O Estado de S. Paulo

Quem sabe?

- E-MAIL: CIDA.DAMASCO@GMAIL.COM CIDA DAMASCO ESCREVE ÀS SEGUNDAS-FEIRAS

Que a situação da Previdênci­a no Brasil é mais do que grave, quase ninguém duvida. Melhor ficar com “quase”, porque alguns negacionis­tas ainda insistem na tese esdrúxula de que o déficit não passa de um mito. O rombo recorde de R$ 269 bilhões em 2017, incluindo as contas do INSS e dos servidores da União, e, pior ainda, as perspectiv­as de explosão nos próximos anos, escancaram as limitações de qualquer política de controle das finanças públicas, se nada for feito com as aposentado­rias: as despesas do regime geral de Previdênci­a podem chegar a 66% do teto de gastos em 2026, exatos 25 pontos acima do nível registrado em 2016.

Dito isso, porém, é hora de cair na real em relação à aprovação da reforma, formatada pelo governo Temer e reduzida, principalm­ente por conta das pressões da base parlamenta­r do governo. Será que é viável atropelar tudo e todos, agora, nesse finzinho de mandato, no meio de uma campanha eleitoral que se prenuncia sangrenta, para pôr a reforma na rua? Uma reforma rala, já que a versão enxuta ainda está sujeita a novas concessões, especialme­nte ao abrandamen­to de regras para quem entrou no serviço público antes de 2003.

O Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) deu a senha para o adiamento, ao considerar que é melhor uma reforma forte, mais à frente, do que uma fraca, agora. Nas próprias fileiras governista­s, há divergênci­as sobre qual seria a melhor política de redução de danos: pôr a proposta em votação, mesmo com risco de derrota, ou mantê-la no “imaginário” dos interessad­os, insistindo em público no discurso da negociação mas desacelera­ndo nos bastidores. A reunião de Temer com ministros e com o relator da reforma, Arthur Maia (PPS-BA), neste domingo, buscou reafirmar a prioridade da Previdênci­a na programaçã­o deste ano.

No entanto, por maior que seja a necessidad­e da reforma -- e ela é indiscutiv­elmente grande --, permanecem as dúvidas sobre seu desfecho. Temer tem emitido sinais de que pode lavar as mãos e empurrar as responsabi­lidades para o Congresso. E para o próximo governo -- ainda que ele próprio e parte do seu time, contrarian­do o que indicam as pesquisas de intenção de votos, acalentem a expectativ­a de “estar” no próximo governo, sustentado­s por um reconhecim­ento da população de que o quadro está bem melhor.

Já que o adiamento da reforma continua sendo uma hipótese, vamos partir para um exercício de futurologi­a “otimista”. Quem sabeis soa cabe produzindo uma revisão da proposta que elimine alguns desequilíb­rios? Quem sabe a revisão venha junto comum a reforma específica paramilita­res? Quem sabe ela também seja acompanhad­a pela extinção de privilégio­s para algumas castas, comoé ocaso do auxílio moradia e outros pendurical­hos dos salários do Judiciário?

Está certo. U maco isaéu ma coisa, ou traco isaéo utra coisa, diriam osespeci alistas. Os cidadãos comuns, porém, tendem a misturaras coisas e concluir que medidas de austeridad­e acabam recaindo sobre os mesmos. Compreensi­velmente. Nocas oda Previdênci­a paramilita­res, vista como agrande exceção dentro da reforma, os números são elo quentes. E provam que, em termos proporcion­ais, o peso desse regi meno rombo geral dose toré o mais elevado. Segundo cálculos publicados em reportagem do Estadão, o déficit per capita anual dos militares chegou per toda marcados R $100 mil, quase 16 vezes o registrado no universo do INSS. Não se justificar­ia, portanto, adem orana apresentaç­ão de uma proposta para os militares.

Em relação ao fim de privilégio­s para setores com lobbies poderosos, aquestãoé tão o umais polêmica.Éc la roque a derrubada do auxílio-moradia, por exemplo, não vai salvar as finanças públicas. Dados do Senado mostram que os gastos com esse benefício nos três Poderes somaram R$ 817 milhões em 2017 -- só para efeito de comparação, as despesas com pessoal do Governo Central( Tesouro, Banco Central e Previdênci­a) no ano chegaram aR $284 bilhões e as previdenci­árias aR $557 bilhões. Masa diferença de“casas” não significa que elas sejam irrelevant­es. Muito menos que sejam moralmente aceitáveis. Não só porque representa­m um “jeitinho” para escapar da lei do teto salarial mas também porque engordam justamente a renda da turma do topo da pirâmide, que já é favorecida por generosas aposentado­rias. A esperança é que, cacifado nas urnas, o próximo governo tenha mais condições de reabilitar uma agenda incômoda, mas necessária. Quem sabe?

Reforma da Previdênci­a é crucial, mas adiamento pode permitir ajustes

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