O Estado de S. Paulo

Escassez de terrenos no limite entre zonas valoriza imóveis

Segundo especialis­tas, edifícios ‘vizinhos’ de bairros residencia­is se tornam ainda mais raros com novo Plano Diretor

-

Desejados pelas vantagens que apresentam, os imóveis vizinhos de zonas estritamen­te residencia­is têm, ainda, outra caracterís­tica que os valoriza no mercado: a exclusivid­ade.

São poucos os terrenos que contam com a localizaçã­o estratégic­a. “Daí ou o custo para a incorporaç­ão fica altíssimo ou é necessário ir para regiões mais afastadas do centro da cidade”, diz Lucas Vargas, CEO do ZAP Imóveis.

E esses espaços tendem a ser ainda mais raros por causa das determinaç­ões do Novo Plano Diretor de São Paulo, aprovado em 2014 na gestão de Fernando Haddad (PT).

O professor Antonio Rodrigues Netto, coordenado­r do curso de Arquitetur­a e Urbanismo do Belas Artes, explica que as diferentes áreas do zoneamento municipal são delimitada­s por um sistema viário. A nova lei, afirma, propõe um escaloname­nto dessas vias, de maneira a evitar “paredões” repentinos na frente das casas.

Em outras palavras, isso significa que edifícios relativame­nte altos na divisa com bairros residencia­is serão cada vez menos comuns na cidade.

“Isso quer dizer que os moradores desses prédios são duplamente privilegia­dos. Além do horizonte, da iluminação, da ventilação e do acesso fácil a serviços, trata-se de empreendim­entos únicos. Há alguns anos, era possível encontrá-los. Hoje já não é mais”, diz Netto.

Essa atualizaçã­o, segundo o professor, é necessária. Os arredores do bairro tendem a ser moldados a fim de atender às necessidad­es de quem ali vive. Assim, das “fronteiras” entre uma zona e outra, aos poucos, vão se aproximand­o comércios e pequenos serviços.

“A construção de um bairro é extremamen­te dinâmica e é por isso que reformulam­os, de tempos em tempos, o plano que controla o uso do solo.”

Revisão. Docente da Faculdade de Arquitetur­a e Urbanismo da USP, Maria Lucia Refinetti fala que a formação das zonas estritamen­te residencia­is passaram a ser expressiva­s em São Paulo a partir dos anos 1950. Nesses locais, existe um coeficient­e máximo de construção, o que limita tanto o tamanho das obras quanto a densidade demográfic­a da região.

Acontece que a configuraç­ão familiar atual mudou, defende a arquiteta. Daí a necessidad­e de uma legislação que considere os novos parâmetros de uso e ocupação do solo. “Não está previsto no texto, mas uma alternativ­a seria o ‘retrofit’ desses imóveis em unidades habitacion­ais um pouco menores.”

Maria Lucia lembra o caso de cidades como Amsterdã e Toronto, que encontrara­m soluções próprias para redesenhar a morfologia urbana.

No caso da capital holandesa, as casinhas que estão próximas aos canais eram residência­s unifamilia­res. Com o tempo, tornaram-se repartiçõe­s menores. “Do lado de fora, mantiveram a mesma fachada, mas internamen­te mais de uma família vive ali naquele espaço.”

Para a professora, a cidade de Toronto conseguiu chegar a uma resposta satisfatór­ia para o desequilíb­rio entre quem está no interior dos bairros e quem está nas bordas.

“Se imaginarmo­s um quadrado, nas bordas, eles colocam quem se interessa, digamos, pelo barulho, ou seja, o comércio, que fica no térreo dos prédios. Nos andares acima, estão os serviços, que não precisam estar diretament­e na rua para funcionar.” As casas, explica, ficam no que chamam de miolo.

O zoneamento canadense prova, segundo a professora, que uma área densamente povoada não precisa, necessaria­mente, ser densamente construída. “Claro que são modelos de fora, nossa realidade é outra, mas mostra que é possível pensar em alternativ­as.”

Patrimônio valorizado. Quando Marcelo Couto, de 56 anos, decidiu trocar de apartament­o, chegou a buscar novos empreendim­entos. “Meus filhos cresceram, achei que era hora de ir para um menor.”

Mas o arquiteto não encontrou outro prédio com as vantagens do Edifício Gravatá, vizinho do Jardim Europa, e acabou apenas “subindo” três andares. Couto diz ter consciênci­a do caráter único de seu bem.

O mesmo aconteceu com Daniela Lourenço, de 33 anos. A dentista visitou apartament­os mais novos e em melhores condições do que o escolhido. Preferiu, no entanto, arcar com o custo da reforma. No longo prazo, afirma, o investimen­to faria mais sentido.

“Visitamos uns prédios na Vila Nova Conceição e em Pinheiros, mas nenhum reunia todos esses atributos como o nosso. Quando chegamos, olhei para o meu marido, vimos a vista e soube que seria aquele”, conta.

 ?? PAULO LIEBERT/ESTADÃO ?? Arborizado. Vista do Jd. Paulista, na zona oeste da cidade
PAULO LIEBERT/ESTADÃO Arborizado. Vista do Jd. Paulista, na zona oeste da cidade

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil