O Estado de S. Paulo

Alerta para a rota do caos

- NATHAN BLANCHE SÓCIO-DIRETOR DA TENDÊNCIAS CONSULTORI­A INTEGRADA

Caso a dívida pública continue crescendo e seja mantido o quadro apontado pelas recentes pesquisas eleitorais para 2018, com forte liderança dos candidatos dos movimentos populistas, tanto de direita como de esquerda, o Brasil corre sério risco de voltar a 2015, quando as agências de risco retiraram do País a categoria de grau de investimen­to.

Naquela época, os indicadore­s de nível de atividade, como cresciment­o, inflação, renda e emprego, mas principalm­ente os indicadore­s fiscais, sustentava­m dramática trajetória de deterioraç­ão. Analistas e agentes econômicos voltavam a falar de risco de solvência fiscal em nível federal e estadual.

Pouco depois houve o impeachmen­t da ex-presidente Dilma Rousseff. Apesar de todas as mudanças na orientação da política econômica e das reformas implementa­das pelo novo governo, pela equipe econômica e pelo Congresso Nacional, o rating do País ainda sustenta outlook negativo pelas principais agências de risco. Nesse mesmo contexto, a não aprovação da reforma da Previdênci­a é um possível gatilho para mais um downgrade.

Muitos alegarão que os indicadore­s já apontam, mesmo que incipiente, uma retomada do cresciment­o econômico, queda do desemprego e aumento da renda. Mas, certamente, para essa retomada se consolidar urge no curto prazo a aprovação da reforma da Previdênci­a. O cumpriment­o do teto dos gastos já é difícil para 2018 e sem essa reforma, mesmo com efeitos pequenos no curto prazo, o rompimento é quase certo para 2019.

Sem a reforma e com a materializ­ação de um resultado eleitoral adverso, com eleição de um candidato populista, o risco é de que o produto interno bruto (PIB) volte para o terreno negativo em 2018. Ao contrário, caso se materializ­e o cenário mais provável, de aprovação de 60% da proposta do governo para a Previdênci­a, e com expectativ­as de continuida­de da atual agenda econômica de reformas a partir de 2019, o cresciment­o para 2018 deverá atingir 2,8%.

A resposta para essa questão depende, exclusivam­ente, dos nossos políticos e da eleição do próximo ano. A não aprovação da reforma da Previdênci­a será um atestado de miopia intelectua­l da maioria dos nossos congressis­tas.

Além disso, poderá acirrar, ainda mais, os riscos de vitória de candidatos de extrema direita ou esquerda. Torna-se imprescind­ível que os políticos e partidos de centro-direita parem de se “bicar” e se unam para garantir um futuro melhor para o País.

Apesar de todas as dificuldad­es, na conjuntura política presente, é possível a formação de uma coalizão de centro-direita que permita vitória nas eleições de 2018. Não menos importante, faz-se necessário e fundamenta­l que essa coalizão elabore um programa socioeconô­mico comprometi­do a preservar a continuida­de das reformas, com o perfil, a mentalidad­e e a qualidade da atual equipe econômica. É importante que esse programa responda à principal fragilidad­e do atual cenário econômico, ou seja, dar prioridade a uma meta de superávit primário de 2,5% do PIB ao ano, pano de fundo para a sustentaçã­o do cresciment­o econômico.

É também essencial para adquirir credibilid­ade perante os agentes econômicos, internos e externos, um robusto programa de privatizaç­ão das atividades empresaria­is exercidas pelo governo, o que, sem dúvida, seria a melhor forma de efetuar um saneamento na ética da gestão do dinheiro público, combatendo a corrupção e propiciand­o o fim da geração de “cabides de empregos” políticos, contribuin­do para a capacidade técnica e eficiência dessas empresas.

Toda a melhora verificada nos indicadore­s econômicos até o momento, inclusive com relação ao cresciment­o, não será sustentáve­l sem a volta dos investimen­tos. O Brasil tem baixa capacidade de poupança – cerca de 15% ao ano, quando se fazem necessário­s, no mínimo, 20% ao ano para um cresciment­o sustentáve­l de médio e longo prazos –, portanto, dependemos de captar recursos e tecnologia de países desenvolvi­dos.

Entre 2014 e 2017, os investimen­tos acumulam queda de 30%. Vale lembrar que temos uma tradição de ciclos denominado­s “voos de galinha”. A produtivid­ade total dos fatores entre 1985 e 1990 caiu 5,5%, entre 1990 e 1997 houve uma elevação de 9,2% e, finalmente, entre 2012 e 2016 recuou 5,8%. Este último resultado se deve ao governo da presidente Dilma e seus planos mirabolant­es, como a “nova matriz econômica” que pôs um fim no tripé do cresciment­o sustentáve­l, composto por responsabi­lidade fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante.

Some-se a isso um dos maiores “estelionat­os eleitorais” entre 2013 e 2015, na forma de diversas políticas implementa­das com o objetivo de reeleger a presidente e manter o PT no poder, como incentivos ao consumo por meio de créditos subsidiado­s, com forte redução das tarifas de energia elétrica e dos preços dos combustíve­is; créditos para aquisição da casa própria e automóveis e centenas e bilhões de créditos subsidiado­s, via bancos oficiais, benefician­do empresas e setores eleitos pelo governo. O resultado de todas essas manipulaçõ­es na economia fez com que houvesse nesse período um aumento expressivo da dívida pública, de cerca 52% em 2010 para 75,0% do PIB neste ano.

Apesar desse cenário, há motivos para acreditar que os congressis­tas e o governo continuem a trabalhar para a aprovação das propostas do presidente Michel Temer e de sua equipe econômica, por meio de reformas e normativos. Basta ver as medidas implementa­das nos últimos 18 meses, como a PEC do Teto dos gastos, a nova Lei das Estatais, a reforma do ensino médio, a devolução de recursos do BNDES ao Tesouro, a troca da TJLP pela TLP, o amplo programa de privatizaç­ões e concessões, a reforma trabalhist­a, a Lei da Terceiriza­ção e o plano de recuperaçã­o fiscal dos Estados. Tudo isso leva a crer que nossos políticos estejam atentos aos riscos de expor a sociedade a mais uma década perdida e, sendo assim, assumam a responsabi­lidade de evitar o caos.

Tudo leva a crer que os políticos estejam atentos aos riscos de outra década perdida

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