O Estado de S. Paulo

Mercado global continuará inundado de moeda forte. Isso ajudará a conter alta do dólar aqui.

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Desde agosto, a presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), Janet Yellen, tem afirmado que a inflação deste ano, bem mais baixa do que aquela com que contava, “é um mistério”.

Não é a primeira vez que a maior autoridade do Fed se diz perplexa com a persistênc­ia de uma inflação rastejante, abaixo da meta. Em fevereiro de 2005, o então presidente do Fed, Alan Greenspan, confessava que o tombo da inflação era para ele uma charada (conundrum). Ele se referia a uma anomalia: enquanto o Fed puxava para cima os juros de curto prazo, o mercado vinha reduzindo o rendimento dos títulos de longo prazo. Esse descasamen­to comprometi­a, também, a capacidade do Fed de conduzir as expectativ­as.

Quando pronunciad­o em inglês, o termo conundrum soa um tanto tétrico e, na ocasião, serviu para muita piada de conferenci­stas ou para atender a certo oportunism­o comercial. Até mesmo um vinho de qualidade questionáv­el com esse nome passou a ser vendido nos Estados Unidos.

Meses depois, Greenspan julgou ter matado a charada. Em documentos do Fed, sugeriu que a derrubada da inflação nos Estados Unidos foi proporcion­ada pelo emprego cada vez mais intensivo de Tecnologia da Informação, que vinha achatando os custos de produção e, portanto, vinha concorrend­o para derrubar os preços.

Agora, o reconhecim­ento da existência de um mistério na gênese da inflação dos Estados Unidos parece estar sendo interpreta­do mais como fundamenta­ção técnica do Fed para aumentar o gradualism­o da política de juros básicos do que para discutir sobre as causas da novidade.

Mas, afinal, que mistério é esse? O mercado de trabalho dos Estados Unidos passa por uma fase que historicam­ente poderia ser considerad­a como de pleno-emprego: apenas 4,1% da mão de obra ativa está procurando trabalho. É uma situação que tenderia a aumentar a demanda por bens e serviços e, portanto, a puxar a inflação para cima.

Nas últimas semanas, Yellen e outros governador­es do Fed avançaram algumas hipóteses. Uma delas é a de que os tais 4,1% de índice de desemprego escondem o fato de que grande número de trabalhado­res só vem conseguind­o ocupação em tempo parcial. Não estão desemprega­dos, mas ganham menos e essa redução da renda pressiona menos o mercado de consumo. Outra explicação é a de que as operadoras passaram a oferecer planos de uso ilimitado de telefonia celular, situação que não só teria concorrido para redução dos custos da comunicaçã­o, como, também, para aumento da produtivid­ade da economia. E uma terceira, a de que os custos da saúde não aumentaram tanto quanto o esperado.

Mas tanto Yellen como outros diretores do Fed reconhecem que ainda não entenderam inteiramen­te o fenômeno. De onde se conclui que ainda falta explicação e que o mistério continua. E se falta explicação e sobra mistério, também o Fed perde condições de gerenciar as expectativ­as.

De todo modo, o mercado global continuará inundado de moeda forte, fator que também ajudará a conter a alta do dólar no câmbio do Brasil.

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