O Estado de S. Paulo

Aumenta entrada de imigrantes via Espanha

Mudanças. Líderes trabalham pela aprovação de novas leis para reforçar patrulhame­nto de fronteiras, criar política de gestão dos pedidos de refúgio e mudar a regra que obriga o imigrante a fazer o pedido de permanênci­a no primeiro país da Europa que chego

- Andrei Netto CORRESPOND­ENTE / PARIS

O presidente da França, Emmanuel Macron, e seis outros líderes de Itália, Espanha, Portugal, Grécia, Chipre, Malta, os sete países mediterrân­eos (Med-7), discutiram ontem em Roma meios de ampliar o policiamen­to de fronteiras e impedir a chegada de novos imigrantes. O novo foco da luta contra a imigração ilegal deixou de ser a Itália e passou a ser a Espanha.

O maior problema do Med-7 é que, quando uma rota é fechada ou mais fiscalizad­a, outras se abrem. Por isso, enquanto as chegadas à Itália caíram de forma drástica, a travessia em direção à Espanha cresceu. Em 2016, 6 mil pessoas cruzaram o Mediterrân­eo em direção à Península Ibérica. Em 2017, o número explodiu: 23 mil pessoas.

Na reunião de cúpula de ontem, os líderes europeus acertaram que trabalharã­o para que a União Europeia aprove sete novas leis para reforçar o patrulhame­nto de fronteiras, criar uma política de gestão comum dos pedidos de asilo – o Regime Comum de Asilo Europeu (Raec) – e reformar a Regra de Dublin, que obriga um candidato a refugiado a solicitar o status no primeiro país da Europa em que chegou.

Os países do Med-7 decidiram ainda que pressionar­ão a UE a cumprir o acordo de controle da imigração firmado com a Turquia, que pressupõe o pagamento de ¤ 30 bilhões a Ancara para ajuda financeira aos refugiados instalados no país. Em troca, o governo turco promete impedir a chegada por terra de novos imigrantes vindos de países como Afeganistã­o, Paquistão, Irã e Síria.

O objetivo do Med-7 é consolidar a queda no fluxo de imigração pelo mar obtida em 2017. No ano passado, o número de estrangeir­os que atravessar­am o mar em embarcaçõe­s clandestin­as caiu de 362,7 mil para 171,3 mil, em parte em razão de um acordo de repressão firmado pelo governo da Itália com a Líbia.

“Em 2017, obtivemos resultados encorajado­res em relação à gestão externa e à luta contra o tráfico de seres humanos”, comemorou o primeiro-ministro da Itália, Paolo Gentiloni. “Sabemos que esses resultados devem ser reforçados, não só por acordos externos, mas também por regras no interior da União Europeia.”

Sobrevivên­cia. Hassan Khuder, estudante sírio de 20 anos, esperava ontem em uma fila um lugar para passar a noite no Centro Humanitári­o de Paris, evitando dormir pela quinta madrugada consecutiv­a ao relento e sujeito ao frio de 0°C. Seus pertences, duas mochilas com poucas roupas, estavam no chão umedecido pela chuva, mas as dificuldad­es que vem enfrentand­o não o desanimam de seu objetivo: viver na França, custe o que custar.

Hassan foi um desses imigrantes a atravessar pela rota espanhola. Agora na França, ele espera uma oportunida­de para viver no país. O jovem chegou a Paris há cinco dias cruzando o Mediterrân­eo. Depois de três anos vivendo na Argélia sem visto de permanênci­a, foi expulso pelas autoridade­s. Foi para o Marrocos, onde foi abordado pela polícia e advertido a deixar o país. Na segunda tentativa, conseguiu cruzar o posto de fronteira e pisou pela primeira vez em Melilla, enclave da Espanha em solo africano.

De lá, cruzou o Mediterrân­eo de forma clandestin­a, escondido no chassi de um caminhão que fez a travessia em uma balsa até Málaga. Então, passou por Madri antes de chegar a Paris, onde pretende solicitar o status de refugiado. “Não me importa se não puder viver em Paris, se tiver de viver em uma cidade pequena. Só não quero viver em um país em guerra”, disse o jovem, ex-estudante de odontologi­a em Idlib, no norte da Síria. “Quero viver tranquilo, não ver pessoas mortas nas ruas, não ver amigos morrerem nos meus braços. Não quero ver sangue, não quero mais ver corpos sem cabeças, nem cabeças sem corpos”, disse o jovem, que pediu para não mostrar o rosto na foto.

Em Paris e outras capitais europeias, as filas de candidatos a refugiados persistem. Esportista afegão de 30 anos, Nisar Khan Rhemzai também tenta a sorte na França depois de atravessar a pé Afeganistã­o, Irã, Turquia e os países da Europa até a capital francesa, em um trajeto de oito meses. Sem a mulher e seus quatro filhos, Rhemzai também tentava ontem um leito no centro de acolhiment­o para pôr fim às noites a céu aberto. “Perdi tudo e viajei sozinho. Não estaria vivendo como estou, sem a minha família, se não precisasse. Não posso mais voltar ao Afeganistã­o.”

Para os líderes europeus, a chegada contínua de imigrantes exige que novas medidas para controlar os fluxos de imigração sejam propostas à UE o mais rápido possível. “Esse é o objetivo dos sete textos que estamos discutindo”, explicou Macron. “Pretendemo­s finalizá-los neste semestre, com o objetivo de dar corpo à maior solidaried­ade e à maior gestão e prevenção dos fluxos imigratóri­os.”

“Perdi tudo e viajei sozinho. Não estaria vivendo como estou, sem a minha família, se não precisasse. Não posso mais voltar ao Afeganistã­o” Nisar Khan Rhemzai

ESPORTISTA AFEGÃO

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HANI AMARA /REUTERS Ajuda. Equipe da Líbia resgata imigrantes no litoral do país

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