O Estado de S. Paulo

Polarizaçã­o alimenta apoio a regimes autoritári­os

- Matt O’Brien / W.POST É JORNALISTA / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

Ogoverno da Venezuela conseguiu fazer do país que tem as maiores reservas de petróleo do mundo um Estado arrasado no qual falta comida, sobra violência e o dinheiro não vale nada. Apesar disso, seu controle do poder ainda parece forte. Ele neutralizo­u os tribunais, fustigou a imprensa e substituiu o Legislativ­o controlado pela oposição por um mais maleável, integrado apenas por chavistas. Nem mesmo os protestos em massa puderam impedir a guinada ao autoritari­smo. E por que não? Porque a Venezuela de Nicolás Maduro aprendeu o que o Zimbábue de Robert Mugabe havia aprendido uma década atrás: é possível fazer o povo ficar a seu lado, não importando as privações, se ele concluir que os opositores são inimigos.

Conclui-se, então, que revoluções não precisam apenas de pão: também se alimentam de polarizaçã­o. Essa é única explicação para o fato de que dois dos governos que mais arruinaram as economias de seus países em anos recentes sejam também os que mais duram no poder. A Venezuela tem a maior inflação do mundo, a segunda maior taxa de desemprego, o terceiro maior índice de homicídios e o décimo maior nível de corrupção. Para se ter uma ideia de como a situação é grave, o FMI calcula que a inflação seja hoje de 1.000% ao ano, devendo chegar a 2.000% quando o ano terminar. O governo, claro, parou de publicar as estatístic­as. A moeda nacional morreu. Houve uma queda de 99,99% nos últimos seis anos. Foi o mesmo que ocorreu no Zimbábue, apenas com números ainda piores.

Ambos os regimes nasceram da oposição à extrema desigualda­de e a regimes que se locupletav­am no poder. No caso da Venezuela, o fator deflagrado­r foi o abismo entre ricos e pobres. No caso do Zimbábue, foi o sistema racista que as autoridade­s coloniais adotaram e os colonizado­res brancos mantiveram. O que significa que as sociedades dos dois países há muito estavam profundame­nte divididas. Continuar leal a um presidente, mesmo que ele eventualme­nte mate pessoas na rua, é o tipo de comportame­nto que leva os países à ruína.

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