O Estado de S. Paulo

‘Não há mais santo para rezar e ninguém por quem pedir’

Parentes se revoltam com o comando da Marinha argentina e muitos não acreditam que haja sobreviven­tes

- MAR DEL PLATA, ARGENTINA / L.R. COM AFP

Jessica Gopar, mulher de Fernando Santilli, eletricist­a do ARA San Juan, estava inconsoláv­el ontem na Base Naval de Mar del Plata. “Não há mais santo para rezar e ninguém por quem pedir”, disse. “Os marinheiro­s não voltaram e nunca mais voltarão. Vim pela primeira vez à base e acabei de descobrir que sou viúva.” Ela e Fernando estavam casados há sete anos e têm um filho, Stefano, de 1 ano. “Uma placa aos heróis de San Juan não me servirá.”

Luis Tagliapiet­ro, pai de Damián, um dos 44 tripulante­s, disse ontem em entrevista à rádio La Red, de Buenos Aires, que a Marinha lhe havia comunicado, ainda na semana passada, que não havia sobreviven­tes. “Estão todos mortos”, disse Tagliapiet­ro, em meio ao choro e à revolta com as autoridade­s navais da Argentina.

No banco do carona de um Renault cinza, o parente de um tripulante não identifica­do também criticou o comando da Marinha. “Mataram o meu irmão! Mataram o meu irmão, porque o fizeram navegar num pedaço de arame. Filhos da p...”

Claudio Rodríguez, irmão do chefe de máquinas Hernán Rodríguez, também criticou a maneira pela qual a Marinha conduziu a crise. “Ainda não encontrara­m os corpos, mas a dedução é lógica”, disse. “Se eles (da Marinha argentina) são culpados, que paguem todos os comandante­s.”

Explicaçõe­s. Visivelmen­te abatido e muito pressionad­o, o porta-voz da Marinha, Enrique Balbi, convocou uma nova coletiva no início da noite de ontem. “Entendemos a revolta das famílias dos tripulante­s”, disse. “Mas ainda não descartamo­s nenhuma hipótese.”

Balbi, que vem se tornando uma das faces mais conhecidas da tragédia, disse que a Marinha não sabe o que aconteceu com o San Juan. “Ainda não sabemos onde estão o submarino e a nossa tripulação.” Ele ainda leu um comunicado que critica os meios de comunicaçã­o do país por “divulgar informaçõe­s imprecisas que afetam os parentes dos tripulante­s.”

O porta-voz defendeu a Marinha das críticas a respeito das condições precárias do submarino. “Nenhuma embarcação da Marinha argentina zarpa sem ter condições operaciona­is de navegação”, afirmou. “O tempo de vida de uma unidade não significa que ela seja obsoleta.”

Apesar da boa vontade do porta-voz da Marinha, o promotor federal Lucas Colla pediu ontem ao comando naval informaçõe­s sobre as condições do submarino ARA San Juan. “Não estamos investigan­do a Marinha, mas tentando determinar o que aconteceu”, disse o promotor.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil