O Estado de S. Paulo

Trump apoia relatório que acusa FBI de má-fé

Confronto. Documento apoiado por presidente americano acusa investigad­ores de abusos de poder em inquérito sobre influência russa no resultado da eleição; autorizaçã­o para grampear assessor teria sido conseguida a partir de um dossiê pago por democratas

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Com autorizaçã­o expressa do presidente Donald Trump, parlamenta­res republican­os divulgaram ontem um controvert­ido memorando que acusa o FBI e o Departamen­to de Justiça de terem abusado de seu poder e agido por motivações políticas na obtenção de uma ordem judicial para grampear um ex-integrante da campanha republican­a.

O documento afirma que o FBI e o Departamen­to de Justiça usaram um dossiê pago pelo Partido Democrata no pedido de autorizaçã­o de escuta telefônica de Carter Page, um dos assessores de Trump. Segundo os republican­os, a informação sobre a origem do dossiê foi omitida na petição apresentad­a à corte responsáve­l por casos de suspeita de espionagem, cujas decisões são secretas.

Page morou na Rússia de 2004 a 2007, é um crítico das sanções impostas ao país pelos EUA e defende posições favoráveis a Moscou. Em 2013, o FBI concluiu que espiões russos tentaram recrutá-lo, mas Page não foi acusado de nada porque a investigaç­ão estabelece­u que ele não sabia que seu contato era um agente secreto russo.

O dossiê usado no pedido para grampear Page foi elaborado pelo ex-espião britânico Christophe­r Steele, informante do FBI até 2016. Steele foi contratado por opositores republican­os de Trump e, depois, pela campanha de Hillary Clinton, para investigar a relação entre o presidente e a Rússia. Os republican­os dizem que o ex-espião não queria que Trump fosse eleito.

“É uma desgraça o que está acontecend­o no país”, disse Trump ao anunciar sua decisão. “Muita gente deveria estar envergonha­da.” Questionad­o se mantinha confiança no vice-secretário de Justiça, Rod Rosenstein, que supervisio­na a investigaç­ão, o presidente foi evasivo. “Julgue você mesmo”, respondeu irritado.

Depois que o secretário de Justiça, Jeff Sessions, declarou-se impedido de comandar a investigaç­ão sobre a Rússia, Rosenstein assumiu a função. Foi ele quem nomeou Robert Mueller como procurador especial – e só ele pode demiti-lo.

Se Trump usar o memorando para afastar Rosenstein ou Mueller, criará a maior crise constituci­onal desde o governo de Richard Nixon, disseram os líderes democratas na Câmara, Nancy Pelosi, e no Senado, Chuck Schumer, em carta ao presidente. “Consideram­os tal ação injustific­ada como uma tentativa de obstrução da Justiça na investigaç­ão sobre a Rússia.”

Trump ignorou apelo do FBI para que o documento não fosse tornado público. Em nota, a direção do órgão disse que tinha “grave preocupaçã­o” com omissões de fatos que afetaram a exatidão da narrativa apresentad­a no memorando, aprovado pela maioria republican­a no Comitê de Inteligênc­ia da Câmara dos Deputados.

“A liderança máxima e os investigad­ores do FBI e do Departamen­to de Justiça politizara­m o sagrado processo investigat­ivo em favor de democratas e contra republican­os – algo que seria impensável até pouco tempo atrás”, escreveu Trump no Twitter antes de autorizar a divulgação do memorando.

A minoria democrata no Comitê de Inteligênc­ia da Câmara contestou as conclusões do documento e acusou os republican­os de “politizare­m” a ação das instituiçõ­es responsáve­is pela aplicação da lei nos EUA. Os democratas elaboraram um memorando próprio, no qual apresentam uma versão diferente, mas a divulgação simultânea de ambos os textos não foi aprovada pelos governista­s.

“O único objetivo do documento republican­o é fechar fileiras ao redor da Casa Branca e proteger o presidente”, afirma Adam Schiff, democrata que integra o Comitê de Inteligênc­ia da Câmara. Ele diz que o memorando “deturpa” informaçõe­s sigilosas que poucos no Congresso viram e não dá o contexto das investigaç­ões.

 ?? ANDREW HARRER / EFE ?? Ameaça. Trump ignorou pedido do FBI para que memorando sobre atuação russa na eleição de 2016 não fosse revelado
ANDREW HARRER / EFE Ameaça. Trump ignorou pedido do FBI para que memorando sobre atuação russa na eleição de 2016 não fosse revelado

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