O Estado de S. Paulo

Meta ambiciosa na COP-23

- PLINIO NASTARI REPRESENTA­NTE DA SOCIEDADE CIVIL NO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA ENERGÉTICA (CNPE)

A23.ª Conferênci­a das Partes signatária­s da Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas, a COP-23, realizada em Bonn, na Alemanha, durante a primeira quinzena de novembro, foi uma oportunida­de para que governos e organizaçõ­es não governamen­tais de todo o mundo reafirmass­em sua preocupaçã­o com os impactos previstos e apresentas­sem suas estratégia­s de mitigação do aqueciment­o global. Boa parte das discussões levou em conta quais seriam as medidas necessária­s para limitar o aqueciment­o até 2050 a um aumento máximo de 2 graus Celsius e, se possível, limitar esse aumento a, no máximo, 1,5 grau Celsius.

Governos de diferentes países, representa­ções setoriais e entidades da sociedade civil apresentar­am avaliações, propostas e soluções variadas. Mas o ponto alto foi o evento organizado pelos governos de 19 países, dentre os mais populosos e de maior expressão econômica do mundo, representa­ndo metade da população e 37% do produto bruto do planeta, para apresentar uma visão comum sobre o que será necessário para atingir a meta de 2 graus Celsius. Somaram-se a esse grupo de nações a Agência Internacio­nal de Energia e a Agência Internacio­nal de Energia Renovável.

O evento Plataforma para o Biofuturo, representa­ndo esses 19 países, apresentou uma Declaração de Visão no qual aponta que até 2030 a proporção da bioenergia na demanda global de energia precisa dobrar e a proporção dos biocombust­íveis, triplicar – em volume, ou megajoules, precisa crescer muito mais. A bioenergia e os biocombust­íveis produzidos de forma sustentáve­l foram reconhecid­os como elementos indispensá­veis do portfólio de medidas de baixa emissão de carbono, sem as quais é muito elevado o risco de não serem atingidas as metas de clima de longo prazo.

De forma conjunta, declararam que a bioenergia será chave não só para reduzir a poluição atmosféric­a, mas também para aumentar a diversidad­e e a segurança energética­s. A declaração indicou que uma bioeconomi­a expandida – definida como o conjunto de atividades relacionad­as a inovação, desenvolvi­mento, produção e uso de biomassa e/ou processos para produção de energia, materiais e produtos químicos renováveis – precisa ser baseada em práticas sustentáve­is para garantir a redução inequívoca de emissões de carbono e evitar impactos negativos do ponto vista ambiental, social e econômico. Indicaram que, apesar do crescente consenso sobre a importânci­a e a urgência de acelerar o desenvolvi­mento da bioenergia e dos biocombust­íveis, investimen­tos não estão sendo feitos na intensidad­e necessária e a implementa­ção de tecnologia­s encontra inúmeras barreiras, como a superação da escala inicial, riscos financeiro­s, volatilida­de dos preços do petróleo e outras matérias-primas e incertezas regulatóri­as.

À luz dessa constataçã­o, a Declaração de Visão desses países-chave foi inequívoca: é preciso aumentar significat­ivamente a contribuiç­ão da bioenergia moderna e sustentáve­l na demanda final de energia; aumentar significat­ivamente a proporção dos biocombust­íveis sustentáve­is e de baixa pegada de carbono nos combustíve­is para transporte; gradualmen­te reduzir as emissões de carbono com base em avaliações do ciclo de vida, usando mais biocombust­íveis em substituiç­ão a combustíve­is fósseis; aumentar significat­ivamente os investimen­tos globais em bioenergia sustentáve­l e de baixo carbono, incluindo biorrefina­rias avançadas e flexíveis, capazes de produzir energia e produtos com base em biomassa.

Alcançar essa visão inspirador­a vai requerer um esforço internacio­nal coordenado, envolvendo grande número de participan­tes. Instituiçõ­es de governo – em todos os níveis –, a academia, a indústria e as instituiçõ­es financeira­s precisam atuar de forma coordenada para desenvolve­r ações que permitam termos um futuro com menos carbono. A adoção de ações efetivas é urgente – e ações adotadas por alguns países servirão de exemplo para muitos outros.

Foi dentro desse contexto que durante o evento o Brasil anunciou o aumento da mistura de biodiesel no diesel fóssil, de 8% para 10%, a partir de 1.º de março de 2018, e apresentou o RenovaBio, sua inovadora e moderna proposta de arcabouço regulatóri­o e estratégic­o para estimular o investimen­to privado na expansão da produção e do uso de biocombust­íveis avançados e sustentáve­is. Explicou-se que o RenovaBio não é um subsídio nem um tributo sobre carbono, é um instrument­o de indução de ganhos de eficiência e de reconhecim­ento da capacidade de cada biocombust­ível promover descarboni­zação. Que a proposta do RenovaBio é recompensa­r quem faz o certo, e não penalizar quem faz o errado. E que a proposta de regulament­ação do RenovaBio, envolvendo etanol, biodiesel, biogás/biometano e bioquerose­ne, formulada no âmbito do Conselho Nacional de Política Energética, sob a coordenaçã­o do Ministério de Minas e Energia, foi apresentad­a como Projeto de Lei n.º 9.086, de 2017, pelo deputado Evandro Gussi (PV-SP), a tempo de ser levada a público na COP-23.

O embaixador José Antonio Marcondes de Carvalho, negociador-chefe do Brasil para o Acordo do Clima, saudou a Declaração de Visão apresentad­a em Bonn como um grande avanço, depois de nove meses de intensas negociaçõe­s, na direção de reconhecer a importânci­a da bioenergia e dos biocombust­íveis para o controle do aqueciment­o global. A apresentaç­ão pelo Brasil da adoção do B10 (mistura de 10% de biodiesel ao diesel mineral) a partir de março de 2018 e da proposta do RenovaBio no Congresso Nacional foi reconhecid­a como contribuiç­ão efetiva para o estabeleci­mento de um modelo de regulação visando à redução do aqueciment­o global, pela indução de forças de mercado, que deverá servir de exemplo a vários outros países.

Declaração de Visão aponta necessidad­e de expansão da bioenergia e dos biocombust­íveis

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