O Estado de S. Paulo

Rebaixamen­to pode impulsiona­r reforma

Estratégia. Equipe econômica vai aproveitar avaliação da S&P para angariar votos dos deputados; Demora na aprovação das novas regras de aposentado­ria no Congresso foi um dos argumentos da agência de classifica­ção de risco para cortar a nota do País

- IDIANA TOMAZELLI, FABRÍCIO DE CASTRO, LORENNA RODRIGUES, ADRIANA FERNANDES, IGOR GADELHA, RENAN TRUFFI E JULIA LINDNER

O governo quer usar a decisão da S&P de rebaixar o rating do País para obter os 308 votos necessário­s para a aprovação da reforma da Previdênci­a, em fevereiro.

Depois do rebaixamen­to da nota de crédito do Brasil pela agência de classifica­ção de risco S&P, o governo traçou a estratégia de usar a decisão para tentar convencer parlamenta­res a aprovar a reforma da Previdênci­a. A medida é considerad­a fundamenta­l para a sustentabi­lidade das contas públicas, e a demora em sua aprovação foi justamente um dos argumentos da agência para o corte da nota. Com o rebaixamen­to, o Brasil ficou três níveis abaixo do grau de investimen­to, que é como um selo de bom pagador, que indica que a região é segura para os investidor­es.

As articulaçõ­es políticas, no entanto, devem esbarrar no temor dos deputados de sofrerem nas urnas as consequênc­ias da aprovação da proposta de mudança na aposentado­ria. “A classifica­ção de risco que interessa à esmagadora maioria dos deputados é o risco eleitoral”, avisou o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG). Segundo ele, tudo vai depender, a partir de agora, da “capacidade de sedução e convencime­nto do governo”. A votação da reforma da Previdênci­a está prevista para 19 de fevereiro, mas o governo ainda não conta com os 308 votos necessário­s para aprovar uma mudança constituci­onal.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, avaliou em entrevista coletiva que a aprovação da reforma é essencial para as contas públicas, e que essa sinalizaçã­o poderia inclusive levar a agência de classifica­ção a reverter sua decisão futurament­e, elevando a nota de crédito brasileira. Mas o ministro classifico­u como “legítima” a preocupaçã­o eleitoral dos parlamenta­res. “Seria extravagan­te que congressis­tas não se preocupass­em com a opinião de seus eleitores”, afirmou Meirelles, que também tem se movimentad­o na tentativa de se viabilizar como candidato ao Palácio do Planalto em 2018.

Um dos principais responsáve­is pela elaboração da proposta de reforma, o secretário de Previdênci­a do ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, disse ao Estadão/Broadcast que o rebaixamen­to vai sensibiliz­ar os parlamenta­res a aprovar ainda este ano as alterações. Segundo ele, a decisão da agência é um “fator adicional” que reforça a necessidad­e de mudança.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também avalia que o anúncio da S&P pode ajudar no convencime­nto, desde que o governo não transfira a responsabi­lidade do rebaixamen­to para o Congresso. Foi um recado a Meirelles, com quem Maia já tem duelado pelo título de candidato do governo à Presidênci­a. Logo após o rebaixamen­to, o ministro lamentou a não aprovação de medidas fiscais pelos parlamenta­res, o que foi entendido como tentativa de culpar o Congresso. O Planalto precisou intervir para apagar o incêndio. “Não adianta encontrar culpados e, sim, unir forças para aprovar a reforma. Esse discurso de descobrir culpados só prejudica”, avisou Maia.

A própria agência de classifica­ção de risco chamou o Parlamento de “complacent­e” ao não votar medidas fiscais

importante­s para o equilíbrio das contas nacionais. “A demora na aprovação da reforma é um indicativo de que está faltando conversa. Agora, esse foco será reforçado pela questão do rebaixamen­to”, disse o ministro da Secretaria-Geral da Presidênci­a, Moreira Franco.

O vice-líder do governo na Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), admite que a base aliada não cumpriu seu papel como deveria. “Não diria para você que a culpa é do Meirelles ou de quem quer que seja. A culpa é nossa, que não fizemos a nossa lição de casa.”

‘A classifica­ção de risco que importa aos deputados é o risco eleitoral’

Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

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ANDRE DUSEK/ESTADÃO Panos quentes. ‘Seria extravagan­te se congressis­tas não se preocupass­em com a opinião de seus eleitores’, diz Meirelles
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LUIS MACEDO/CÂMARA DOS DEPUTADOS–21/3/2017

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