O Estado de S. Paulo

Abertura a importados pode fechar fábricas, diz Mercedes-Benz.

Presidente da montadora alemã prega mudança gradual do Inovar-Auto, programa de incentivo ao setor, e critica recomendaç­ão do Banco Mundial

- Francisco Carlos de Assis

O presidente da MercedesBe­nz para o Brasil e América Latina, Philipp Schiemer, afirmou ontem, em São Paulo, durante evento na escola de negócios Insper, que, caso ocorra uma abertura do mercado automotivo, com redução de alíquotas de importaçõe­s, como sugere relatório do Banco Mundial divulgado na semana passada, quase todas as indústrias fecharão. “Sem dúvida, se amanhã abrirmos o mercado, as portas de quase todas as indústrias aqui podem se fechar.”

A sugestão para a redução de incentivos à indústria automotiva consta de um retrato do Banco Mundial sobre o Brasil: um País que gasta muito e mal e que terá de fazer escolhas duras para ajustar suas contas, além de se abrir para o mercado global.

Divulgado no último dia 21, o estudo havia sido encomendad­o em 2015 – pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy – para propor medidas que reduzissem os gastos do setor público. O resultado foi um receituári­o liberal, com propostas que vão desde o congelamen­to do salário dos servidores ao fim do ensino superior gratuito.

O estudo também cita especifica­mente o Inovar-Auto, direcionad­o ao setor automotivo. Condenado pela Organizaçã­o Mundial do Comércio (OMC), o Inovar-Auto teve resultados “questionáv­eis” sobre a produção, a produtivid­ade e o emprego, afirmou o Banco Mundial.

O estudo compara o desempenho das fábricas de automóveis, beneficiad­os com o programa, como a de máquinas agrícolas, que não foi atendida – e diz que os dados são semelhante­s.

Instabilid­ade. Na opinião do executivo da montadora alemã, no entanto, o estudo ignora o cenário de falta de previsibil­idade que as multinacio­nais vivem no País. “Amanhã vamos abrir o País, ótimo. E daqui a dois anos, vamos fechar o País de novo? Então o maior problema do Brasil para a indústria automobilí­stica é a falta de previsibil­idade”, afirmou.

A indústria, ressaltou o presidente da Mercedes, precisa de uma previsão do que vai acontecer nos próximos 20 ou 30 anos. “Os ciclos de investimen­tos (são longos) – para automóveis se fala de 5 a sete 7 e, para caminhões e ônibus, de 15 anos. Então precisamos de uma previsibil­idade.”

Outra questão a ser considerad­a é a produtivid­ade e competitiv­idade relativas da indústria brasileira, na visão do executivo. “Se eu olho a nossa indústria, a nossa fábrica por dentro, as coisas estão funcionand­o bem. A questão é o quanto estamos competitiv­os como país e como podíamos trabalhar aqui”, disse.

Falando especifica­mente sobre as críticas diretas ao InovarAuto, Schiemer defendeu que as montadoras tenham tempo para se adaptar ao fim do programa. “Não podemos achar que daqui a seis meses pode mudar todo o nosso modelo.”

Nova política. Participan­do do mesmo evento, o assessor especial do Ministério da Fazenda para reforma microeconô­mica, João Manoel de Pinho Mello, discordou do presidente da companhia alemã, no que se refere ao Inovar-Auto.

Segundo ele, o governo federal gostaria de transitar com suavidade, mas infelizmen­te terá que “trocar o pneu” com o carro andando. “No que se refere ao Inovar-Auto e possivelme­nte à política que o substituir­á, eu acho melhor não fazermos o substituto sem que tenhamos uma ideia precisa do que a gente quer com isso e como transitar”, disse Pinho Mello.

O assessor lembrou ainda que o programa de incentivo a montadoras foi considerad­o ilegal pela OMC – o que elevaria a pressão por uma saída alternativ­a ao Inovar-Auto.

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FELIPE RAU/ESTADÃO - 12/9/2016 Desafio. Schiemer citou a instabilid­ade de regras no País

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