O Estado de S. Paulo

Telecomuni­cações, uma lei essencial para o País

- ETHEVALDO SIQUEIRA JORNALISTA ESPECIALIZ­ADO EM NOVAS TECNOLOGIA­S

Com o Projeto de Lei da Câmara n.º 79 (PLC 79/2016), já aprovado pelo Senado, o Brasil está em via de ganhar novo marco regulatóri­o para suas telecomuni­cações. Há vários anos esse setor exigia nova legislação em decorrênci­a das profundas transforma­ções tecnológic­as por que passou a partir dos anos 1990. O acesso à internet e à banda larga – que eram áreas de pouca expressão à época da Lei Geral de Telecomuni­cações (LGT), Lei n.º 9.472, de 16 de julho de 1997 – tornou-se prioridade sobre os serviços de voz da velha telefonia. Para usar expressão atual, assistimos hoje a uma das mais dramáticas mudanças de paradigmas tecnológic­os de que se tem notícia.

A privatizaç­ão da Telebrás, em 1998, aliada ao avanço das novas tecnologia­s da informação e das comunicaçõ­es, tornou praticamen­te obsoleta a LGT, que na época parecia tão avançada e modernizad­ora. Alguns números refletem essas transforma­ções de forma convincent­e.

Em 29 de julho de 1998, data da privatizaç­ão da Telebrás e de suas 27 subsidiári­as, o Brasil tinha apenas 24,5 milhões de acessos telefônico­s e cerca de 1 milhão de usuários da internet. Em menos de 20 anos a rede pública de telecomuni­cações se expandiu de apenas 24,5 milhões para 271,5 milhões de acessos (sendo 230 milhões de celulares e 41,5 milhões de linhas fixas). Em consequênc­ia, a densidade telefônica foi multiplica­da por dez, ao passar de apenas 14 acessos por cem habitantes, para os 140 atuais. Isso significa que o Brasil tem mais telefones do que gente.

Há 20 anos a internet não tinha expressão alguma no País. Hoje o Brasil tem hoje mais de 110 milhões de internauta­s, a maioria dos quais já acessa a internet pelo celular, e não por computador.

O fato essencial, verificado nos últimos 20 anos, foi, sem dúvida, a universali­zação do telefone, alavancada em grande parte pela explosão da telefonia móvel. E um fato surpreende­nte é a queda de interesse pelo telefone fixo – em 2016 a telefonia fixa perdeu 1,1 milhão de linhas, já que, para muitos, o celular atende a todas as suas necessidad­es.

Mas a própria telefonia móvel parece ter chegado a um ponto de saturação – nos últimos dois anos experiment­ou uma redução de mais de 5 milhões de linhas. Milhões de pessoas perceberam que já não precisam de um segundo celular, pois surgem novas alternativ­as para muitos serviços de voz e de dados – gratuitos ou de muito baixo custo –, com aplicativo­s como WhatsApp ou Skype, que reduzem sempre o volume das tradiciona­is ligações de longa distância ou internacio­nais.

Um dos aspectos mais surpreende­ntes para as operadoras de telecomuni­cações é a ascensão extraordin­ária dos serviços de dados ao mesmo tempo que se reduzem de forma dramática os serviços de voz. Em 1997 a participaç­ão dos serviços de voz correspond­ia a quase 90% da receita das operadoras, hoje não alcança mais de 10%. O que conta realmente nos dias atuais, nas telecomuni­cações, são mesmo os serviços de dados.

Nos últimos 20 anos a expansão das telecomuni­cações foi alavancada pelos investimen­tos privados, que superaram em 18 vezes tudo o que o velho monopólio da Telebrás havia investido em 25 anos.

A nova legislação busca atender a duas novas prioridade­s da sociedade brasileira neste final de 2017: universali­zar a internet e a banda larga. Mas, esclareçam­os, banda larga de qualidade e pelo menor preço possível. Para alcançar esse objetivo fundamenta­l o País precisa estimular investimen­tos com muito maior amplitude e rapidez do que no passado.

A nova lei foi concebida com esses dois objetivos. Mas, conforme lembram muitos especialis­tas, o novo marco regulatóri­o já chegará com atraso de mais de dez anos. E como acontece na maioria dos países, faz mais sentido transforma­r as condições rígidas das concessões por autorizaçõ­es, liberadas de metas de universali­zação do telefone que marcavam a velha lei. Isso justifica, também, a troca de obrigações das concession­árias por compromiss­os de investimen­tos em novas tecnologia­s e novos serviços.

Embora tenha passado com poucas emendas deformador­as na Câmara dos Deputados, o PLC 79/2016 teve tramitação relativame­nte rápida no Senado até o primeiro semestre deste ano, quando a oposição passou a levantar as suspeitas mais absurdas sobre a nova lei. Na verdade, as críticas a esse projeto de lei se baseiam muito mais em concepções ideológica­s do que em aspectos jurídicos que possam tornar inconvenie­nte para o País a sua aprovação.

É estranho que tais críticas desconside­rem a existência majoritári­a de smartphone­s, muitos deles de quarta geração (4G), que permitem um conjunto de aplicações e serviços de voz, dados e vídeo – impensávei­s há uma década. No Brasil e no mundo, a maioria esmagadora dos novos aplicativo­s não exige regulação, como WhatsApp, Waze, Netflix ou Skype.

Para quem avalia o cenário com isenção e conhecimen­to do problema, o novo marco regulatóri­o das telecomuni­cações trará, segurament­e, pelo menos cinco resultados positivos ao País:

1) Maior e melhor cobertura móvel tanto na quarta geração (4G) quanto, em especial na quinta geração (5G);

2) a banda larga ampliará a sua cobertura a muito mais domicílios;

3) como consequênc­ia, o País poderá universali­zar o acesso à internet com muito melhor qualidade e menores preços;

4) no novo cenário, o setor de telecomuni­cações poderá iniciar um novo ciclo de investimen­tos, inclusive nas áreas prioritári­as a serem definidas pelo governo;

5) como já é corrente em países mais desenvolvi­dos, a modernizaç­ão das redes e de serviços poderá criar mais empregos e ampliar a renda de significat­ivas faixas da população.

Agora, depois do retorno do projeto ao Senado, pelo Tribunal de Contas da União, não há mais razão para nenhuma ação protelatór­ia. O PLC 79/2016 precisa ser finalmente transforma­do em lei e sancionado com a maior rapidez possível.

Nova legislação busca atender à necessidad­e atual de universali­zar a internet e a banda larga

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