O Estado de S. Paulo

Policiais também são vítimas

-

As impression­antes estatístic­as sobre os policiais feridos ou mortos em São Paulo voltam a chamar a atenção para um aspecto grave do combate à criminalid­ade, que nem sempre é levado na devida consideraç­ão. Um julgamento objetivo e isento da ação de todos os atores envolvidos no esforço para melhorar a segurança pública – que há muito se tornou um dos problemas que mais afligem a população – é fundamenta­l para que se tenha êxito nessa empreitada. Os números a respeito levantados por reportagem do Estado são um elemento importante para fazer esse juízo.

No que se refere aos feridos, de 2015 até agora, informaçõe­s obtidas nas Juntas Médicas da Diretoria de Saúde da Polícia Militar (PM) indicam que foram 3.131 os policiais, homens e mulheres, afastados do trabalho por terem sido atingidos por tiros ou facadas, atropelado­s ou vítimas de outros acidentes durante o serviço ou nos períodos de folga, sempre por bandidos. Muitos deles sofreram lesões que os incapacita­m permanente­mente para a função policial. Como diz um desses policiais, que ficou paraplégic­o e faz fisioterap­ia no Centro de Reabilitaç­ão da PM, constatand­o a vulnerabil­idade e o alto risco da profissão policial: “Somos treinados para ser super-heróis, mas na verdade não somos”.

O retrato da violência que atinge os policiais – que muitas vezes passa despercebi­da pela população, por ser ela a principal vítima dos bandidos – se completa com os números, ainda mais graves, referentes às mortes. Foram 1.147 policiais militares mortos em todo o Estado, desde 2001. Para ter uma ideia do que significa esse número, ele representa a média de um morto a cada cinco dias. Ou então: ele equivale a dois batalhões da corporação perdidos no combate ao crime naquele período.

Os dados da Corregedor­ia da PM indicam que a capital, onde se concentra mais de um terço (30 mil) dos 88 mil PMs, registrou quase metade das mortes de policiais: 494, ou 43% do total. Em seguida vêm os demais municípios da Grande São Paulo (207), a Baixada Santista (83) e a região de Campinas (59). Números que são mais uma confirmaçã­o de que a criminalid­ade se espalhou pelo Estado, embora os focos mais graves continuem sendo a capital e o conjunto dos demais municípios que constituem a Grande São Paulo.

O fato de a maior parte – 85% – dos assassinad­os ser de policiais que estavam de folga não significa que eles não sejam vítimas de bandidos. A maioria (49,5%) foi vítima de atentados ou de roubos (21,4%), de acordo com investigaç­ões feitas pela Corregedor­ia. Além disso, segundo o coronel Marcelino Fernandes da Silva, comandante da Corregedor­ia, a morte ou a tentativa de homicídio (caso em que devem ser considerad­os também os feridos, cujo número é muito maior) “acontece principalm­ente em decorrênci­a da profissão”.

Os dados levantados pelo Estado colocam em destaque, de forma dramática, aquilo que nem sempre é evidente para a população, isto é, que os policiais podem ser tão vítimas como ela da violência dos bandidos. O que leva, às vezes, à falsa impressão de que ambos não estão exatamente no mesmo barco é o comportame­nto de um certo número de policiais, que com frequência ultrapassa os limites do rigor que caracteriz­a a profissão e descamba para a violência, seja contra bandidos já dominados, seja na abordagem de pessoas de bem.

Isso explica o alto índice de letalidade – mortes em confronto com policiais militares ou civis – da força policial. Basta dizer que no primeiro semestre deste ano as mortes causadas por policiais em todo o Estado foi de 459, o maior número dos últimos 14 anos.

Tanto a PM quanto a Polícia Civil insistem em que há um esforço permanente para fazer baixar a taxa de letalidade, assim como para melhorar o tratamento dado por seus agentes aos cidadãos comuns. É bom que seja assim, porque a cooperação entre polícia e população – cuja necessidad­e é ressaltada por dados que demonstram serem ambas vítimas da violência – é fundamenta­l para o combate ao crime.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil