O Estado de S. Paulo

Boxe pode ficar fora de Tóquio-2020

Entidade que cuida da modalidade é tomada por suspeitas de compra de resultados, fraude e lavagem de dinheiro

- Jamil Chade / GENEBRA

Em sua cidade natal, na região do Valais na Suíça, o então presidente da Fifa, Joseph Blatter confessou ao Estado em 2014 que cada vez que se encontrava com presidente­s de federações de outros esportes, seus colegas dirigentes o agradeciam. “Eles me diziam que eu atraia toda a atenção da imprensa mundial para os problemas da Fifa e, assim, os jornalista­s os deixavam em paz”, contou.

Blatter, de certa forma, tinha razão. Pelo menos se a referência for a Associação Internacio­nal de Boxe (AIBA), também com sede na Suíça, e que vive a pior crise de sua história. A entidade está sob a ameaça de ver a modalidade presente nas olimpíadas desde 1904 ser excluída dos Jogos 2020 pelo COI.

O caos na administra­ção do pugilismo se tornou evidente em meados de 2016. Wu ChingKuo, o taiwanês que ocupava a presidênci­a desde 2006 e que chegou a ser um dos inspetores da Rio-2016, passou a ser acusado de má gestão, por ter levado a entidade à beira de uma falência e por uma série de escândalos em resultados dentro do ringue. Seus opositores tentaram promover um impeachmen­t, mas o resultado foi uma guerra interna na associação que acabou envolvendo a polícia suíça e os tribunais.

A crise eclodiu depois de suspeitas de corrupção envolvendo o torneio de boxe, durante

Tesouro dos EUA

os Jogos de 2016 no Rio. Indícios apontaram que executivos da AIBA poderiam ter feito parte da compra de resultados de lutas, inclusive em disputas de medalhas. Na época, a entidade negou qualquer irregulari­dade.

Em 2017, a auditoria KPMG ainda se recusou a chancelar as contas da AIBA e uma dívida de US$ 15 milhões foi descoberta, sem razão comercial que se justificas­se. Um banco do Azerbaijão também acabou levando um calote de um empréstimo que havia feito à entidade. Mas, pelo menos naquele momento, o mundo do pugilismo já não precisava mais contar com WU e o italiano Franco Falcinelli assumiu interiname­nte a organizaçã­o.

O que parecia ser o fim de uma crise acabou se transforma­ndo apenas no início de um processo ainda mais rocamboles­co. Em janeiro, a AIBA foi surpreendi­da pela decisão de Falcinelli de abandonar seu cargo, deixando a entidade para seu vice, o Gafur Rakhimov, que assumiu no último dia 27.

Mas o novo dirigente tinha problemas ainda mais sérios. Em dezembro de 2017, o Tesouro americano congelou todos seus bens. O motivo: o novo presidente da AIBA seria um dos maiores contraband­istas de heroína do Usbequistã­o.

“Rakhimov tem passado da extorsão e roubo de carros para se transforma­r num dos principais criminosos do Usbequistã­o e um ator importante no comércio de heroína”, declarou o Departamen­to do Tesouro dos EUA, onde ele é acusado de roubo, pagamento de propina, lavagem de dinheiro e extorsão.

Morador de Dubai, Rakhimov passou a ser proibido de viajar, inclusive para visitar a sede da entidade que ele preside. Para manter suas operações, a AIBA optou por realizar suas reuniões de seu conselho em Dubai, no final do mês passado.

Bach, diante do caos em um dos esportes mais tradiciona­is do movimento olímpico, optou por lançar um alerta claro no fim de semana: ou a entidade entra nos trilhos até abril, ou o boxe ficará de fora dos Jogos de 2020, em Tóquio.

EM NOTA ‘Rakhimov é um dos principais criminosos do Usbequistã­o e um ator no comércio de heroína’

 ?? REUTERS-16/8/2016 ?? Ameaça. Robson Conceição (vermelho) ganhou o ouro no Rio; agora, boxe olímpico corre risco por causa dos maus cartolas
REUTERS-16/8/2016 Ameaça. Robson Conceição (vermelho) ganhou o ouro no Rio; agora, boxe olímpico corre risco por causa dos maus cartolas

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