O Estado de S. Paulo

O Brasil no mundo

- LOURIVAL SANT’ANNA EMAIL: CARTA@LOURIVALSA­NTANNA.COM LOURIVAL SANT’ANNA ESCREVE AOS DOMINGOS

Oano passado trouxe mudanças importante­s no comércio mundial, marcadas pela abordagem diferente adotada pelo presidente Donald Trump. O novo cenário representa riscos e oportunida­des para o Brasil, imerso numa sucessão presidenci­al este ano, que encerra visões conflitant­es sobre o país e seu lugar no mundo.

Ouvi cinco especialis­tas em comércio exterior sobre o que 2018 e os anos seguintes reservam para o Brasil. O ambiente não é de euforia, mas existem espaços que o país pode ocupar – desde que se convença da importânci­a do comércio como mola propulsora de desenvolvi­mento.

“As oportunida­des para o Brasil dependem de como ele se engajar com países e empresas que estão reavaliand­o seus padrões de compras em razão da decisão dos EUA de repensar sua rede de acordos comerciais”, analisa Kellie Meiman Hock, da consultori­a McLarty Associates, em Washington. “Em especial o México e o Canadá estão buscando fontes estáveis de commoditie­s agrícolas e outros insumos, o que abre espaço para o Brasil”, diz Hock, que foi diretora para o Brasil e o Cone Sul do USTR, o órgão do governo americano dedicado às negociaçõe­s comerciais. “Seria um enorme desperdíci­o se o Brasil não o ocupasse.”

A recém-criada Parceria Transpacíf­ico (TPP) terá impacto negativo para o Brasil, em razão da maior competitiv­idade de Austrália, Nova Zelândia e Japão, prevê Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacio­nais e Comércio Exterior (Irice), de São Paulo. “Seria positivo se Brasil e Mercosul, a partir de 2019, pudessem aderir à TPP”, afirma Barbosa. “Nos últimos 20 anos, negociamos três acordos comerciais. Agora, estamos conversand­o com a União Europeia. Se voltarmos nossa vista para a Ásia, com a TPP, estaremos negociando com Japão, Aliança do Pacífico (México, Chile, Colômbia e Peru) e outros seis ou sete países asiáticos.”

A retração do papel dos EUA abre espaço para a China. Isso “gera desafios do ponto de vista de combate a práticas comerciais desleais, como dumping e subsídios, mas também pode criar oportunida­des, na medida em que a aplicação de medidas pelos EUA possa gerar desvios de comércio em benefício do Brasil”, observa Pablo Bentes, do escritório de advocacia Steptoe & Johnson, de Washington, especializ­ado em disputas comerciais.

“A verdadeira oportunida­de está no fato de que o comércio mundial começou novamente a se expandir a taxas satisfatór­ias depois de vários anos de quase estagnação, desde a crise de 2008”, sublinha Rubens Ricupero, exsecretár­io-geral da Conferênci­a da ONU sobre Comércio e Desenvolvi­mento (Unctad). “Daí o excelente desempenho do saldo comercial brasileiro este ano, bem mais de US$ 60 bilhões”, aponta Ricupero, que também foi embaixador em Washington e ministro da Fazenda.

“Tanto as exportaçõe­s quanto as importaçõe­s cresceram no segundo semestre.” Ele acha que o bom desempenho deve se repetir este ano, embora não com um saldo comercial tão alto, em razão do aumento do consumo interno.

A chance mais concreta de acordo comercial importante é entre a UE e o Mercosul. “Ainda há dificuldad­es, tanto do lado europeu (cotas insuficien­tes de carne bovina, etanol) como do lado do Mercosul (pressão da indústria automobilí­stica)”, descreve Ricupero.

“Acho que o aproveitam­ento dos benefícios da integração do Brasil aos fluxos de comércio internacio­nal depende da revisão da orientação protecioni­sta de nossa política comercial”, avalia Pedro da Motta Veiga, diretor do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvi­mento (Cindes), no Rio. “Tenho hoje dificuldad­es para acreditar que tal revisão possa acontecer com uma abrangênci­a significat­iva nos primeiros anos do novo governo, ainda que tenha uma orientação liberal.” Essa é a constante que precisa mudar.

País precisa rever a orientação protecioni­sta de sua política comercial

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil