemos de explicar que só por meio da Justiça. Ele voltou oito meses depois com a decisão favorável”, disse. “Hoje, com a nova norma, faria em cinco dias.”
A nova certidão de nascimento não deve conter quadros preestabelecidos para o preenchimento dos genitores. Essa determinação visa a evitar que uma lacuna para identificação do pai fique em branco, no caso, por exemplo, de um pai desconhecido. Segundo a norma, os novos modelos deverão ser implementados até o dia 1.º de janeiro de 2018.
CPF. A nova regra também inclui a exigência do número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) em cada certidão. Nos documentos emitidos antes deste provimento da Corregedoria Nacional de Justiça, do dia 17, o CPF poderá ser averbado gratuitamente, bem como na emissão de 2.ª via das certidões.
A nova norma está atualizada de acordo com a garantia do casamento civil às pessoas do mesmo sexo e o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família.
Em relação às crianças geradas por reprodução assistida, a nova norma retirou a obrigação da identificação do doador de material genético no registro de nascimento da criança. Nos casos de gestação de substituição (a chamada barriga de aluguel), não é mais necessário identificar a parturiente.
Outra novidade é que, a partir de agora, a naturalidade da criança na certidão de nascimento não precisará ser, necessariamente, o local em que ela nasceu. A cidade onde a mãe biológica ou adotiva habita poderá ser apontada como local de nascimento da criança — o que poderá ser feito, por exemplo, quando uma criança nascer durante uma viagem da mãe. Até então, o local de nascimento e a naturalidade de uma pessoa precisavam ser o mesmo. /