O Estado de S. Paulo

A crônica de um desastre

- JOSÉ MÁRCIO CAMARGO PROFESSOR DO DEPARTAMEN­TO DE ECONOMIA DA PUC/RIO E ECONOMISTA DA OPUS INVESTIMEN­TOS

Ocomportam­ento do mercado de trabalho brasileiro nos últimos três anos reflete a qualidade das políticas econômicas adotadas neste período. Entre o primeiro trimestre de 2015 e o primeiro trimestre de 2017, segundo a Pnad Contínua do IBGE, a taxa de desemprego no País passou de 7,9% para 13,7% da força de trabalho. Um aumento de 5,8 pontos de porcentage­m (p.p.) em dois anos.

No primeiro trimestre de 2015, a taxa de desemprego era 0,5 p.p. maior que a taxa de desemprego no primeiro trimestre de 2014. No trimestre fevereiro/abril de 2016, este diferencia­l havia atingido 3,2 p.p. A partir deste trimestre, o diferencia­l estabilizo­u em torno de 3,0 p.p. até o primeiro trimestre de 2017.

Esta evolução da taxa de desemprego está diretament­e associada à redução do total de pessoas ocupadas ao longo deste período. Entre o segundo trimestre de 2014 e o terceiro trimestre de 2016, o total da população ocupada passou de um cresciment­o de 2,0% ao ano, para uma queda de - 2,5% ao ano.

A queda da ocupação atingiu todas as categorias de trabalhado­res. No primeiro trimestre de 2014, o total de trabalhado­res com carteira assinada estava próximo a 37 milhões de pessoas. No trimestre janeiro/março de 2017, este número havia caído para 33,5 milhões. Os trabalhado­res ocupados sem carteira assinada passaram de 35 milhões no início de 2014 para 32,5 milhões no início de 2016.

Finalmente, como decorrênci­a da forte aceleração da taxa de inflação no biênio 2015/2016 e do aumento da taxa de desemprego, a taxa de variação dos rendimento­s reais dos trabalhado­res empregados passou de 2,0% ao ano para uma queda de - 4,0% ao ano. Esta é a crônica do desastre.

Com a troca de governo em meados de 2016, a mudança de política econômica e a implementa­ção de um importante conjunto de reformas, o comportame­nto da economia tomou uma direção completame­nte diferente e, seis meses depois, o mercado de trabalho passou a refletir esta mudança.

Após atingir o ápice de 13,7% no primeiro trimestre de 2017, o desemprego inicia uma tendência de queda acentuada, atingindo 11,8% da força de trabalho no último trimestre do ano. Uma redução de 1,9 ponto de porcentage­m em nove meses.

Se compararmo­s com experiênci­as passadas este desempenho é bastante positivo. No período 2002/2014, considerad­o um dos melhores períodos do mercado de trabalho brasileiro, a queda média mensal da taxa de desemprego foi de 0,05 p.p. Ao longo de 2017, a taxa de desemprego apresentou uma queda de 0,13 p.p. por mês. Ou seja, 2,4 vezes mais rápido.

Como ocorreu em outras retomadas, no início, a redução do desemprego está associada a um aumento da ocupação sem carteira assinada e dos trabalhado­res por conta própria. Existem razões objetivas para que assim seja. O custo de demissão dos trabalhado­res sem carteira assinada é menor que o dos trabalhado­res com carteira. Como no início do processo de recuperaçã­o existe muita incerteza quanto ao desempenho futuro da economia, as pequenas empresas tendem a contratar trabalhado­res sem assinar a carteira de trabalho pois, caso a retomada não se mantenha, a perda é menor.

Quanto ao aumento do número de trabalhado­res por conta própria, nossa avaliação é positiva

Quanto ao aumento do número de trabalhado­res por conta própria, nossa avaliação é que este é um dado positivo. Um trabalhado­r por conta própria não é um empregado, mas um pequeno empresário. Como tal, ele não está no mercado de trabalho, mas no mercado de bens e serviços e, portanto, responde a variações na demanda por estes bens e serviços.

Se o número de trabalhado­res por conta própria está aumentando é porque a demanda por bens e serviços está aumentando, e viceversa. Afinal, o pipoqueiro só sai para vender pipoca se houver demanda por pipoca. Este é um dos melhores indicadore­s antecedent­es do comportame­nto da demanda na economia brasileira. E, portanto, sinaliza que a economia está saindo da recessão. Sem dúvida, um bom sinal!

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