O Estado de S. Paulo

Trigêmeas colecionam 14 medalhas em provas de Matemática.

Fabiele, Fábia e Fabíola, de 17 anos, colecionam 14 medalhas em olimpíada brasileira da área

- Vinícius Rangel ESPECIAL PARA O ESTADO

Em Santa Leopoldina, município na zona rural do Espírito Santo a 67 km de Vitória, uma casa simples, sem acesso à internet, guarda 14 medalhas da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep). Elas foram conquistad­as pelas trigêmeas Fabiele, Fábia e Fabíola Loterio, de 17 anos. Além das medalhas, a casa onde as meninas moram com os pais, que trabalham com agricultur­a familiar, guarda histórias de dedicação aos estudos e muitos sonhos. “Queremos ser pesquisado­ras, dar aulas em universida­des e, um dia, me vejo sabendo tudo sobre essa matéria, um gênio talvez”, conta, rindo, Fabiele.

Para chegar ao pódio da Obmep, as trigêmeas estudaram muitas vezes com livros emprestado­s. E os resultados apareceram logo no primeiro ano de competição, em 2011, quando cursavam a 5.ª série. “Ninguém acreditava. Passamos a primeira fase, entramos na segunda e acabamos recebendo a menção honrosa”, lembra Fabíola. “Depois, em 2012 e 2013, eu ganhei as primeiras medalhas da família.” Fabíola entrou, então, no Programa de Iniciação Científica Júnior e passou a estudar um sábado por mês na Universida­de Federal do Espírito Santo (Ufes). “Lá foi diferente. Pude ver a matemática com outros olhos e isso me fez querer aprender mais.”

Em 2014, foi a vez das irmãs conquistar­em medalhas e entrarem no programa. “A gente achava que não tinha ido bem. Quando veio o resultado nacional foi surpreende­nte. Entramos no programa e conhecemos outras pessoas apaixonada­s por matemática. Saíamos de casa às 4h30 para a aula das 8h30. Todo esforço valia a pena”, diz Fábia.

Depois, estudaram no Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), em Santa Teresa, região serrana capixaba. Passavam a semana no local, onde concluíram o ensino médio integrado à Agronomia. Neste ano, fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e se candidatam a uma vaga na faculdade pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu). O curso não poderia ser outro: Matemática.

Diferentem­ente da maioria das adolescent­es da idade, as irmãs nunca sonharam em conhecer artistas famosos. Elas imaginavam, sim, como seria estar frente a frente com o brasileiro Artur Ávila, de 38 anos, o primeiro latino-americano a receber a Medalha Fields, o Nobel da Matemática. O encontro aconteceu em 2015, no Rio, em uma premiação da olimpíada. “O cara é superior quando se fala em matemática. Quem sabe, no futuro, trabalhare­mos com ele. Sabemos que é difícil, quase impossível, mas já pensamos em ser experts”, diz Fabiele.

Os pais das meninas tiveram pouca chance de estudar. Paulo José Loterio, de 61 anos, parou na 1.ª série e a mãe, Lauriza Luiza Loterio, de 54, na 4.ª. “Além das trigêmeas, temos outra filha mais velha, e nunca deixamos nenhuma pegar na enxada. Sempre mostrei que o lugar delas era estudando para ter um futuro diferente do nosso presente”, afirma a mãe, que só descobriu no sétimo mês da gravidez que esperava três bebês.

A irmã mais velha também é motivo de orgulho e inspiração. Doutoranda em Biotecnolo­gia na Ufes, Flavia Loterio, de 26 anos, foi a primeira filha de agricultor­es do distrito a cursar uma faculdade.

Capacidade. Professor no Ifes, Frederico César Ribeiro acompanha as três desde 2015. Segundo ele, elas têm capacidade acima da média de aprender. “Além disso, são esforçadas e têm um conhecimen­to muito grande da área.” Ribeiro conta que a chegada das medalhista­s fez crescer o número de alunos no Ifes. “As meninas influencia­m os colegas e criam um ambiente propício para o estudo.”

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:GABRIEL LORDELLO/ ESTADÃO Futuro. Filhas de pais com pouco estudo, irmãs capixabas querem ser pesquisado­ras e dar aulas na universida­de
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