O Estado de S. Paulo

Preço do gás para indústria e comércio já acumula alta de 34%

Consumidor­es industriai­s reclamam da imprevisib­ilidade dos reajustes e começam a estudar alternativ­as

- Renée Pereira

Ao contrário do setor residencia­l, que a partir de agora terá reajustes trimestrai­s, os consumidor­es industriai­s e comerciais do Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) vão continuar com imprevisib­ilidade em relação ao preço do combustíve­l e cronograma de revisões. De junho do ano passado até dezembro, os reajustes médios da Petrobrás nesse segmento somaram 34%, segundo dados do Sindicato Nacional das Empresas Distribuid­oras de GLP (Sindigás).

A sequência dos aumentos abalou o caixa dos consumidor­es que dependem do combustíve­l para produzir e provocou uma queda de 1,44% no consumo do gás até novembro do ano passado. A escalada dos preços chega num momento delicado da economia e do setor empresaria­l, que lentamente se recupera de uma grave recessão.

Para as companhias, o cenário é complicado e sem muitas alternativ­as. Se de um lado o preço do gás não para de subir, a outra opção seria enfrentar o encarecime­nto da energia elétrica (combustíve­l que poderia substituir o gás). Mas, apesar disso, algumas empresas estudam mudanças na matriz energética.

No passado, como o preço da eletricida­de estava muito alto, alguns estabeleci­mentos convertera­m os equipament­os para gás, que era mais vantajoso por causa do preço. Hoje, no entanto, pegam o caminho inverso. Na empresa de Vicente Silva, dono de uma rede de panificado­ras no Vale do Paraíba, 70% da produção era movida a gás e 30%, à energia elétrica. Com a alta do preço do gás, esse mix está em 50% cada. “Antes era 100% a eletricida­de, mas trocamos os equipament­os para gás e agora somos obrigados a rever essa política”, diz Silva.

Mas nem todos tem essa opção. A proprietár­ia da Mister Clean Lavanderia Industrial, Simone Montenegro, diz que a conversão das secadoras para energia elétrica significar­ia o fechamento do negócio. “Já fizemos essa tentativa, mas é inviável. Não temos saída.” Ela conta que, além de sofrer com os aumentos diretos do GLP, ainda tem de incorporar nos custos o avanço dos preços dos fornecedor­es pelo mesmo problema.

Atualmente há dois grandes segmentos de GLP. O P-13 é o botijão de 13 quilos vendido sobretudo para o consumidor residencia­l. O industrial e comercial usam o gás a granel, que são aqueles botijões maiores, fixos e que são abastecido­s localmente. Os aumentos mensais ocorreram nos dois segmentos para repassar o preço praticado no mercado internacio­nal.

Subsídio. O presidente do Sindigás, Sergio Bandeira de Mello, critica a política da Petrobrás e acusa a estatal de promover um subsídio cruzado entre o residencia­l e o industrial/comercial. Os aumentos promovidos nos últimos meses foram feitos baseados nos preços internacio­nais. Para o executivo, o valor do GLP para as empresas está 36% acima da paridade internacio­nal (que considera os custos de fretes e outros componente­s). Enquanto isso, o valor do P-13, para o residencia­l, está 5,2% abaixo da paridade.

A Petrobrás diz que os preços do gás para o consumo residencia­l obedecem uma resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que “reconhece como de interesse para a política energética nacional a comerciali­zação” de GLP “a preços diferencia­dos e inferiores aos praticados para os demais usos”.

O diretor do Centro Brasileiro de Infraestru­tura (Cbic), Adriano Pires, não condena a política da Petrobrás de acompanhar o preço do mercado internacio­nal, mas ele avalia que é preciso cortar os subsídios nessa área. “O produto é o mesmo para o residencia­l e para as empresas, então o preço tem de ser igual.” Pires afirma que não se pode usar combustíve­l para fazer distribuiç­ão de renda, uma vez que quem usa GLP pode ser o consumidor pobre ou rico. “Se é para ter subsídio, então que recriem o vale-gás.”

As empresas que dependem do combustíve­l criticam a falta de previsibil­idade. Simone Montenegro, da Mister Clean, afirma que seus contratos preveem reajustes anuais com base no IGP-M. “Ou seja, não conseguire­i repassar esses aumentos. No fim do ano, por exemplo, sempre contrato alguém para ajudar nas encomendas; neste ano, tivemos de fazer sozinhos os trabalhos extras.”

Na Metalcoati­ng, empresa que faz revestimen­tos anticorros­ivos de tubos, a situação é ainda pior. Os contratos são de três anos com reajustes indexados à inflação. “No ano passado, tivemos reajuste de 34%; o combustíve­l representa 28% dos custos de fabricação e soma um aumento de custo direto de 9,6%”, afirma Felipe Marcicano de Goes, gerente industrial da empresa.

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