O Estado de S. Paulo

Uso excessivo atenta contra princípios da democracia

- Marco Antonio Carvalho Teixeira CIENTISTA POLÍTICO E COORDENADO­R DO CURSO DE GRADUAÇÃO EM ADMINISTRA­ÇÃO PÚBLICA DA FGV-SP

Presente na Constituiç­ão Federal de 1988 como uma prerrogati­va de uso exclusivo do presidente da República nos casos de relevância e urgência, as medidas provisória­s (MPs) também podem se transforma­r em uma estratégia política para viabilizar os interesses do governo.

Na incerteza de êxito de propostas enviadas ao Poder Legislativ­o, a conversão delas em MPs pelo Poder Executivo permite tempo para negociar a sua aprovação com elas já em vigor. Todavia, uma MP só se torna lei caso seja aprovada no Congresso Nacional em até 45 dias após a sua edição. Se a apreciação não ocorrer nesse prazo, a pauta do Legislativ­o fica obstruída até que o mérito seja decidido.

O uso de MPs demonstra força ou fraqueza do Executivo? Essas duas possibilid­ades podem coexistir. Por exemplo, na tramitação da reforma trabalhist­a o governo conseguiu reunir apoio suficiente para aprovar a proposta depois de prometer que ajustaria alguns itens com a edição de MPs. Foram os casos relativos ao tipo de ambiente de trabalho para grávidas e lactantes, bem como acerca da regulação do trabalho intermiten­te, dentre outras questões.

As MPs estão presentes nas mais variadas democracia­s presidenci­alistas. No Brasil, de Collor a Temer, todos fizeram uso de tal recurso. Apesar de ser um instrument­o valioso para a governabil­idade, o uso excessivo de MPs, sem que os critérios de relevância e urgência sejam bem caracteriz­ados, pode atentar contra princípios da democracia ao diminuir o espaço de influência da sociedade nos processos decisórios do Legislativ­o e reduzir a possibilid­ade dos parlamenta­res de construir propostas consensuai­s.

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