CHEF DO SÉCULO XX
Grandes cozinheiros falam sobre a principal lição aprendida com Paul Bocuse.
Uma palavra repetida à exaustão desde a morte do chef francês e ícone da gastronomia mundial Paul Bocuse, anunciada no último sábado (20) pelo governo francês, é “generosidade”. Além de ter sido um dos maiores cozinheiros da história da França, com trânsito entre a clássica e a nouvelle cuisine, foi um grande mestre para os cozinheiros mais importantes da atualidade. Conseguir uma oportunidade de estágio em seu restaurante L'Auberge du Pont de Collonges era como um rito de passagem que foi perseguido por nomes tão importantes quanto Jean-Georges Vongerichten e Daniel Boulud. E como conta Laurent Suaudeau, chef francês radicado no Brasil desde 1979, ao mesmo tempo que Bocuse apostava na capacidade do jovem, se notasse que não havia comprometimento deste, era duro, virava bicho. Paladar saiu em busca de cozinheiros que tiveram a experiência marcada pelo gênio de Bocuse, fosse por uma passagem em seu restaurante ou em sua escola, o Instituto Paul Bocuse, fundado nos anos 1990 em Lyon. Perguntamos a eles qual a principal lição obtida do chef. Boulud diz que a principal lição deixada por Bocuse é a de buscar o produto mais fresco. Todas as manhãs, o cozinheiro ia ao mercado em Lyon e era seguido por outros profissionais que, ao fim das compras, se reuniam para um café e um lanche. “Sua cozinha era de ingrediente e tradição”, afirma o francês que comanda o estrelado Daniel, em Nova York. A relação entre Boulud e Bocuse é antiga, os dois se conheciam desde que o primeiro tinha 14 anos. “Ele foi sempre uma figura que me guiou, um mentor. Não trabalhei para ele, mas fui seu estagiário e por toda a minha carreira ele sabia onde eu estava e com quem trabalhava. Ele encarnava fraternidade, generosidade, paixão, disciplina e joie de vivre”, afirma. O chef e professor Laurent Suaudeau, que trabalhou com Bocuse por nove anos e veio ao País indicado pelo mestre, diz que com ele aprendeu a nunca se atrasar. “Nunca me atrasei, mas vi outros atrasados, que ele botou para correr. Com ele, aprendi muito sobre disciplina de uma forma muito abrangente, desde a vida pessoal e o condicionamento individual, até a performance profissional”, diz. “Amor, humor e paixão devem ser os únicos segredos de um bom cozinheiro”, cita Claude Troisgros, chef e apresentador que conhece Bocuse desde o berço. Seu pai Pierre era muito próximo ao chef e, quando tinha oito anos, Troisgros assinou um contrato redigido em um guardanapo que afirmava que seu primeiro emprego seria com Bocuse. Quando cresceu, a promessa foi cumprida. O chef triestrelado Alain Ducasse, outro discípulo, que organizou a festa dos 80 anos de Bocuse, diz que, além de um pioneiro e líder de uma grande revolução na cozinha, Bocuse é uma inspiração. “Ele colocou o C maiúsculo à frente da palavra cozinha. Moldou o DNA e construiu as fundações da cozinha francesa, que desde então são base para os valores universais da gastronomia em todo o mundo”, afirma. Pascal Valero, que comanda a cozinha do Jean-Georges Tangará, restaurante de Vongerichten, também aluno de Bocuse, afirma que com ele aprendeu que há de se ter muita experiência e prática para se tornar um verdadeiro chef de cozinha.
“Para ele, cozinhar não era uma afetação, mas uma habilidade” Daniel Boulud
Chef do Daniel, em NY EVAN AGOSTINI “Unia energia, criatividade, generosidade, e liderou a grande evolução da cozinha francesa” Alain Ducasse
Chef triestrelado ERIC GAILLARD “Abriu sua cozinha para milhares de estagiários do mundo inteiro em uma época que não se falava em globalização” Laurent Suaudeau
Chef e professor JF DIORIO/ESTADÃO “Ajudou os amigos, acreditou nos jovens, sempre com palavras generosas e bem humoradas” Claude Troisgros
Chef ROBERTO SEBA/ESTADÃO