O Estado de S. Paulo

Unidos pelo sonho

Ricardo Tozzi e Reynaldo Gianecchin­i veem o mundo e Brasil em ‘O Guardas do Taj’

- Leandro Nunes

Hoje só quero fazer trabalhos que discutam a importânci­a de olhar para dentro de si, de se conhecer” Ricardo Tozzi

O fim da corrupção vai demorar, mas temos que ficar atentos e nos acalmar” Reynaldo Gianecchin­i

Minutos depois de colocar fogo em algumas plantações na cidade de Lavras, em Minas Gerais, o ator Ricardo Tozzi faz uma pausa para falar com o Estado. Essa será a rotina do personagem Xavier Vidal na novela Orgulho e Paixão, que estreia em março, na Globo. “Eu ainda não sei dizer de onde vem tanto ódio, mas ele tem essa força de destruição nele.” O vilão que incendeia cafezais para vender os terrenos mais baratos no folhetim de época inspirado no romance Orgulho e Preconceit­o, de Jane Austen, não se parece em nada como Babur, jovem guarda que assegura, ao lado do rígido Humayun, interpreta­do por Reynaldo Gianecchin­i, a construção do Taj Mahal no espetáculo Os Guardas do Taj, em cartaz no Teatro Raul Cortez.

A montagem de Rafael Primot e João Fonseca que estreou em Portugal, tratou de aquecer a dupla em uma turnê quatro cidades lusitanas com uma história sobre amizade e sonho escrita pelo autor norte-americano Rajiv Joseph. A rápida identifica­ção dos rostos do elenco, dada o sucesso das novelas no país europeu, foi a primeira de muitas boas vindas que receberam. “O público português gosta muito de frequentar teatro e é sempre muito generoso”, afirma Gianecchin­i. Tozzi vai além e diz que parte da simpatia compartilh­ada tem a ver com a atual situação do país. “Eu brinco que Portugal vive os nossos anos 90, talvez por trazer certa inocência e calma que não temos mais. Mas hoje o país parece estar num momento ótimo. Há uma auto estima e prosperida­de estampada na cara de todas as pessoas.”

Essa atmosfera singela também acompanha os primeiros minutos da peça, só no começo. Na montagem ambientada no ano de 1648, em Agra, na Índia, os guardas, e amigos de longa data cumprem o trabalho rotineiro de proteger o palácio que foi erguido pelas mãos de 20 mil homens. As muitas lendas sobre a construção monumental empreendid­a pelo imperador Shah Jahan em homenagem à sua esposa favorita são citadas pela dupla e o ponto de vista deles é tudo que se tem. “O foco é nos dois, nessa amizade entre homens tão diferentes”, conta Gianecchin­i que afirma não ser nada parecido com o rígido Humayun. Tozzi também não se identifica tanto com a inocência e o encantamen­to de Babur, mesmo que o personagem seja fascinante. “Ele tem um pouco de Peter Pan, ignora as regras de que guardas não podem falar, chega atrasado sempre, e se sente entediado com um tipo de trabalho que não lhe dá prazer, além de uma falta de limites” Os dois são como céu e terra, de um lado a racionaliz­ação de Humayun e de outro o poder de imaginação de Babur, o que cai como luva na performanc­e dos atores. Tozzi desequilib­ra a postura fixa e aparenteme­nte concentrad­a de Gianecchin­i, que só relaxa quando encontram um sonho em comum: trabalhar como guardas no harém do imperador, espaço proibido a homens e reservado apenas às mulheres de Sha Jahan e os eunucos. A imagem divertida é substituíd­a por um acontecime­nto funesto, uma ordem do imperador que passa a atribular a dupla e de todos os trabalhado­res do Taj. É quando os guardas tem sua consciênci­a despertada, algo que interessa ao duo de atores. Quando Babur se desespera, a cena a seguir é a que vale toda a peça – um dos momentos mais bonitos vistos no teatro paulistano nesse ano.

Para Gianecchin­i, desde o tratamento e recuperaçã­o do câncer, em 2011, sua rotina é organizada de modo menos veloz, uma mudança que surgiu após conhecer o espiritual­ista Sri Prem Baba. “Nesse período precisei rever muitas coisas em minha vida, a partir de um processo de autoconhec­imento. Passei uma temporada na Índia, em um retiro de 12 dias em silêncio total, que foi poderoso.”

Essa filosofia de fortalecim­ento também é perseguida por Tozzi. “Uma agenda de seis horas de gravação é sempre muito puxada demais. Se deixar, os trabalhos vão se emendando e com o tempo você percebe que está apreciando menos avida, entrando no automático. Hoje só quero fazer trabalhos que me interessem como esse que discute a importânci­a de olhar para dentro de si, de se conhecer.” Para ele, o Rio e o Brasil seguem num caminho nebuloso, com um futuro ameaçado. “O Rio está numa espiral de desespero”, afirma Tozzi. “O funcionári­o público, que é símbolo de um emprego seguro, não recebe salário .” Enãoé diferente na internet enasre desso ciais. Tozzi recorda quando postou um vídeo sobre liberdade de expressão – na ocasião da performanc­e La

Bête, apresentad­a no MAM, em São Paulo, e as reações foram negativas .“Chegaram amecham arde pedófilo. Apos toques e eu postar um vídeo sobre a condenação do Lula, vão querer me passara faca ”, afirma.

Para Gianecchin­i, as bandeiras tremulam com raiva, eis sotem impedido o país de dialogar .“As pessoas estão descrentes. Mesmo assim te mosquete ruma visão crítica, paranã o vir aruma guerra. O fim da corrupção é um processo que vai demorar, mas temos de nos manter atentos, e se acalmar.”

OS GUARDAS DO TAJ

Teatro Raul Cortez. R. Dr. Plínio Barreto, 285. Tel.: 3254-1631. 6ª, sáb., 21h, dom., 18h. R$ 60 / R$ 80. Até 25/3.

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ALEX SILVA/ESTADÃO Coroa. Eles guardam as lendas do palácio indiano
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Os atores com uns dos diretores, Rafael Primot
ALEX SILVA/ESTADÃO Trio. Os atores com uns dos diretores, Rafael Primot

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