Fifa intervém no futebol brasileiro
Provas apresentadas em Nova York dão conta de que Del Nero teria recebido US$ 6,5 milhões em propinas
Diante da decisão de Marco Polo Del Nero de concorrer a mais quatro anos na presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e da avalanche de novos indícios de corrupção envolvendo o cartola brasileiro, a Fifa decidiu intervir, suspendeu o dirigente e abriu uma crise sem precedentes no comando do futebol nacional. Nos bastidores, fontes na Fifa esperam que a medida abra a possibilidade de eleições na entidade sem a participação de Del Nero.
Num caso que começou em 2015 com a prisão de José Maria Marin, em Zurique, então presidente da CBF, foi ontem que o processo de afastamento dos cartolas no comando do futebol brasileiro, de fato, se transformou em realidade. Pega de surpresa, a CBF corre o risco de ver um vácuo de poder e de ter uma acirrada guerra interna às vésperas da Copa do Mundo.
Ontem, Del Nero foi afastado de forma provisória pela Fifa, por 90 dias. No caso enviado aos advogados do brasileiro, a entidade aponta para as evidências apresentadas nos tribunais em Nova York, revelando a suspeita de crime por parte do brasileiro na gestão do futebol.
Indiciado nos EUA por conspiração, formação de grupo criminoso, lavagem de dinheiro e corrupção ainda em 2015, Del Nero insistiu em se manter no comando do futebol brasileiro.
Foi ele, por exemplo, que contratou Tite para a seleção. Para evitar uma prisão e extradição aos EUA, Marco Polo Del Nero optou por não sair do Brasil.
Agora, em seu lugar, assumirá a CBF o primeiro vice-presidente, que é o coronel Antonio Carlos Nunes. Nos próximos meses, a Fifa anunciará sua decisão, podendo banir de forma permanente Del Nero do futebol ou aplicar multa e um afastamento de tempo limitado.
Se a decisão seguir o padrão dos demais investigados nos EUA, Del Nero não voltará ao futebol. Nenhum dos demais indiciados na corte de Nova York foi autorizado a retomar suas atividades. A única chance ao dirigente é se José Maria Marin, julgado nos EUA pelos mesmos crimes, fosse inocentado de todas as acusações que lhe pesam.
Poder. Fontes em Zurique explicaram ao Estado que a suspensão foi a forma encontrada para tentar barrar uma nova tentativa de Del Nero concorrer à presidência da CBF. Eleições estão marcadas para abril de 2018.
O Estado revelou ontem que, dentro da Fifa, a opinião era de que a posição de Del Nero na CBF era “insustentável”. Na Fifa, o caso contra o cartola foi aberto em 2015 e, por dois anos, o processo viveu um impasse político e pressões. Por meses, a entidade em Zurique afirmou que não teria como puni-lo por falta de provas. Nem mesmo os documentos enviados pela CPI do Futebol, no Senado, foram suficientes para convencer os investigadores.
O brasileiro chegou a pedir licença de suas funções na CBF quando o indiciamento foi anunciado nos EUA. Mas retornou quando recebeu garantias na Fifa de que não seria suspenso até que o julgamento em Nova York não ocorresse. Assim, ele ganhou uma sobrevida no cargo.
Com novos documentos dos procuradores americanos apresentados no julgamento de Marin, e depoimentos dos envolvidos, Del Nero foi amplamente citado como tendo sido beneficiado por propinas no valor de US$ 6,5 milhões (R$ 21,3 milhões) em troca de contratos de transmissão pela tevê para torneios como Libertadores, Copa do Brasil e Copa América. Mesmo a defesa do brasileiro no banco dos réus usou o argumento de que era Del Nero que mandava na CBF, enquanto Marin era apenas “aquele monarca que não decidia nada” na entidade.
Áudios apresentados pelos procuradores nos EUA revelaram como empresários se organizaram para pagar propina a Del Nero. Existem extratos bancários e transações que apontariam para as mesmas suspeitas.
Audiência. Nos próximos três meses, Del Nero e seus advogados serão chamados a audiências na Fifa. Ele ainda poderá recorrer ao Tribunal Arbitral dos Esportes. Mas, para se defender, terá de viajar até a Suíça, o que implicaria em sua prisão e eventual extradição aos EUA.