O Estado de S. Paulo

Coreias aceitam frear corrida militar após pacto sobre Olimpíada de Inverno

Diálogo aberto. Reunião foi marcada por sorrisos e apertos de mão, mas também por irritação de Pyongyang com tentativa de Seul de incluir programa nuclear nas negociaçõe­s; analistas afirmam que encontro está longe de ser ponto de inflexão entre os dois pa

- SEUL

O reencontro entre as Coreias do Norte e do Sul, o primeiro em mais de dois anos, abriu as portas para futuros encontros diplomátic­os e uma possível reaproxima­ção entre os dois países. A reunião de ontem, que durou mais de 11 horas, não tratou apenas da participaç­ão de Pyongyang nos Jogos Olímpicos de Inverno na Coreia do Sul, mas de questões espinhosas como a redução das tensões militares e a interrupçã­o de algumas sanções econômicas sul-coreanas.

Os representa­ntes da Coreia do Norte concordara­m em enviar à Coreia do Sul, para a Olimpíada de Inverno, uma delegação formada por atletas e torcedores, uma equipe de demonstraç­ão de Taekwondo e um grupo de jornalista­s. Os dois países também concordara­m em tomar medidas para reduzir as tensões militares na região. A Coreia do Sul pediu ainda a Pyongyang o fim de atos hostis na fronteira e disse estar preparada para suspender temporaria­mente algumas sanções para facilitar a participaç­ão norte-coreana nos Jogos.

A reunião na chamada ‘Casa da Paz’, na zona desmilitar­izada entre os dois países, começou de maneira tépida, com conversas amenas sobre o clima. “Rios e montanhas inteiras estão congeladas”, disse Ri Son-gwon, o principal negociador norte-coreano. “Não seria um exagero dizer que, em comparação com o clima da natureza, a relação intercorea­na esteja ainda mais congelada.”

A delegação norte-coreana, formada por cinco integrante­s, todos vestidos com ternos escuros justos e sapatos polidos, chegou à fronteira em um veículo militar e, em seguida, fez uma breve caminhada pela linha de demarcação do lado sul-coreano de Panmunjom.

Depois, os negociador­es dos dois países apertaram as mãos, posaram para fotos e começaram as conversas. Tanto o líder norte-coreano, Kim Jong-un, quanto o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, puderam ouvir as discussões em tempo real, e cada um deles tinha uma linha direta com a Casa da Paz.

Apesar dos avanços em relação à presença norte-coreana na Olimpíada de Inverno e na suspensão de algumas sanções, novas arestas apareceram durante as 11 horas de reunião. O principal negociador da Coreia do Norte, Ri Son-gwon, expressou forte descontent­amento com a tentativa dos sul-coreanos de debater a interrupçã­o do programa nuclear norte-coreano.

“Falando sobre a questão nuclear, todas as armas estratégic­as da Coreia do Norte, incluindo bombas atômicas e de hidrogênio, mísseis balísticos, foguetes, não estão em discussão e estão direcionad­as inteiramen­te para os EUA. Não têm nosso próprio povo como alvo, nem mesmo a China ou a Rússia”, disse Ri.

Ressalvas. O reencontro das Coreias foi um passo importante, mas está longe de significar uma mudança de direção na relação entre os dois países. “É claro que as duas partes chegariam a um acordo sobre a participaç­ão na Olimpíada de Pyeongchan­g sem qualquer problema, porque interessa para os dois líderes. Mas o que acontecerá depois?”, questionou Koh Yuhwan, professor de relações internacio­nais da Universida­de de Dongguk, na Coreia do Sul, ouvido pelo Washington Post. “Não será fácil chegar a um acordo imediato sobre a melhoria das relações entre as Coreias, as tensões militares e as sanções.”

Segundo especialis­tas, é possível que as sanções internacio­nais contra a Coreia do Norte estejam funcionand­o, que esta seja uma tentativa dos norte-coreanos de negociar a participaç­ão nos Jogos Olímpicos em troca do fim de algumas punições impostas pelo Conselho de Segurança da ONU.

“Já vimos isso em outras ocasiões e o comportame­nto da Coreia do Norte continuou o mesmo”, afirmou à revista Time John Delury, professor de relações internacio­nais da Universida­de Yonsei, em Seul. “Eles podem querer impor condições cada vez mais duras, como o fim dos exercícios militares entre EUA e Coreia do Sul e a suspensão de sanções, sem colocar freio em seu programa nuclear, e aí as conversas voltariam à estaca zero.”

“Não será fácil chegar a um acordo sobre a melhoria das relações entre as Coreias, as tensões militares e sanções”

Koh Yu-hwan

PROFESSOR NA UNIVERSIDA­DE DE DONGGUK, EM SEUL

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