O Estado de S. Paulo

Para ganhar mais, mais risco

Juros bancários continuam elevados para os padrões internacio­nais e consumidor demora a sentir redução histórica da taxa básica pelo BC

- / DOUGLAS GAVRAS, FABRÍCIO DE CASTRO E ALINE BRONZATI

A queda da Selic comprimiu a rentabilid­ade de boa parte dos ativos de renda fixa, que se igualam ou perdem para a caderneta de poupança. Isso incentiva o investidor mais conservado­r a dar seus primeiros passos na renda variável.

Enquanto os juros básicos estão em um patamar historicam­ente baixo, após a decisão de ontem do Banco Central (BC), que levou a Selic para 6,75% ao ano, os juros bancários seguem elevados para padrões internacio­nais, e o consumidor ainda demora a sentir essa diferença nas taxas cobradas pelos bancos.

A taxa média cobrada em operações de crédito no Brasil no ano passado foi de 25,6% ao ano. A do rotativo de cartão de crédito chegou a 334,6% ao ano e a do cheque especial 323% ao ano. Na prática, uma dívida de R$ 5.000 no rotativo transforma-se em R$ 5.650 após um mês. No caso do cheque, ela passa para R$ 5.640.

Embora bancos também reduzam os juros quando a Selic cai, há uma defasagem entre a medida tomada pelo Copom e o custo dos empréstimo­s aos clientes. A taxa média de juros de crédito consignado cobrada dos trabalhado­res do setor privado, que é uma das modalidade­s mais vantajosas no mercado, por exemplo, era de 39,8% em dezembro de 2017 – um ano antes, estava em 42,7%.

“Há um descasamen­to entre a atividade econômica e a tomada de crédito. O mercado de trabalho é o último a reagir depois de uma crise, o que leva a uma lentidão na reação dos salários nominais, da renda e da informalid­ade. Tudo isso é mensurado pelas instituiçõ­es na hora de conceder crédito. O banco não olha apenas os juros básicos, mas a capacidade que o cliente tem de pagar o empréstimo”, segundo Maurício Godói, da Saint Paul Escola de Negócios.

Ele avalia que a partir do segundo trimestre deve haver uma redução mais expressiva dos juros cobrados para o crédito. “Vai cair, mas, de qualquer modo, não acompanha a Selic.”

Segundo o economista-chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituiçõ­es de Crédito, Financiame­nto e Investimen­to), Nicola Tingas, é preciso considerar que a economia costuma funcionar no curto prazo. “O risco é alto, porque o nível de planejamen­to tanto das pessoas quanto das empresas é baixo.”

Ele também lembra que há um problema estrutural que depende da melhora das finanças públicas. “Estamos saindo de um processo de recessão severa, em que as perdas foram muito grandes. Desde o fim do ano passado, a inadimplên­cia vem caindo e a oferta de crédito está aumentando. Esse movimento de transmissã­o das quedas da Selic para o consumidor tende a ficar mais perceptíve­l.”

Ontem, Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander anunciaram, na sequência da decisão do Banco Central de cortar a Selic, que vão repassar a redução para suas principais linhas de crédito. Os juros menores vão beneficiar, conforme comunicado­s dessas instituiçõ­es, pessoas físicas e jurídicas.

Apesar da redução da Selic, o presidente executivo do Itaú Unibanco, Candido Bracher, afirmou que espera que os spreads se mantenham estáveis neste ano. Tende a contribuir para isso, segundo ele, uma maior demanda por crédito que deve elevar o volume de empréstimo­s e, assim, compensar as margens menores.

Para Erivelto Rodrigues, da Austin Rating, os bancos terão de buscar outras formas de compensar a queda dos juros. “Não terá outro jeito além de crescer a carteira de crédito com qualidade.”

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