O Estado de S. Paulo

O jogo da reforma da Previdênci­a

- ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK

No início de novembro, fragilizad­o pelas sucessivas batalhas políticas que teve de enfrentar, a partir de meados de maio, para se manter no cargo, o presidente Michel Temer deu mostras de estar desalentad­o com a possibilid­ade de aprovação da reforma previdenci­ária. Chegou a declarar que, se o Congresso não estivesse disposto a aprová-la, “paciência”.

Mas o Planalto logo percebeu que o sinal de que estaria prestes a “jogar a toalha” na luta pela aprovação da reforma havia sido lido como mais uma evidência de que o presidente estaria mesmo fadado a se arrastar até o fim do mandato, como um “pato manco”.

A correção de rumo foi imediata. O que se viu a seguir foi súbita mudança no empenho com que o Planalto passou a tratar a reforma da Previdênci­a. O aparente desalento deu lugar à deflagraçã­o de ampla campanha de mobilizaçã­o do País e do Congresso com o esforço de assegurar a aprovação ainda este ano, pelo menos na Câmara dos Deputados, de uma versão menos ambiciosa da reforma previdenci­ária, mas com efeitos fiscais equivalent­es à metade dos inicialmen­te contemplad­os.

Merece atenção o fato de que, nesse novo esforço de convencime­nto da opinião pública, o governo parece ter encontrado, afinal, a tecla certa, ao passar a enfatizar que se trata de eliminar privilégio­s indefensáv­eis. Pesquisas de opinião recentes sugerem que a resistênci­a à reforma previdenci­ária vem diminuindo. Que, aos trancos e barrancos, a conscienti­zação dos eleitores nesta questão vem avançando. E que a insistênci­a no discurso irresponsá­vel de oposição radical à reforma ficou muito mais onerosa.

Vale também notar que a mobilizaçã­o do governo com a aprovação da reforma previdenci­ária vem tendo um papel ordenador importante, na formação de uma possível coalizão das forças políticas de centro para a disputa presidenci­al de 2018.

Tendo o Planalto conseguido que o PMDB, o PTB e o PPS se compromete­ssem a fechar questão na votação da proposta, o PSDB viu-se, de repente, constrangi­do a abandonar as lamentávei­s restrições, escancarad­amente corporativ­istas, que vinha fazendo à proposta. Instado por Fernando Henrique Cardoso e Geraldo Alckmin, o partido decidiu, afinal, fechar questão a favor da aprovação da reforma. Mesmo que não impeçam as indiscipli­nas de praxe, esses compromiss­os partidário­s de cerrar fileiras na defesa da reforma representa­m passo promissor para possível aglutinaçã­o das forças políticas de centro na eleição presidenci­al.

Com a proximidad­e do recesso parlamenta­r e as dificuldad­es de assegurar os 308 votos requeridos para aprovação em dois turnos da emenda constituci­onal requerida na Câmara, a votação da reforma teve de ser adiada para fevereiro. E pode até ser que nem em fevereiro seja votada.

Mas, mesmo que não seja, a mobilizaçã­o do governo com a reforma lhe terá rendido fartos dividendos políticos. Terá sido o que permitiu ao Planalto sair das cordas, recuperar a iniciativa política, influir de maneira decisiva na forma como as forças políticas de centro deverão se apresentar na disputa presidenci­al e, ainda, manter os mercados esperanços­os com a possibilid­ade de avanço da reforma.

Será muito bom para o País se um efeito adicional da frenética mobilizaçã­o do Planalto com a reforma previdenci­ária, no apagar das luzes de 2017, acabar sendo a transforma­ção do problema de financiame­nto da Previdênci­a Social na questão central da campanha eleitoral do ano que vem.

A esperança é de que a disputa presidenci­al de 2018 seja menos escapista que as campanhas presidenci­ais anteriores. E exija que os candidatos discutam o que verdadeira­mente importa. Que se posicionem sobre a superação da crise fiscal e a importânci­a da reforma previdenci­ária para que as contas públicas possam ser mantidas sob relativo controle.

Esperança é de que a questão previdenci­ária venha a ser central na disputa eleitoral de 2018

ECONOMISTA, DOUTOR PELA UNIVERSIDA­DE HARVARD, É PROFESSOR TITULAR DO DEPARTAMEN­TO DE ECONOMIA DA PUC-RIO

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