A BATALHA ENTRE TRUMP E A PRESIDÊNCIA
Presidente relaxa jogando golfe, tem 5 horas de sono e gosta de passar parte do tempo vendo TV
Toda manhã, às 5h30, Donald Trump acorda e liga a TV em seu quarto na Casa Branca. Passa rapidamente pela CNN, depois assiste a Fox & Friends, para ficar mais calmo. Às vezes, muda para a MSNBC, porque ela o deixa energizado o resto do dia. Enfurecido, segundo assessores, ele pega seu iPhone e escreve tuítes ainda deitado no travesseiro. Com menos frequência, vai para seu escritório, já vestido ou de pijama, onde começa seus telefonemas oficiais e não oficiais.
No fim do seu primeiro ano no cargo, Trump mudou o conceito de ser presidente. Ele encara o cargo da mesma maneira como na noite de sua vitória sobre Hillary Clinton: um prêmio que precisa de proteção – e usa o Twitter como seu Excalibur. Apesar de todas as bravatas, ele ainda se considera um outsider, segundo entrevistas com 60 assessores, amigos e congressistas.
Trump ainda hoje debate a eleição, convencido de que a investigação especial de Robert Mueller sobre a interferência russa é uma trama para acabar com sua legitimidade. Mapas coloridos destacando os condados onde venceu estão pendurados nas paredes da Casa Branca.
Antes da posse, Trump disse a assessores para pensarem cada dia como um episódio de uma série de TV em que ele vence seus rivais. Pessoas próximas acham que ele passa pelo menos quatro horas por dia vendo TV, ansioso para revidar as críticas. “Ele acha que há um complô contra ele, que as acusações são infundadas”, disse o senador republicano Lindsey Graham.
Revigorando sua base, sua abordagem parece errática para muitos veteranos. Alguns políticos e analistas lamentam a instabilidade e, mesmo sem conhecimento, não têm escrúpulos em diagnosticar vários transtornos mentais no presidente.
Ele é mais impopular do que qualquer outro de seus predecessores neste ponto do mandato – apenas 32% aprovam seu desempenho, segundo o Pew Research Center –, mas Trump domina o cenário político como nenhum outro. Embora não tenha cumprido boa parte do que prometeu, eliminou muitas normas ambientais e empresariais.
Intervalo. John Kelly, general aposentado que comandou os fuzileiros navais no Iraque, adotou o mesmo enfoque como chefe de gabinete da Casa Branca. Ele trabalha 14 horas por dia para impor disciplina a um governo caótico. Meses antes de ele assumir o cargo, o Salão Oval parecia estar sempre na hora do rush, com um fluxo de assessores e visitas que ofereciam algum conselho. Hoje, a porta do Salão Oval fica fechada e Kelly vem tentando reduzir o tempo livre que o presidente tem para seus tuítes, acelerando seu dia de trabalho.
Trump, que tem controle total sobre suas empresas, fez importantes concessões. Ele chama Kelly uma dezena de vezes por dia, quatro ou cinco vezes durante o jantar ou durante uma partida de golfe, para saber de sua agenda ou pedir orientação. O novo sistema dá ao presidente tempo para pensar. Os assessores negam que ele peça a aprovação de Kelly, mas confirmam que ele o considera crucial.
Às vezes, Trump consegue fugir de Kelly. No feriado de Ação de Graças, em Mar-a-Lago, ele se relacionou com os convidados da maneira como fazia antes da eleição. Alguns lhe deram clipes de notícias que jamais passariam pelo filtro de Kelly. Ele ligou para velhos amigos, procurando saber como viam a investigação sobre a Rússia. Retornou a Washington empolgado.
Trump estava calmo quando seu ex-assessor de Segurança Nacional Michael Flynn acertou sua delação. No dia seguinte, quando visitou Manhattan para uma reunião, estava otimista. No domingo, com os noticiários consumidos pelo caso, ficou furioso e escreveu uma série de tuítes sobre Hillary e o FBI, mesmo contra os alertas de assessores.
Pela TV. A munição para sua guerra no Twitter é a TV. Ninguém toca no controle remoto, a não ser Trump. Durante reuniões, o aparelho de 60 polegadas na sala de jantar pode estar mudo, mas ele está sempre de olho nas manchetes. A informação que perde, checa posteriormente no que chama seu “Super TiVo”, que grava o noticiário. Durante a programação, ele discute com quem estiver na sala, mesmo que sejam os empregados que servem o almoço ou lhe trazem as dezenas de Cocas Diet que ele consome diariamente.
A imagem de Trump sempre raivoso esconde a complexidade de um homem que vive em ciclos de cólera e bom humor. Assessores afirmam que ele pode xingá-los pela mínima transgressão e manter um papo amigável minutos depois. Ocasionalmente, ele tira a mascara de invencível. Em reunião com senadores republicanos, discutiu em termos emotivos a crise das drogas e os perigos da dependência, relatando a luta do seu irmão com o álcool.
Embora Trump não seja especialista em política, tem se mostrado mais à vontade com sua reforma tributária. Segundo assessores, ele está mais atento nas reuniões diárias de inteligência graças às apresentações de Mike Pompeo, diretor da CIA, e tem manifestado maior preocupação com a situação da Coreia do Norte do que seus tuítes sugerem. Mesmo depois de um ano de briefings, Trump ainda desconfia de qualquer coisa que não venha de dentro da bolha em que vive.
Muitos lamentam o pouco entendimento que Trump tem dos fatos e sua inclinação por teorias conspiratórias. Ele continua sendo um leitor ávido de jornais e faz comentários a caneta. “A insistência em definir a própria realidade – como as alegações de que venceu no voto popular – têm um efeito entorpecente sobre as pessoas que trabalham com ele”, disse Tony Schwartz, autor de The Art of Deal.
Nos fins de semana, Trump relaxa jogando golfe. Mas, nos dias de trabalho, sua maneira de se desafogar é jantar na Casa Branca, sempre às 18h30 ou 19 horas, com uma lista de convidados feita por Kelly. “Posso convidar qualquer pessoa que ela virá”, disse Trump a um velho amigo. Após o jantar, ele vai para a cama para suas cinco ou seis horas de sono. Então, volta a ligar a TV, pega o iPhone e a batalha recomeça.