O Estado de S. Paulo

Hawilla diz que pagou propina a Teixeira

Empresário afirma que deu, regularmen­te, até R$ 10 milhões por ano ao ex-presidente da CBF. Advogado do dirigente nega todas as acusações

- Ciro Campos Paulo Favero

O empresário José Hawilla, dono da empresa de marketing esportivo Traffic, revelou ontem, em Nova York, em depoimento do julgamento do caso de corrupção da Fifa, que pagou regularmen­te propinas ao ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Por até cerca de R$ 10 milhões a cada ano, o acordo visava facilitar a compra de direitos de transmissã­o de três edições de Copa América.

“Era muito difícil fazer algo sem pagar subornos”, disse o empresário de 74 anos no depoimento. Hawilla contou que em um primeiro momento, passava a Teixeira cerca de R$ 330 mil por ano em propina. O montante acabou crescendo, até chegar a cerca de R$ 10 milhões, mesma quantia paga a outros dirigentes sul-americanos, como Nicolás Leoz, ex-presidente da Conmebol, e Julio Grondona, ex-presidente da associação argentina, falecido em 2014.

Hawilla prestou depoimento durante sete horas auxiliado por tradutores. A propina, segundo o empresário, garantiu à Traffic a comerciali­zação dos direitos de transmissã­o das Copas Américas de 2007, 2011 e 2015. Para cada edição, era preciso gastar cerca de R$ 60 milhões em subornos para dirigentes sul-americanos. “Eu cometi um erro e me arrependo muito disso”, afirmou o empresário.

O julgamento do caso de corrupção na Fifa está na quarta semana na corte do Brooklyn, em Nova York. Segundo Hawilla, no acordo entre o empresário e Teixeira, existia uma suposta exigência para que a seleção brasileira levasse os principais jogadores para os torneios. Como parte da admissão de culpa, Hawilla aceitou pagar cerca de US$ 151 milhões (R$ 489 milhões). O dono da Traffic aceitou voltar a depor como testemunha na sessão de hoje.

Procurado pelo Estado, o advogado de Ricardo Teixeira, Michel Assef Filho, afirmou que considera “covardia” seu cliente ser atacado por Hawilla sem ter direito de defesa. “É bom esclarecer que Ricardo não está sendo julgado, e é uma covardia ser atacado sem ter direito de defesa e do contraditó­rio dentro do processo judicial.”

“Ricardo nega veementeme­nte as acusações irresponsá­veis do delator e réu confesso José Hawilla. Ele desafia o delator a informar os nomes dos doleiros e as contas onde as propinas supostamen­te foram pagas, já que tais pagamentos nunca existiram. Sobre a acusação em relação a ter recebido propina para que fossem escalados os melhores jogadores para disputar a Copa América, Ricardo não só nega a acusação, como tem provas de que tais valores foram objeto de contrato e de pagamento realizado na conta da CBF”, completou o advogado.

O dono da Traffic aceitou colaborar com a investigaç­ão do FBI depois de ter sido preso, em 2013. O empresário usou um gravador escondido para captar conversas com Hugo e Mariano Jinkis, pai e filho responsáve­is pela empresa argentina Full Play. O áudio do diálogo foi ouvido pela primeira vez na Corte americana e trata sobre esquema de propinas a vários presidente­s de confederaç­ões nacionais de futebol de alguns países.

“Eu quero coexistir com eles e fazer todos os presidente­s ricos”, disse Mariano Jinkis em uma das gravações. Quando Hawilla comentou sobre a vontade de sair do esquema para fazer sua empresa se tornar limpa novamente para que pudesse vendê-la a algum interessad­o, ouviu uma reprovação de Mariano. O argentino disse que não gostaria de contar com um parceiro que não entendesse de suborno ou de recompensa­s, como definiu os pagamentos.

Nas conversas gravadas, os argentinos disseram ser comum a existência do esquema. “Sempre existiram recompensa­s. E teremos isso para sempre”, comentaram. Hugo e Mariano estão entre os 40 indiciados por corrupção na Fifa. No ano passado a Justiça da Argentina negou aos Estados Unidos o pedido de extradição da dupla, ao alegar que os dois já têm sido investigad­os no próprio país.

A corte do Brooklin, em Nova York, tem julgado nas últimas semanas três ex-presidente­s de federações nacionais de futebol na América do Sul. Os réus são o paraguaio Angel Napout, o peruano Manuel Burga e o brasileiro José Maria Marin, que dirigiu a CBF. Todos se declararam inocentes da acusação de conspiraçã­o e lavagem de dinheiro. / COM AGÊNCIAS INTERNACIO­NAIS

J.Hawilla

EMPRESÁRIO E RÉU ‘Era muito difícil fazer algo sem pagar subornos. Eu cometi um erro e me arrependo muito’

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JANETE LONGO/ESTADÃO - 6/6/2011 Acordos. J.Hawilla prestou depoimento durante sete horas na corte do Brooklyn, em Nova York

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