Horizonte ampliado
Paisagem arborizada, iluminação e ventilação diferenciadas são apenas três das vantagens dos prédios ‘vizinhos’ de zonas residenciais; moradores ainda têm acesso rápido a serviços e comércio
Quando chegou, ainda como potencial compradora, ao apartamento que hoje é seu futuro lar, Daniela Lourenço, de 33 anos, olhou de imediato para a janela da sala. A paisagem era formada por um conjunto de casas e muitas árvores. “Lembro que tive a sensação de não estar em São Paulo”, conta.
Localizado nas proximidades da Avenida Rebouças, o imóvel é vizinho do Jardim Paulistano, uma zona estritamente residencial. Por determinação da Lei de Zoneamento, os lotes dessas áreas são de uso unifamiliar, o que resulta numa ocupação de baixa densidade demográfica, formada por casas e sobrados.
Quem vive na “fronteira” de uma zona e outra, como será o caso da dentista, que se muda em janeiro para o apartamento, tem vantagens. Segundo o diretor do Imovelweb, Mateo Cuadras, essas pessoas “desfrutam do melhor dos dois mundos”. De um lado, aproveitam a tranquilidade e a arborização do bairro. De outro, estão a um passo do comércio e de serviços.
Há outros pontos positivos. Para o arquiteto Felipe Rassini, o verde das vias e dos jardins das residências representa um “conforto visual muito relevante”, sobretudo em metrópoles. “São locais que trazem alívio térmico para zonas de calor, têm ventilação e insolação ótimas. E não são ruidosos.”
Os efeitos da vizinhança menos densa também se refletem no tráfego de automóveis, geralmente mais ameno, afirma - embora haja exceções, como o entorno do Parque do Ibirapuera.
Desde que fechou negócio, Daniela visita a região do novo prédio com frequência. A ideia é entender a dinâmica de funcionamento dos arredores. “Tem uma pracinha perto, vejo pais passeando com os filhos. Parece ideal para o momento que estou vivendo, de formação da minha família”.
Grávida de quatro meses, ela diz já se imaginar caminhando com o carrinho do bebê pelo bairro vizinho. Os passeios também a fizeram perceber que várias das ruas adjacentes contam com guardas particulares. “Essa é uma característica dos bairros residenciais de alto padrão, os moradores das casas fazem um investimento massivo em segurança”, diz Lucas Vargas, CEO do ZAP Imóveis.
Horizonte. Estar livre de edifícios de frente não é apenas uma questão de vista permanente. Trata-se, também, de um componente de privacidade.
Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie, Luiz Rivera lembra que, com o alto grau de verticalização de São Paulo, é comum empreendimentos terem varandas uma de frente para a outra.
Ele aponta outro fator que costuma pesar na aquisição de imóveis de “fronteira”: “morar perto de áreas exclusivamente residenciais traz certo status, existe aí um valor simbólico”.
Mercado. Se o preço de uma unidade varia conforme a altura do andar, também os apartamentos com vistas melhores são mais caros, certo? A resposta é “depende”, de acordo com agentes imobiliários.
Diretor de vendas da Lello, Igor Freire diz que essa característica é mais um argumento na hora da negociação do que um definidor de preço. “Trata-se de um bom atributo comercial, claro, mas o valor do metro quadrado vai ser definido pela localização, pelo estado de conservação do bem, pelo condomínio, entre outras coisas.”
A vista extraordinária do Edifício Gravatá, assinado por Rino Levi, foi determinante nas decisões de compra e venda de Marcelo Couto, de 56 anos.
Em 2012, ele comprou uma unidade no terceiro andar. A paisagem da janela lhe agradava tanto que, quando decidiu trocar de apartamento, em 2016, não saiu do prédio, apenas subiu mais três andares. “A vista ficou melhor porque agora estamos mais acima da copa das árvores, é como olhar para um mar verde.”
Couto afirma que, a despeito da crise econômica, conseguiu se desfazer do imóvel em quatro meses. Para ele, a vista, o projeto do renomado arquiteto e a localização estratégica agilizaram o processo. “Atravessando a Avenida Nove de Julho, estou no Jardim Europa. Já com uns 15 minutos de caminhada, chego ao Ibirapuera.”
Outro lado. A “vida fronteiriça” traz também inconvenientes. Com a baixa movimentação de pessoas, andar à noite pelas redondezas pode dar a sensação de insegurança, afirma Rassini. O arquiteto também coloca o acesso ao transporte público como uma questão a ser considerada. Isso porque o metrô e linhas de ônibus tendem a chegar a locais mais densos.
No entanto, o professor Antonio Rodrigues Netto, coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo do Belas Artes, afirma que esse tipo de zona é “feita para não receber diretamente” transporte público. Mas lembra que algumas delas estão muito próximas de corredores, como a Avenida Rebouças.