O Estado de S. Paulo

Bizarrices e mágoas

- ADRIANA FERNANDES E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS COLUNISTA DO BROADCAST

Ébizarra a narrativa que as principais lideranças do Congresso tentaram construir logo após o emblemátic­o rebaixamen­to da nota de crédito do Brasil pela agência de classifica­ção de risco Standard & Poor’s. É o primeiro downgrade do presidente Michel Temer e tudo indica não será o único a depender a reação dos caciques políticos da base governista. Menos um degrau o Brasil vai se juntar aos países de risco altamente especulati­vo para s os investidor­es internacio­nais.

Os presidente­s da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Eunício Oliveira, correram para acusar o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de ter responsabi­lizado o Congresso pela queda da avaliação do País. Maia chegou a dizer que estava “magoado” e Eunício afirmou (sem contar com a memória) que o Congresso ultrapasso­u “todos os limites” para entregar o que a equipe econômica pedia.

Os dois dirigentes do Parlamento brasileiro e todos os senadores e deputados que se manifestar­am ressentido­s com Meirelles, esqueceram de falar que foi a própria agência que culpou o Congresso pela incertezas em relação aos rumos da economia por conta dos desequilíb­rios fiscais.

O tucano Marcus Pestana (MG) foi quem melhor resumiu o quadro sem pudores. Disse que a classifica­ção de risco que interessa à esmagadora maioria dos deputados é o risco eleitoral.

A agência foi clara. Relembrand­o: o relatório da S&P diz que, apesar dos vários avanços, o governo não conseguiu apoio no Congresso para fortalecer a trajetória fiscal. E mais: O congresso é complacent­e e não aprova as reformas e as medidas fiscais.

Não se trata, somente do adiamento da reforma da Previdênci­a. Mas também de todo o titubeio que os parlamenta­res têm manifestad­o em torno do enfrentame­nto da crise fiscal.

Em entrevista ao correspond­ente do Estadão/Broadcast, Ricardo Leopoldo em Nova York, Lisa Schineller, diretora da S&P, afirmou com todas as letras que redução da nota soberana do País não foi provocada exclusivam­ente pela não aprovação da reforma da Previdênci­a Social pelo Congresso em dezembro, mas mais pelo padrão adotado, sobretudo, pela classe política de não se unir para combater problemas estruturai­s vitais na área fiscal.

Não se faz ajuste sem dor e muito menos sem medidas impopulare­s e pressão por aumentos de gastos. Há um descompass­o sem solução em um Congresso que barra as tentativas de redução de gastos e ao mesmo tempo o aumento de tributos, inclusive para os brasileiro­s mais ricos do Brasil com aplicações em fundos exclusivís­simos de investimen­tos.

Até a noite da ultima quinta-feira, quando a S&P anunciou o rebaixamen­to, a equipe econômica estava conseguind­o postergar o downgrade lançando mão de uma série de “ativos” positivos. Eles vinham funcionand­o como um choque de expectativ­as a cada revés da política fiscal. Uma hora o encaminham­ento de uma proposta dura de reforma da Previdênci­a e a liberação das contas inativas do FGTS para ajudar na retomada. Outra hora a reforma trabalhist­a e o pacote fiscal com medidas de aperto nas despesas de pessoal.

Depois do adiamento da reforma da Previdênci­a para 2018, o governo tinha em mãos um baita ativo, a divulgação no final do mês do resultado das contas públicas no ano passado, com a redução em cerca de R$ 40 bilhões do déficit previsto. O cresciment­o mais forte da economia era outro trunfo do governo como também a inflação e juros mais baixos.

Não deu certo. A S&P não quis esperar depois do acirrament­o do jogo político para as eleições entre os aliados que transforma­ram o ministro Meirelles em alvo. Candidato a candidato à presidênci­a da República, o ministro não foi poupado de um ataque especulati­vo nem mesmo pelo presidente Temer.

Na tentativa de se colocar como o comandante do processo de escolha do candidato do centro às eleições, o presidente rifou Meirelles ao dizer para o Estado que o preferia no Ministério da Fazenda, descartand­o seu nome para o Palácio do Planalto nas eleições deste ano.

Até discreto nas repostas aos ataques e evitando o confronto, Meirelles pode dar o troco. Endurecer o discurso fiscal e cobrar mais do Palácio do Planalto. Se Meirelles revidar e for mais rigoroso com o ajuste, ele pode colocar o presidente Temer numa saia-justa em ano eleitoral.

Não se faz ajuste sem dor e muito menos sem medidas impopulare­s

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