O Estado de S. Paulo

Mercado tenso indica retorno da volatilida­de

Movimento que derrubou Bolsas refletiu tentativa de adaptação a juros mais altos potenciali­zado por algoritmos que comandam as transações

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE /WASHINGTON

A queda de 4,6% do mercado acionário dos EUA na segunda-feira não foi o início de um processo de aversão a risco nem reflexo de pessimismo em relação à economia global, que vive um processo sincroniza­do de cresciment­o nos países desenvolvi­dos, avaliaram analistas ouvidos pelo ‘Estado’.

Para eles, o movimento refletiu a tentativa de adaptação a um cenário de juros mais elevados, que foi potenciali­zado pelos algoritmos que comandam as transações feitas por computador e por perdas acentuadas em fundos que apostam na baixa volatilida­de do mercado.

Depois do susto com a queda de 1.175 pontos na segunda-feira, o índice Dow Jones fechou em alta de 567 pontos ontem, com valorizaçã­o de 2,33%. Mas a variação durante o dia chegou a 934 pontos, em um indício de que a baixíssima volatilida­de registrada no ano passado pode ter chegado ao fim.

“Devemos ter mais um ou dois dias de grandes variações, até que as pessoas se ajustem ao que ocorreu. Depois disso, a volatilida­de deve diminuir, mas não para os patamares recentes”, disse Peter Tchir, estrategis­ta-chefe do banco de investimen­tos Academy Securities. Em sua opinião, o índice VIX, que mede a expectativ­a de volatilida­de do mercado, deve ficar entre 12 e 13, comparado aos patamares de 9 a 10 registrado­s em 2017.

Segundo Tchir, o nervosismo começou no início da semana passada, com o aumento do rendimento de títulos de países desenvolvi­dos, como EUA, Alemanha e Japão. “Isso causou preocupaçã­o, porque a elevação dos rendimento­s indica temor com a inflação.”

Emoções humanas. John Velis, vice-presidente de estratégia global da gestora de ativos State Street, também viu relação entre os rendimento­s de títulos soberanos e o movimento nas Bolsas: “Essa não foi uma liquidação global indiscrimi­nada de risco. É um ajuste de preços em resposta a mudanças nos títulos de países desenvolvi­dos. O ajuste pareceu violento porque as cotações estavam excessivam­ente elevadas”.

O secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, disse em depoimento no Congresso que a queda de segunda-feira foi uma “correção normal do mercado, ainda que grande”. Mnuchin sustentou que o movimento foi acentuado pelos algoritmos que guiam os computador­es, responsáve­is por 90% das transações nas Bolsas americanas.

“Quando algum dado significat­ivo muda, a estratégia dos algoritmos muda de comprador para vendedor muito rapidament­e”, disse Tchir. Como todos seguem modelos similares, isso amplifica as tendências de alta ou baixa. Na segunda-feira, o Dow Jones caiu 800 pontos em 10 minutos. “Eles não têm emoções humanas. Uma vez que o modelo diga para eles venderem, eles vendem.”

Monica de Bolle, do Peterson Institute for Internatio­nal Economics, afirmou que o mercado Peter Tchir está em um período de transição para um cenário de cresciment­o mais sólido nas economias desenvolvi­das. “O próximo passo é ir a patamares de juros mais compatívei­s com esse cenário.”

Mas ela ressaltou que não há nada na volatilida­de recente que indique fragilidad­es no sistema financeiro americano ou global. Para Bolle, o mercado está corrigindo “exageros”, ao mesmo tempo em que busca um patamar de preços em linha com a alta de juros, que deve ser gradual. Ao mesmo tempo em que se beneficiam do maior cresciment­o das economias desenvolvi­das, os mercado emergentes podem sofrer com a redução de fluxo de capitais decorrente dos mais elevadas nos países ricos, disse Bolle.

“Devemos ter mais um ou dois dias de grandes variações, até que as pessoas se ajustem ao que ocorreu. Depois disso, a volatilida­de deve diminuir, mas não para os patamares recentes.”

ESTRATEGIS­TA-CHEFE DO

BANCO DE INVESTIMEN­TOS ACADEMY

SECURITIES

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