Negros na liderança
Não podemos negar que a inclusão de negros no mercado de trabalho é um tema em evidência. Há diversos debates e datas históricas que comprovam o quanto ainda é necessário falar sobre o tema. Isso me intriga porque sou negra, líder e amante do processo de desenvolvimento de liderança.
Sempre associamos lideranças de sucesso a mentes brilhantes e ao equilíbrio emocional e profissional; teoria muito bem apresentada por Augusto Cury no livro “Códigos da Inteligência”. Partindo deste princípio, é preciso entender o conceito de inteligência emocional e desenvolver habilidades para trabalhá-la. Ainda assim, para os negros, este cenário é mais nebuloso. Então, por que não desafiar os métodos de seleção de futuros líderes e lutar por processos amplamente inclusivos no aspecto racial?
É sabido que afrodescendentes representam mais de 55% da população brasileira e que o número de universitários negros dobrou. Ainda assim, é raro vermos negros em cargos de liderança em empresas e isso é alarmante. E a pergunta que as companhias precisam se fazer é: como suprir o baixo número de profissionais em cargos de decisão diante de um cenário desafiador no País, em que se admite haver preconceito racial, porém em grande maioria inconsciente?
Em uma pesquisa do Instituto Ethos, de 2016, foi constatado que funcionários negros representam apenas 6,3% de pessoas em cargos de gerência e 4,7% no quadro executivo. Com os atuais critérios de seleção de líderes, somados ao viés do preconceito inconsciente, levaremos um século para dobrar estes números.
É fato que empresas com ambiente diverso lucram mais, criam produtos baseados em necessidades diversas e caminham criativamente por rotas não tão conhecidas. Porém, o que o RH na tradicional forma de seleção pode flexibilizar dos atuais processos para construir um ambiente com mais diversidade?
Minha percepção é de que, em processos seletivos, prioriza-se currículos pelas listas de instituições de renome. Em contrapartida, investe-se milhões para sensibilizar estes profissionais em habilidades sutis. São treinamentos para que profissionais desenvolvam habilidades que estão aos montes no currículo dos afrodescendentes que precisam suportar as pressões sociais, adversidades profissionais e tensões emocionais.
De quais habilidade estou falando? Resiliência, capacidade de adaptação, flexibilidade, empatia, persuasão, humildade, saber ouvir, trabalho em equipe e colaboração. Então, quero lançar um desafio: que tal desconstruirmos o pensamento de indicadores de sucesso, somente buscando titulações no currículo de um jovem? Fazer isso é continuar excluindo os currículos de jovens negros.
Em outras palavras, que tal ser inclusivo e buscar conhecer as experiências destes profissionais à margem para avaliar a lista de habilidades e competências essenciais?
Com um grande número de empresas pensando em diversidade, agora é o momento da inclusão – vamos dar oportunidades reais para que profissionais negros sejam alocados em projetos com diferentes desafios. Sejam eles mentorizados no processo de aceleração de competências para trabalhar com finanças e negócios; ou dar atenção a programas de mulheres negras que manifestam o desejo de liderar, ampliando as oportunidades em habilidades estratégicas.
Empresas, antes de serem vistas como instituições, devem ser vistas como um conjunto de pessoas compartilhando seus valores. Não se adapta uma cultura para ser inclusiva sem investir em líderes empáticos, engajados em causas sociais e que não tenham o valor do altruísmo como forma sustentável de fazer negócios.