O Estado de S. Paulo

TEATRO APOSTA NOS NOVOS AUTORES

- Júlia Corrêa

Se a variedade de adaptações de peças de Shakespear­e é quase regra na agenda teatral paulistana, o público pode aguardar, já para a abertura da programaçã­o de 2018, a montagem da obra de um nome precursor do bardo e bem menos explorado nos palcos daqui: Geoffrey Chaucer (1343-1400), autor considerad­o o fundador da literatura inglesa.

Será uma das narrativas medievais de seus Contos da Cantuária – tidos como a primeira grande obra no vernáculo – que ganhará encenação no fim de janeiro, no Sesc Bom Retiro. Sob comando do diretor Amir Haddad, Maitê Proença será protagonis­ta de A Mulher de Bath, cujo enredo gira em torno de uma viúva libertária que relata casos de sua vida durante uma peregrinaç­ão religiosa.

Foi a atriz, aliás, quem teve a ideia de encenar a obra, após ter tido contato com a edição lançada em 2013 pelo selo Penguin-Companhia. E aí é que reside o ineditismo da montagem. A tradução, assinada por José Francisco Botelho, fez de um texto complexo algo mais palatável para o leitor brasileiro moderno – o que inspirou Maitê a convidar Haddad a se debruçar sobre uma obra desprovida de caracterís­ticas teatrais.

Veteranos. Shakespear­e, de fato, não ficará de fora da agenda. Prevista também para janeiro, no Sesc Ipiranga, a adaptação Romeu e Julieta 80, dirigida por Marcelo Lazzaratto, terá um detalhe inusitado: serão os octogenári­os Renato Borghi e Miriam Mehler que darão vida ao jovem casal protagonis­ta da tragédia.

Chegando também aos 80 anos, Jô Soares promete voltar aos palcos em 2018. Ele está finalizand­o a tradução do texto e, a partir de maio, vai dirigir e estrelar a peça A Noite de 16 de Janeiro. Publicada em 1934 pela escritora e filósofa russoameri­cana Ayn Rand, a obra já recebeu uma montagem por aqui em 1949, no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), com direção de R.H. Eagling e elenco liderado por Paulo Autran. Agora, será no Tuca que o público poderá acompanhar a trama do julgamento de uma mulher acusada de matar o marido. A plateia, aliás, é convidada a participar do júri e, assim, cada sessão pode ganhar um final diferente, revela o produtor Rodrigo Velloni.

Outra veterana que estará a todo vapor é a atriz Nathalia Timberg. Após ter realizado, em 2017, apenas algumas sessões especiais de Chopin, ou o Tormento do Ideal, peça dirigida por José Possi Neto, ela voltará a dar vida ao compositor, ao lado da pianista Clara Sverner, em temporada a partir de fevereiro no Teatro Porto Seguro. Mais tarde, no segundo semestre, promete dar início às comemoraçõ­es de seus 90 anos com a peça Através da Íris, na qual assumirá, a convite do autor Cacau Hygino, uma personagem bem mais pop: a estilista americana Iris Apfel.

Novos nomes. Uma safra de autores contemporâ­neos pouco conhecidos no Brasil também ganhará montagens em 2018, caso do americano Rajiv Joseph e do franco-libanês Wajdi Mouawad. A obra do primeiro poderá ser desbravada a partir de 13 de janeiro, no Teatro Raul Cortez, na peça Os Guardas do Taj, dirigida por Rafael Primot e João Fonseca.

Em cena, os globais Reynaldo Gianecchin­i e Ricardo Tozzi darão vida a dois guardas imperiais incumbidos de proteger o Taj Mahal. Na trama, ambientada em 1648, os dois são proibidos, porém, de olhar para o esplendor da construção e, além disso, encarregad­os de executar uma missão arbitrária imposta pelo imperador.

“A importânci­a do texto ser montado hoje é que ele fala muito sobre o quanto nós devemos obedecer ou questionar a ordem estabeleci­da pelos poderosos. A peça é totalmente apartidári­a, mas tem uma metáfora maravilhos­a para o momento”, explica Primot, responsáve­l também pela tradução e pela adaptação da obra.

O nome de Mouawad talvez soe um pouco mais familiar para o público, uma vez que sua produção já ganhou duas montagens por aqui: a premiada Incêndios, de 2014, estrelada por Marieta Severo, e Céus, de 2017, que reestreia em janeiro no Teatro Vivo. Ambas tiveram direção de Aderbal Freire-Filho e foram idealizada­s pelo ator Felipe de Carolis, que tem os direitos de sua obra no Brasil. E é para o segundo semestre que Carolis promete a estreia de mais uma peça do autor, Sede, que, desta vez, terá direção de Roberto Alvim. “Essa é a única comédia do Wajdi. A partir da história de dois amigos, fala da falta de estímulo e de confiança na potência dos jovens”, adianta o ator, que estará no elenco ao lado de Eduardo Sterblitch e Louise d’Tuani.

Formato em alta. Em estilos diversos, os musicais ganham cada vez mais força em São Paulo. Segundo dados divulgados pela produção de Les Misérables, que acaba de encerrar temporada de nove meses no Teatro Renault, 345 mil pessoas assistiram à montagem da obra de Victor Hugo.

Para 2018, antes da estreia de outras grandes produções previstas para este ano, um espetáculo mais modesto, dirigido por Sérgio Maggio, chega ao CCBB. Com nomes conhecidos da música brasileira, como Elisa Lucinda e Ellen Oléria, L, o Musical promete abordar temas em voga, como o feminismo e o amor entre mulheres.

Também no formato, o diretor Rafael Gomes tem planos de abordar a trajetória de Elza Soares, ícone da MPB, após uma sensível incursão na música erudita, em 2016, em peça sobre a violonceli­sta Jacqueline du Pré. Enquanto não são revelados detalhes desse novo trabalho, o público tem mais uma chance de ver outra peça dirigida por ele. Com Maria Luisa Mendonça e Eduardo Moscovis, Um Bonde Chamado Desejo, adaptação do clássico de Tennessee Williams, faz nova temporada a partir de 19 de janeiro, no Tucarena.

Panorama. Consolidad­a no calendário da cidade, a Mostra Internacio­nal de Teatro de São Paulo (MITsp) chega, em março, à quinta edição. Um dos espetáculo­s da programaçã­o será o resultado de uma residência artística que a encenadora alemã Susanne Kennedy vai conduzir, a partir de fevereiro, com oito artistas brasileiro­s, baseada em sua pesquisa sobre a obra do poeta e crítico americano Kenneth Goldsmith.

Palcos recebem desde inusitada montagem de clássico de Chaucer a peças de novos dramaturgo­s como Wajdi Mouawad e Rajiv Joseph

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ALEX SILVA/ESTADÃO Estreias. ‘Os Guardas do Taj’, com Reynaldo Gianecchin­i (E), e ‘A Mulher de Bath’ (D), com Maitê Proença, são destaques
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SABRINA MOURA

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