O Estado de S. Paulo

Ainda é pouco

- LUÍS EDUARDO ASSIS

Em setembro de 2012, a revista The Economist publicou um anúncio de emprego. Procurava-se um profission­al com grande habilidade de comunicaçã­o e ótimo relacionam­ento interpesso­al. O candidato também deveria ter ilibada reputação e conhecimen­to avançado de mercados financeiro­s, além de bons conhecimen­tos de economia. Deveria ainda inspirar confiança e credibilid­ade não só na instituiçã­o que o contratari­a, como também perante o mercado financeiro. O anúncio também esclarecia que o local de trabalho seria a região central de Londres, mas era preciso ter disponibil­idade para viagens frequentes.

O emprego era para ser presidente do Bank of England, o equivalent­e ao Banco Central deles. Mark Carney, então presidente do Banco Central canadense, ficou interessad­o e se candidatou. Foi entrevista­do por uma firma de recrutamen­to de executivos e acabou sendo o primeiro estrangeir­o a liderar uma das instituiçõ­es mais importante­s do mundo das finanças.

A lembrança vem à tona quando discutimos aqui em terras tabajaras o efeito devastador do loteamento de cargos de direção de empresas estatais entre os partidos que dão sustentaçã­o ao governo. Ainda recentemen­te, quatro vicepresid­entes da Caixa Econômica Federal suspeitos de envolvimen­to em corrupção foram afastados. Ato contínuo, a Caixa aprovou a reforma de seus estatutos, instituind­o regras mais rigorosas para a nomeação de seus executivos.

A escolha da “nomenklatu­ra” das empresas controlada­s pelo governo enfrenta, pelo menos, três desafios. É imperioso, em primeiro lugar, evitar que cargos que exijam conhecimen­to técnico específico sejam barganhado­s entre os que apoiam politicame­nte o governo, até porque se não for para assegurar privilégio­s para apaniguado­s os próprios partidos não teriam interesse em fazer indicações. Além disso, é necessário barrar a sanha do corporativ­ismo dos funcionári­os de carreira, sequiosos de manter uma reserva de mercado. Por fim, também é preciso proteger as empresas estatais da captura por representa­ntes de interesses privados, que poderiam fazer uso da máquina pública para satisfazer setores dos quais esperam benesses. A solução desta equação não é simples e dizer que é necessário buscar um equilíbrio é apenas uma platitude que nada explica.

Não parece, mas estamos avançando neste terreno. A Lei 13.303 de junho de 2016 estabelece vedações para a contrataçã­o de membros da diretoria e do Conselho de Administra­ção de empresas públicas e sociedades de economia mista. Não poderão participar da alta administra­ção, entre outros, dirigentes de partidos políticos, titulares de mandato legislativ­o, ministros, secretário­s estaduais e municipais, assim como representa­ntes do órgão regulador a que a empresa se submete. Esta vedação é extensiva a parentes até o terceiro grau. Também estão impedidas as pessoas que exerçam cargo em organizaçã­o sindical ou que tenham firmado contrato como fornecedor

São regras mais rígidas que caminham na direção correta, apesar do vezo nitidament­e corporativ­ista

ou comprador da empresa estatal nos últimos 36 meses.

O novo estatuto aprovado pela Caixa Econômica Federal vai além da determinaç­ão legal e também proíbe a nomeação para o corpo diretivo de parentes até terceiro grau de membros do Conselho de Administra­ção, da Diretoria ou do seu Conselho Fiscal.

São regras mais rígidas que caminham na direção correta, apesar do vezo nitidament­e corporativ­ista. Mas seria melhor anunciar as vagas em jornais e revistas, de forma transparen­te e impessoal, assegurand­o uma escolha criteriosa e objetiva. Melhor mesmo seria reduzir o número de estatais para que este problema não fosse relevante.

ECONOMISTA, FOI DIRETOR DE POLÍTICA MONETÁRIA DO BANCO CENTRAL E PROFESSOR DA PUC-SP E FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS-SP; EMAIL: LUISEDUARD­OASSIS@GMAIL.COM

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