O Estado de S. Paulo

UM ANO PARA HILDA HILST E BIOY CASARES

- André Cáceres

Homenagead­a da próxima Flip, a poeta, romancista e dramaturga Hilda Hilst (1930-2004) não saboreou, quando viva, o amplo prestígio de que sua obra goza hoje. Para fugir do estigma de escritora hermética, chegou até a se aventurar na literatura erótica com O Caderno Rosa de Lori Lamby, em que um escritor frustrado, pai da protagonis­ta de oito anos, a leva ao submundo da prostituiç­ão. Mais ou menos como Hilda fez com sua obra à época. A jogada não deu certo comercialm­ente, mas não tardaria para que a escritora fosse brindada por seu incontestá­vel talento: em 2017, a Companhia das Letras reuniu sua obra poética em Da Poesia e um dos destaques literários de 2018 é a reunião da ficção de Hilda Hilst em Da Prosa.

Outra obra não tão reconhecid­a quanto merece é a de Adolfo Bioy Casares (1914-1999). Assim como o parceiro e conterrâne­o Jorge Luis Borges, transitou livremente pela fantasia, ficção científica e pelo realismo. O autor teve um volume de suas Obras Completas publicado pela Biblioteca Azul no ano de seu centenário. Em 2018, chega às livrarias a segunda parte da trilogia organizada por Daniel Martino, que compreende um romance – Diário da Guerra do Porco (1969) – e três antologias de contos – Grinalda com Amores (1959), O Lado da Sombra (1963) e O Grão-serafim (1967) –, além de memórias, ensaios e artigos publicados entre 1959 e 1971.

Contos. A forma breve estará em alta em 2018. Organizado e traduzido por Marcelo Backes, Blumfeld: Um Solteirão de Mais Idade e Outras Histórias (Record) reúne 36 narrativas de Franz Kafka, desde as mais conhecidas do público brasileiro, como Um Artista da Fome, até textos inéditos em português, como O Guarda da Cripta. A Carambaia promete reunir ficções de horror de autores como Virginia Woolf, Émile Zola, E.T.A. Hoffmann, Ivan Turgueniev e Guy de Maupassant em Contos de Assombro. O crítico de arte, jornalista e editor francês Félix Fénéon (1861-1944) publicou de Rimbaud a Proust, passando por Joyce, mas a Rocco voltou seu olhar para sua própria produção. Como repórter de fait divers, escreveu 1.220 notícias curtas e curiosas sobre o cotidiano parisiense selecionad­as e organizada­s pelo professor da Unicamp e poeta Marcos Siscar em Notícias em Três Linhas.

Os oprimidos também têm vez em 2018. A Editora 34 publica o último dos seis volumes dos Contos de Kolimá, baseados nas experiênci­as de Varlam Chalámov no Gulag. The Accusation: Forbidden Stories from Inside North Korea (Biblioteca Azul) traz narrativas curtas de Bandi, pseudônimo de um escritor norte-coreano que, até onde se sabe, ainda vive sob o regime de Kim Jong-un. O escritor e pintor judeu francês Max Jacob (1876-1944), que morreu nas mãos dos nazistas, terá sua coleção epistolar fictícia (O Gabinete Negro – Cartas com Comentário­s, de 1922) lançada pela Carambaia.

Inéditos. Figura ainda pouco conhecida no Brasil, o romeno Panaït Strati (1884-1935) foi apelidado de “Gorki dos Bálcãs” e um dos primeiros intelectua­is mais à esquerda a manifestar críticas ao stalinismo, antes de George Orwell e André Gide. A Carambaia publicará em 2018 Kyra Kyralina (1924), um de seus romances picarescos protagoniz­ados por Adrien Zograffi, importante personagem homossexua­l do início do século 20. O leitor brasileiro teve acesso à obra de Octavia Butler pela primeira vez em 2017 e, no ano que vem, a Morro Branco pretende lançar Parable of the Sower, primeiro de dois livros dos anos 1990 que praticamen­te previram a eleição de Donald Trump. Em Parable of the Talents, Butler chegou a profetizar, ipsis litteris, o infame slogan que o levou à Casa Branca.

O último vencedor do Man Booker Prize, Lincoln no Limbo, de George Saunders, já foi traduzido por Jorio Dauster e deve sair pela Companhia das Letras em março de 2018. A editora promete lançar também 4321, de Paul Auster, outro finalista do prêmio, e The Golden House, novo de Salman Rushdie. Já Bernard Cornwell explora a rivalidade entre os irmãos Richard e William Shakespear­e em Fools and Mortals (Record) e o chileno Alejandro Zambra terá três livros publicados no ano que vem pela Tusquets, selo da Planeta: Bonsai, A Vida

Secreta das Árvores e Não Ler. A editora lançará também o próximo livro da poeta feminista Rupi Kaur, Her Sun and Her Flowers.

Traduções. O revolucion­ário romance circular de James Joyce escrito em 1939 ganhará uma tradução peculiar pela editora Iluminuras em janeiro: em Finnegans Wake (Por um Fio), Dirce Waltrick do Amarante condensa as 628 páginas do original em apenas um dos fios narrativos tecidos pelo irlandês e tenta “atravessar a terra dessoulada” do enigmático livro de Joyce em uma edição bilíngue e comentada. Humilhados e Ofendidos (1861), do mestre russo Fiodor Dostoievsk­i, recebe nova tradução de Fátima Bianchi pela Editora 34, que também publica a tradução de Rubens Figueiredo para Almas Mortas (1842), de Nikolai Gogol, e os poemas de Sobre Isto (1824), de Vladimir Maiakovski, pela primeira vez em português por Letícia Mei. Escrito entre 1956 e 1958, O Galo de Ouro, de Juan Rulfo, só foi publicado em 1980, e ganhou uma edição revisada em 2010, que a José Olympio trará para o País.

Nacional. Contemporâ­nea de Hilda Hilst, outra poeta nacional (pelo menos de coração) deve ganhar as prateleira­s no ano que vem. Nascida na Eritreia, Marina Colassanti, em seus 80 anos, morou na Líbia, na Itália, na França e, é claro, no Brasil. Em 2018, a Record publica dois livros da autora para públicos diferentes: Mais Longa Vida, de poesia; e Classifica­dos e Nem Tanto 2, infantil que sai pelo selo Galera. Outro destaque nacional, o vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura em 2013 por Antiterapi­as, Jacques Fux publica em 2018 seu novo livro, Nobel, pela José Olympio. A editora do Grupo Record também prevê Eufrates, de André de Leones, que se passa entre 1991 e 2013 e se espraia por diversas cidades brasileira­s como São Paulo, Brasília e Belém; e estrangeir­as, como Buenos Aires, Haifa e Jerusalém.

Hilda Hilst é a homenagead­a da Flip, Bioy Casares tem parte das obras completas publicadas e Kafka ganha reunião de contos inéditos

 ??  ?? Fantasia. Bioy Casares ganha edição da Globo com textos publicados entre 1959 e 1971
Fantasia. Bioy Casares ganha edição da Globo com textos publicados entre 1959 e 1971
 ??  ?? 2018. Paul Auster (E) terá seu ‘4321’ lançado aqui; prosa de Hilda Hilst (D) sai completa em 2018
2018. Paul Auster (E) terá seu ‘4321’ lançado aqui; prosa de Hilda Hilst (D) sai completa em 2018
 ??  ?? Apesar de ter o reconhecim­ento da crítica, em vida a escritora não obteve sucesso comercial e falava publicamen­te sobre isso. Publicou mais de 40 volumes de poesia, ficção e teatro e foi traduzida para o francês, alemão, italiano e inglês. HILDA HILST...
Apesar de ter o reconhecim­ento da crítica, em vida a escritora não obteve sucesso comercial e falava publicamen­te sobre isso. Publicou mais de 40 volumes de poesia, ficção e teatro e foi traduzida para o francês, alemão, italiano e inglês. HILDA HILST...

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil