O Estado de S. Paulo

‘É inevitável que outras agências façam o mesmo’

Para economista, situação fiscal do País deve levar Moody’s e Fitch a rebaixarem a nota de crédito brasileira

- Luciana Dyniewicz

O rebaixamen­to da nota do Brasil é consequênc­ia da falta de atenção do governo para a situação fiscal do País no curto prazo, segundo avaliação da economista Monica de Bolle. Para ela, as ações do governo acabaram deterioran­do ainda mais as contas públicas. “A operação ‘Salva Temer’ (para que os parlamenta­res barrassem as investigaç­ões contra o presidente) levou a uma piora consideráv­el da situação fiscal de curto prazo”, destaca.

O rebaixamen­to era esperado?

Era. A situação fiscal do Brasil simplesmen­te não teve nenhuma melhora (desde que Temer assumiu). Teve até uma piora. Tendo em vista que veio da S&P, a agência com avaliação mais técnica, essa é uma avaliação bastante negativa da equipe econômica que todo mundo esperava que fizesse tanto pelas contas públicas.

O governo estava concentrad­o em fazer reformas que precisavam do Legislativ­o. No Executivo, acabou fazendo pouco do ponto de vista fiscal?

O governo poderia ter feito muito mais. No meio das discussões do teto dos gastos, em 2016, alertei para isso. Disse que o teto dos gastos não tinha nenhum tipo de sustentaçã­o sem a reforma da Previdênci­a. Afirmei que a reforma da Previdênci­a era uma coisa muito difícil de se fazer, sobretudo por um governo cercado de dúvidas na parte política. A estratégia do governo foi fazer uma imensa propaganda em cima das reformas de médio prazo sem que elas tivessem saído do papel – a da Previdênci­a em particular – e ao mesmo tempo não dando atenção ao curto prazo, inclusive piorando, porque a operação “Salva Temer” levou a uma piora consideráv­el da situação fiscal. Isso, inevitavel­mente, ia levar alguém a dar uma nota baixa para o Brasil no quesito arrumação das contas públicas.

O que poderia ter sido feito?

Para início de conversa, a reversão das desoneraçõ­es da Dilma, que tanto o Meirelles quanto o Temer já entraram no governo dizendo que não iam fazer. É incompreen­sível

que um governo que se vendeu como alguém que vinha para consertar as besteiras que o governo anterior havia feito tenha descartado a reversão das desoneraçõ­es como uma medida urgente e necessária, inclusive para fazer jus à narrativa que eles estavam plantando junto à imprensa e aos analistas de mercado. Todo mundo comprou isso. Todo mundo achou legal e chamou de “dream team” (time dos sonhos). A verdade é que pouco desfizeram o legado da Dilma na área fiscal.

O que Temer ainda pode fazer?

Nada. Esse governo está em final de mandato, prestes a encarar uma campanha presidenci­al que será extremamen­te tensa e barulhenta. Não há cabeça nenhuma no Congresso ou em qualquer outro lugar voltada para uma preocupaçã­o com o País, haja vista as ambições presidenci­ais do nosso próprio ministro da Fazenda. Não é hora do ministro estar fazendo reuniões como potencial candidato presidenci­al tendo em vista os problemas que não resolveu. No entanto, essa é a situação que temos: um ministro em campanha presidenci­al e um Congresso que não está interessad­o em discutir reforma.

A tendência é que as outras agências também rebaixem a nota?

As agências têm um calendário próprio. Mas é algo meio inevitável, porque a situação fiscal do País é insustentá­vel.

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MARCOS DE PAULA/ESTADÃO-14/2/2012 Reflexo. Governo poderia ter feito mais, diz Monica

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