O Estado de S. Paulo

Conta chegou e não dá para adiar

Pacote de medidas equilibrou contas, mas inseguranç­a jurídica trava investimen­tos

- Anna Carolina Papp ENVIADA ESPECIAL FLORIANÓPO­LIS

Areforma da Previdênci­a está atrasada em duas décadas e a conta desse adiamento chegou e é pesada, disseram os especialis­tas que participar­am ontem do Fórum Estadão – Reforma da Previdênci­a. Outro argumento destacado é o de que caso se espere mais para levar adiante a reforma o ajuste ficará ainda mais caro e penoso.

Diante do deteriorad­o quadro fiscal dos Estados brasileiro­s, Santa Catarina aparece como um ponto fora da curva. Com um pacote de medidas anticrise, o Estado conseguiu, mesmo em meio à recessão, manter as contas em ordem e aumentar sua competitiv­idade. No entanto, apesar de se destacar em áreas como gestão pública, segurança e inovação, o governo catarinens­e ainda enfrenta grandes desafios – como vencer a inseguranç­a jurídica e fomentar mais os investimen­tos. Esses foram os temas discutidos no Fórum Regional Estadão Santa Catarina, promovido pelo Estado, em Florianópo­lis.

Entre as medidas adotadas durante as “vacas magras”, destaca-se a decisão de não aumentar impostos, apesar da queda significat­iva na arrecadaçã­o. “Não subimos o ICMS sobre energia elétrica, gasolina ou comunicaçã­o. Também adiamos a implementa­ção de pedágios. Estendemos as oportunida­des para que o setor produtivo reagisse”, afirmou no evento o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo.

Outras estratégia­s utilizadas, explicou o secretário da Fazenda, Renato Lacerda, foram a renegociaç­ão da dívida do Estado e a reforma do sistema de previdênci­a estadual – o calcanhar de aquiles das finanças públicas do País. “O déficit da Previdênci­a nos Estados é um problema muito mais grave do que no governo federal”, observou Adriana Fernandes, repórter especial e colunista do Estadão/Broadcast.

O governo limitou pensões ao teto do INSS e aumentou a alíquota previdenci­ária dos servidores. Ela passou de 11% para 12% no ano passado, foi a 13% este ano e completa sua transição no ano que vem, em 14%. “Em nossa reforma, conseguimo­s incluir os militares e todos os Poderes, o que mostrou a maturidade dos órgãos do serviço público”, disse o governador.

Ainda no sentido de equilibrar as finanças públicas, relatou Colombo, foram fechadas, neste ano, cinco empresas públicas. “Fizemos um plano de demissão incentivad­a de mais de 800 servidores. Hoje, temos o menor número de cargos comissiona­dos do País. Fomos, em etapas, diminuindo a estrutura do Estado.”

O economista, especialis­ta em contas públicas, Raul Velloso, da ARD Consultore­s Associados, apresentou um estudo comparativ­o sobre as finanças públicas nos Estados de Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Goiás. Ele pontuou que, embora Santa Catarina tenha a menor fatia do orçamento comprometi­da entre os cinco Estados, a margem para investimen­tos ainda é muito limitada. “Os outros Estados podem aprender muito com Santa Catarina, que não fez nada de excepciona­l – fez o feijão com arroz. O mais difícil é explicar por que os outros não fizeram.”

Competitiv­idade. Ao longo dos últimos seis anos, Santa Catarina saltou seis posições no ranking de competitiv­idade dos Estados, elaborado pelo Centro de Liderança Pública, em conjunto com a Tendências Consultori­a Integrada e a Economist Intelligen­ce Unit. Em uma escala que vai de 0 a 100, a nota do Estado aumentou de 74,3 para 77,2 em 2017, ultrapassa­ndo o Paraná e ficando atrás apenas dos 87,8 alcançados por São Paulo. A média nacional ficou em 47,9. Dos dez pilares levantados no ranking, Santa Catarina lidera em dois: segurança pública e sustentabi­lidade social – ambos com nota máxima. O Estado aumentou a pontuação em cinco quesitos (segurança pública, infraestru­tura, capital humano, potencial de mercado e solidez fiscal), porém recuou em quatro: educação, sustentabi­lidade ambiental, inovação e eficiência da máquina pública. “As finanças públicas não estão entre as mais críticas, porém inspiram cuidados”, ressaltou Adriano Pitoli, sócio-diretor da Tendências Consultori­a Integrada.

Na outra ponta, porém, o Estado foi destaque negativo no quesito eficiência do Judiciário, ficando apenas na 24.ª colocação. “Santa Catarina tem uma das maiores taxas de congestion­amento do Judiciário do País. Isso causa inseguranç­a e trava novos investimen­tos”, observa Pitoli. Outro desafio está em um ponto-chave na área de bem-estar social: o saneamento básico. Em 2015, o Estado tratava apenas um quarto do seu esgoto. “A solução é muito clara e está encaminhad­a: fazer a concessão de sua companhia de saneamento”, afirma Pitoli. “É mais uma decisão política do que uma questão técnica mais complexa.”

Ele observa que, para crescer, o Estado não poderá se apoiar em receitas antigas. “As forças que vão movimentar a economia são muito diferentes das que se destacaram nas últimas décadas”, afirma Pitoli. “O agronegóci­o e a indústria dificilmen­te darão a mesma contribuiç­ão para o Estado como no passado”, afirmou, destacando a importânci­a do fomento a polos tecnológic­os e do investimen­to em infraestru­tura, com políticas sustentáve­is. “As boas práticas pressupõem planejamen­to estratégic­o e orçamento”, afirmou Fábio Gallo, professor de finanças da FGV-SP. “Queremos um Estado que caiba no Estado, com controle de execução e menos burocratiz­ação.”

“Santa Catarina tem uma das maiores taxas de processos pendentes no Judiciário do País. Isso causa inseguranç­a

Adriano Pitoli SÓCIO-DIRETOR DA TENDÊNCIAS

““Temos uma maneira de lidar com a guerra fiscal e com a questão dos incentivos bastante sólida e responsáve­l

Renato Lacerda SECRETÁRIO DA FAZENDA DE SANTA CATARINA

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FELIPE RAU/ESTADÃO Discussão. Economista­s participar­am de debate na sede do ‘Estado’
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FOTOS RAMIRO FURQUIM / ESTADÃO Debate. Jornalista Silvia Araújo com Pitoli (E), da Tendências, Raul Velloso, economista, Lacerda, secretário da Fazenda, e Fábio Gallo, professor da FGV

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