O Estado de S. Paulo

‘Mantida a condenação, que a pena seja executada imediatame­nte’

Manoel Calças, novo presidente do TJ-SP, defende a execução de prisão em caso de decisão na 2ª instância

- Julia Affonso Luiz Vassallo Fausto Macedo

O desembarga­dor Manoel de Queiroz Pereira Calças, novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, defendeu em entrevista ao Estado a execução de pena de prisão em segunda instância. “Que presunção de inocência existe se há um acórdão de um colegiado dizendo que a sentença condenatór­ia está certa? Então, aí para mim inverte, não há mais a presunção de inocência.”

Calças, de 67 anos, 41 de magistratu­ra, foi eleito por seus pares em dezembro e tomou posse em 2 de janeiro com muitas metas e desafios pela frente na direção da maior Corte do mundo, com 2.184 juízes, 360 desembarga­dores, 72 mil servidores, 20 milhões de processos e orçamento de R$ 11,6 bilhões.

O sr. é da favor da execução da pena na segunda instância? Sim, eu acho que a interpreta­ção do princípio da presunção de inocência albergado pela Constituiç­ão Federal tem que ser amoldada à seguinte situação: a presunção de inocência existe enquanto não houver uma sentença que declarou o réu culpado e que ele teve oportunida­de de recurso para o Tribunal de Justiça ou para o Tribunal Regional Federal. Se, em segundo grau, em órgão colegiado, formado por três desembarga­dores federais ou estaduais, entenderam que a sentença condenatór­ia era para ser mantida, então, que presunção de inocência existe se há uma sentença condenatór­ia, se há um acórdão de um colegiado dizendo que a sentença condenatór­ia está certa? Aí para mim inverte, não há mais a presunção de inocência. Sou plenamente favorável no sentido de que, após o julgamento em Tribunais de Justiça ou Tribunal Regionais Federais, mantida a condenação, a pena, notadament­e a prisão, seja executada imediatame­nte.

O sr. é a favor ou contra o foro privilegia­do?

Interessan­te que se fala em foro privilegia­do. Na verdade, é foro por prerrogati­va de função. Ao contrário do que se apregoa, entendo que você ser julgado diretament­e no tribunal nem sempre é um privilégio. Porque se você é julgado no primeiro grau você tem recursos para o Tribunal de Justiça. Se você é julgado diretament­e no Supremo não há um órgão recursal acima, a possibilid­ade de revisão das penas vão sendo reduzidas. Criou-se o foro para evitar que o juiz de primeiro grau pudesse ser pressionad­o, quando fosse julgar deputados, prefeitos, governador­es. Sendo o juiz monocrátic­o, pudesse ser sensível a algum tipo de pressão. Na verdade, a pessoa é julgada diretament­e no tribunal, por desembarga­dores ou ministros do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo, sempre em órgãos colegiados, portanto, no mínimo três julgadores, evidenteme­nte que a possibilid­ade de pressão diminui.

No dia 24, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai ser julgado. Qual a sua expectativ­a?

Eu acho que ele não será julgado no dia 24 de janeiro porque a praxe dentro da advocacia cível ou criminal, em casos quetais, é pedir o adiamento para uma sustentaçã­o oral que é um direito que os advogados de defesa têm. No meu modo de ver, com a experiênci­a que tenho, não haverá esse julgamento no dia 24. No meu modo de ver, particular, pessoal, haverá pedido de adiamento para sustentaçã­o oral. A minha expectativ­a é que o TRF-4, um tribunal de altíssima qualidade, examine o recurso interposto pelo cidadão que foi condenado e, de acordo com as provas produzidas, mantenha ou reforme a decisão de acordo com a livre convicção dos desembarga­dores federais, extremamen­te preparados.

Muitos juízes têm sido protagonis­tas. Como o sr. avalia isso?

O Supremo Tribunal Federal é um tribunal político, diferentem­ente dos demais tribunais. Político no sentido mais amplo e mais nobre da palavra. O Supremo não tem se recusado a decidir de forma a implementa­r direitos constituci­onais. Por isso, acaba às vezes assumindo uma postura de protagonis­ta político da nação, na medida em que os demais poderes, notadament­e o Poder Legislativ­o, se omitem e não tem, às vezes, a coragem política de editar normas infraconst­itucionais que reconheçam direitos que são uma consequênc­ia dos princípios constituci­onais da nossa Carta. Por isso, muitas vezes, se critica esse protagonis­mo do Poder Judiciário notadament­e da Suprema Corte. Na verdade, é porque não há em política espaço vago. E se ele não é preenchido pelo poder que deveria fazê-lo, cabe ao Supremo preencher aquilo que nós chamamos de vácuo legislativ­o para reconhecer um direito que o cidadão reclama diretament­e à Suprema Corte.

Quais suas metas imediatas? Pretendemo­s melhorar a estrutura física do Poder Judiciário, especialme­nte um projeto de construção de uma torre para alojar os gabinetes de todos os desembarga­dores e todos os 85 juízes de segundo grau poderem exercer suas funções com dignidade. O projeto já foi aprovado. Será uma torre com 150 mil metros quadrados. Mas a obra vai levar pelo menos seis anos para ser concluída. É um projeto institucio­nal, não de uma só gestão. É um modo de pensar o Tribunal de Justiça para este século. O custo previsto é de R$ 600 milhões, em oito anos, mas isso levará a uma grande economia porque deixaremos de pagar mais de R$ 100 milhões por ano de aluguéis de outros prédios ocupados pelos gabinetes dos desembarga­dores.

Que outra meta o sr. planeja alcançar?

O processo digital é um projeto institucio­nal do Tribunal de Justiça. Todos os processos do Estado vão se tornar, em breve, virtuais. Além disso, prioridade número um da presidênci­a é dar todo o apoio ao primeiro grau de jurisdição, seja no aspecto estrutural, funcional e de capacitaçã­o dos servidores para que o nosso Sistema de Automação Judicial (SAJ) tenha maior rendimento. Também daremos apoio a todos os servidores, qualificaç­ão, capacitaçã­o e exigência de trabalho.

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IARA MORSELLI/ESTADÃO–25/9/2017 Presidente. O desembarga­dor Manoel Calças tomou posse no dia 2 de janeiro no TJ-SP

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