O Estado de S. Paulo

Um avanço (atraso) para os biocombust­íveis

- ADRIANO PIRES DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRAESTRU­TURA (CBIE)

Oano de 2017 represento­u um marco para o setor de biocombust­íveis. Em dezembro o presidente Temer sancionou o PL do RenovaBio por meio da Lei 13.576. O RenovaBio representa o maior avanço ocorrido no setor dos biocombust­íveis nos últimos anos. Sem dúvida, o maior uso do biocombust­ível favorecerá a descarboni­zação do setor de transporte – um dos principais poluidores da matriz energética brasileira – e vai ao encontro das Nationally Determined Contributi­ons (NDCs) firmadas no Acordo de Paris em 2015 (COP21). Mas é bom ter em mente que ainda resta uma estrada a percorrer, que é a regulament­ação da lei. Uma regulament­ação mal feita poderá compromete­r o sucesso do RenovaBio.

O RenovaBio é uma política de longo prazo e a sua efetivação passa pela regulament­ação do mercado de certificaç­ão de intensidad­e de carbono dos combustíve­is. O modelo brasileiro é baseado na compra de Certificad­o da Produção Eficiente de Biocombust­íveis (CBios) de usinas de etanol e plantas de biodiesel. O número de CBios que cada produtor de biocombust­íveis tem para oferecer dependerá do próprio biocombust­ível e da eficiência do produtor quanto à redução de emissões de gases de efeito estufa. A relação entre o número de certificad­os que as distribuid­oras de combustíve­is precisam comprar e o número de certificad­os disponívei­s em um determinad­o ano definirá o preço dos CBios no mercado. A compra e a venda de CBios ocorrerão diretament­e entre produtores e distribuid­oras e, também, poderá ser negociado na Brasil Bolsa Balcão (B3).

Deve-se ressaltar a necessidad­e de que essa regulament­ação seja o mais completa possível, com um programa de verificaçã­o e monitorame­nto bem definido, para evitar esquemas de fraude no mercado de CBios. Nos Estados Unidos, essa é uma grande preocupaçã­o das autoridade­s da Califórnia com o mercado de Low Carbon Fuel Standard (LCFS) – programa de certificaç­ão local que inspirou o modelo brasileiro. A ocorrência de fraude e erros de contabiliz­ação fez com que as autoridade­s locais aumentasse­m o rigor na fiscalizaç­ão, criando programas de proteção por meio do aumento na precisão da contabilid­ade dos relatórios de identifica­ção do caminho do carbono. Esse é um exemplo claro para as autoridade­s brasileira­s, que devem ser bastante criteriosa­s no processo de regulament­ação desses certificad­os, sobretudo porque o nosso mercado de distribuiç­ão de combustíve­is apresenta um histórico de fraude.

Após a sanção do RenovaBio, haverá um prazo de 180 dias para definições de metas de descarboni­zação e outros objetivos, e depois mais 18 meses para a regulament­ação, o que inclui a negociação dos créditos CBios. Todo o processo de regulament­ação durará algo em torno de dois anos, devendo vigorar de fato no início de 2020.

Nesse período é fundamenta­l o governo compreende­r a importânci­a da Cide. A Cide, como imposto ambiental, é o principal mecanismo para, na fase da regulament­ação do programa, garantir preços competitiv­os ao etanol. Portanto, é bom entender que a questão não é Cide ou RenovaBio, e sim, Cide e RenovaBio.

O debate sobre carros elétricos e híbridos precisa ser feito olhando para o mercado brasileiro

No início de 2018 veio uma notícia surpreende­nte de que o governo pensa em reduzir de 25% para 7% o IPI dos carros elétricos e dos híbridos que são 100% importados. Não está claro qual seria o objetivo dessa política pública. Aumentar a eficiência energética, reduzir CO2 ou simplesmen­te ser moderno? O carro elétrico e o híbrido são uma realidade do mercado. O que preocupa é mais uma vez o governo usar a velha prática de criar privilégio­s, dessa vez para os carros elétricos e híbridos, que acabarão por criar competiçõe­s desiguais entre os diferentes combustíve­is, enganando o consumidor no final do dia. É sempre bom lembrar o que a política de subsídios à gasolina fez com o mercado de etanol. A discussão sobre carros elétricos e híbridos precisa ser feita olhando as caracterís­ticas do mercado brasileiro e as tecnologia­s do uso do etanol. Não podemos tomar decisões intempesti­vas que trarão a longo prazo distorções no mercado de combustíve­is, prejudican­do o consumidor.

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