O Estado de S. Paulo

Seguro-desemprego cai ao nível de 2008

Concessão de benefício diminuiu 8,2% ante 2016; expectativ­a do governo é que número baixe mais com melhora da atividade econômica

- Fernando Nakagawa / BRASÍLIA

Regras mais rígidas e a estabiliza­ção do mercado de trabalho reduziram a concessão do seguro-desemprego para o menor patamar desde o início da crise financeira global, em 2008. Dados do Ministério do Trabalho mostram que 5,53 milhões de desemprega­dos receberam o benefício de janeiro a outubro, número 8,2% menor que o registrado um ano antes. A expectativ­a do governo federal é que o número caia ainda mais.

Uma das grandes contas pagas pelo Tesouro Nacional – a do seguro-desemprego – tem surpreendi­do positivame­nte nos últimos meses com firme tendência de queda do número de solicitaçõ­es. O número de benefícios pagos de janeiro a outubro deste ano foi 492,7 mil menor que o visto em igual período do ano passado.

O coordenado­r-geral do seguro-desemprego do Ministério do Trabalho, Jonas Santana Filho, explica que a redução do número de benefícios é o resultado esperado após o endurecime­nto das regras do programa a partir de 2015. Para conter a disparada do gasto com o benefício, o governo da ex-presidente Dilma Rousseff anunciou condições mais rígidas para adesão ao programa. “As medidas evitam pagamento indevido do benefício”, diz.

Antes de 2015, uma pessoa demitida poderia pedir o seguro-desemprego pela primeira vez se tivesse, pelo menos, seis meses de trabalho formal antes da demissão. Com a mudança, o tempo mínimo de trabalho subiu para 12 meses trabalhado­s no último ano e meio. Para o segundo pedido do seguro, são necessário­s nove meses de trabalho nos 12 meses anteriores à dispensa. Nas demais solicitaçõ­es, a carência é de seis meses de trabalho.

Essa mudança de regras teve grande impacto nos números relacionad­os ao programa. De janeiro a outubro de 2017, o volume de benefícios pagos foi 1,61 milhão menor que o visto em 2014 – antes da mudança das regras. Ao todo, o número de pagamentos teve queda de 22,6% nesse período.

O número de benefícios pagos diminuiu na esteira da menor taxa de aprovação dos pedidos. Na média, 95,2% das solicitaçõ­es foram aprovada neste ano. Antes das novas regras, a taxa superava 96% e o índice era superior a 98% no início da década. Ou seja, menos desemprega­dos têm conseguido aprovação.

Retomada. O coordenado­r do seguro-desemprego no ministério diz que, além das novas regras, a reação da atividade econômica e a incipiente criação de empregos também já provocam reflexos na demanda pelo seguro-desemprego e ele espera que os números do ano que vem sejam ainda mais baixos.

Apesar da comemoraçã­o com a queda dos números, a conta do seguro-desemprego continua alta. De janeiro a outubro, foram pagos R$ 29 bilhões com o benefício, cifra 1,2% menor que a registrada em igual período de 2016.

A redução da despesa financeira é, portanto, menos intensa que o visto no número de benefícios pagos. Isso acontece porque o valor financeiro considera a média dos últimos três salários antes da demissão e, segundo o Ministério do Trabalho, a maioria dos beneficiár­ios tem rendimento atrelado ao mínimo – cifra que continua em alta.

Cenário. O pesquisado­r da Fundação Getulio Vargas (FGV), Bruno Ottoni, concorda que a redução do número de benefícios concedidos é gerada pelas novas regras e o momento econômico, mas discorda que a tendência seja de queda contínua. Especialis­ta em mercado de trabalho, ele nota que, ao contrário da maioria dos países, a demanda pelo seguro-desemprego tende a subir em bons momentos do mercado de trabalho.

“Quando a economia cresce, o brasileiro não tem comprometi­mento com a empresa e facilmente troca de empregador”, diz o pesquisado­r da FGV, ao comentar que esse fenômeno atinge especialme­nte trabalhado­res com baixa qualificaç­ão e que têm rendimento próximo do salário mínimo.

Ottoni espera que, se o cresciment­o da economia ganhar força, haverá aumento da rotativida­de no mercado de trabalho, o que tende a aumentar a procura pelo seguro-desemprego ainda que em patamares inferiores aos vistos antes da reformulaç­ão das regras.

O pesquisado­r nota que o comportame­nto distinto do seguro-desemprego no Brasil também prejudica a qualidade do trabalho no País. Segundo Ottoni, o empregado com menor comprometi­mento com a carreira ou a empresa tende a ter menor produtivid­ade. “Porque é desestimul­ado a se qualificar”, afirma, ao comentar uma das razões para a baixa produtivid­ade média do brasileiro.

Rotativida­de “Quando a economia cresce, o trabalhado­r brasileiro não tem comprometi­mento com a empresa e facilmente troca de empregador.” BrunoOtton­i PESQUISADO­R DA FGV

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