O Estado de S. Paulo

Assédio. Atriz Rose McGowan fala sobre Harvey Weinstein.

Atriz conta em livro detalhes de como foi abusada por Harvey Weinstein

- Hillel Italie AP / NOVA YORK / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

“Que ele desapareça”, disse Rose McGowan durante uma entrevista à agência de notícias AP na quarta-feira, dia 31. “Minha afirmação é verdadeira. É a realidade. Pare de dizer que foi consensual! Você sabe que não é verdade.”

O produtor de cinema Harvey Weinstein divulgou um comunicado na terça-feira, 30, citando um alegado e-mail do exagente de Rose, dizendo que a atriz falara de um encontro consensual com ele. Weinstein foi acusado por várias mulheres de assédio sexual, revelações que levaram a outras acusações contra Matt Lauer, Charlie Rose e dezenas de homens.

Rose McGowan, de

44 anos, está promovendo uma trilogia (“Uma santa trindade sem a santa”, como ela diz) de novos projetos, que inclui o álbum Planet 9, o documentár­io Citizen Rose, e o livro autobiográ­fico Brave, que chega ao Brasil em março com título Coragem.

O livro traz um relato gráfico de quando foi abusada pelo produtor de cinema, que ela chama de “o monstro”, em um hotel, há 20 anos. Além dos seus comentário­s, Rose também divulgou, durante a entrevista, um comunicado dizendo que as declaraçõe­s do produtor têm, como única finalidade, difamá-la.

“É uma afronta não apenas para Rose, mas para as centenas de mulheres que revelaram ter sido vítimas de assédio, abuso sexual e estupro, perpetrado­s por Harvey Weinstein e outros iguais a ele. Esta é uma tentativa triste, arcaica, sexista e patética de corroer a verdade óbvia, e a manipulaçã­o psicológic­a não mais será tolerada.”

Rose McGowan fechou um acordo para escrever o livro Brave em 2016, bem antes da criação do movimento #MeToo, mas afirma que sempre soube que o mundo mudaria, em parte porque ela o mudaria. Em

Brave, ela descreve como sobreviveu ao que afirmou ser uma fase da sua vida de tentativas de lavagem cerebral, desde o culto influencia­do pelo cristianis­mo ao qual sua família pertencia quando era criança até seus anos em Hollywood.

Rose é conhecida por filmes como Pânico (1996) e Indo Até o Fim (1997), além da série de TV

Charmed (cuja primeira temporada foi ao ar em 1998). Mas ela diz que encerrou sua carreira como atriz e descreve o tempo em que trabalhou com “apenas um emprego”, desdenhand­o a recente retomada de

Charmed como uma ideia “frouxa”. Ela adorou dirigir Dawn, um curta sobre o assassinat­o de uma menina inocente, que comparou ao seu tempo no mundo do cinema.

Rose diz estar entusiasma­da para trabalhar em outras formas de arte. Fã de escritores como a chilena Isabel Allende e o colombiano Gabriel García Marquez, cujo livro O Amor nos Tempos do Cólera ela relê todo ano, Rose revela um projeto de escrever uma história de ficção sobre uma menina de 11 anos. Durante a entrevista, falou também do seu amor pelas artes visuais e pela música e do sentimento de libertação quando trabalha por trás das câmeras, e não diante delas. Ela também se referiu à matéria de capa da revista Time (elegendo o movimento #MeToo a Personalid­ade do ano de 2017) intitulada The Silence Breakers (as pessoas que romperam o silêncio). Veja a seguir alguns destaques da entrevista:

Sobre saber que seu livro Brave seria lançado em meio à eclosão do movimento #MeeToo. Claro que sabia. Sou a arquiteta

Foi muito angustiant­e escrever e falar sobre esse assunto (abuso). O que eu realmente queria era me agachar e gritar”

do movimento, como não saberia? A intenção nunca foi de que o livro se destinasse a quem faz ouvidos de mercador. Sempre tive de romper a máquina de propaganda de Hollywood; não foi casualidad­e. Não foi o caso de ser a primeira a falar. Era eu por trás dos bastidores.

Sobre como se sentiu ao contar sua história.

Foi muito traumatiza­nte escrever sobre esse assunto, sob muitos aspectos. Isso porque você escreve uma passagem e depois tem de ir jantar e exibir uma face romântica ou uma face humana e se colocar diante do mundo, quando o que realmente você quer é se agachar e gritar. As pessoas que conheço indagavam: “É catártico?”. E eu respondia: “Não, ainda não, estou esperando por esse dia”.

Sobre nunca mais atuar.

Já prestei um serviço público suficiente dessa forma. Já fiz o necessário. Meu trabalho foi ensinar um grupo restrito de seguidores e fãs e pessoas, que reagiram, por fim. Foi o que fiz. Eles compreende­ram. Estamos agora mudando para o cérebro.

Sobre não querer se candidatar a um cargo.

Sou global, meu trabalho é global e totalmente fora do sistema. E meu trabalho é examinar a estrutura de poder. Não acredito em fronteiras. Não acredito em leis, especialme­nte em leis relacionad­as ao corpo das mulheres.

Sobre seu desagrado com a frase usada pela revista Time (The Silence Breakers), em sua reportagem de capa elegendo o movimento #MeToo como a Personalid­ade do ano.

Como se atrevem. Simplesmen­te vocês não ouviram. Este é um título inapropria­do. Errôneo e com um discurso falso. Como se todas nós de repente conseguimo­s coragem para falar. Não – vocês simplesmen­te tiveram a coragem de ouvir.

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TAYLOR JEWELL/INVISION/AP Revelações. ‘Coragem’, biografia de Rose McGowan, chega em março ao Brasil

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