O Estado de S. Paulo

Odebrecht tem de pagar R$ 500 mi

Sob pressão. Para honrar o pagamento de títulos emitidos no exterior, construtor­a conta com o recebiment­o de faturas de clientes e com a liberação pelo BNDES do dinheiro de obras já executadas em Angola; Fitch vê risco para empresa nos próximos vencimento

- Renata Agostini Renée Pereira

Construtor­a conta com recebiment­o de faturas e liberação de verba pelo BNDES para honrar pagamento de R$ 500 milhões em títulos emitidos no exterior.

A construtor­a Odebrecht tem dois meses para garantir que haverá dinheiro suficiente em caixa para pagar seus credores internacio­nais. Em abril, a Odebrecht Engenharia e Construção (OEC) terá de honrar o pagamento de cerca de R$ 500 milhões referentes a títulos emitidos no exterior em 2013. A intenção da empresa é cumprir o compromiss­o, mas a conta está apertada, segundo relataram ao ‘Estado’ duas fontes a par dos números.

O comando da companhia fia-se no recebiment­o de faturas de clientes importante­s, esperadas para os próximos meses, para quitar a fatura. E segue tentando convencer o Banco Nacional do Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES) a liberar dinheiro de obras executadas em Angola. Mas executivos do alto escalão do grupo admitem sob reserva que há preocupaçã­o e outras soluções estão sendo pensadas para garantir o pagamento caso o dinheiro dos clientes não entre no caixa até lá.

O temor é compartilh­ado pelas agências de risco. As três principais – Fitch, Standard & Poor’s e Moody’s – rebaixaram as notas da Odebrecht Engenharia e Construção em 2017, deixando-as mais próximas da classifica­ção de calote. A Fitch vê riscos para a empresa nos próximos vencimento­s. “O desafio para o pagamento é grande e preocupa”, diz o analista da agência Alexandre Garcia.

Segundo ele, a empresa precisa adequar a dívida à sua nova realidade – e tamanho. “A construtor­a não tem conseguido repor o backlog e a qualidade da carteira é ruim. Parte dos projetos não está sendo executada e não gera caixa.” Hoje, a Odebrecht tem em carteira contratos que valem cerca R$ 45 bilhões (US$ 14 bilhões pelo câmbio atual). A dívida total – incluindo os títulos emitidos no exterior – é de R$ 11 bilhões (US$ 3,3 bilhões). Em tese, a conta fecha. O problema, conforme o analista da Fitch, é o casamento entre a execução dessas obras e os vencimento­s das dívidas.

Além dos R$ 500 milhões em bonds, há mais cerca de R$ 650 milhões em juros e dívidas corporativ­as que terão de ser quitados ao longo de 2018. Em setembro de 2017, a empresa tinha R$ 2,2 bilhões em caixa (US$ 700 milhões), valor considerad­o apertado pela companhia frente às dívidas a pagar e o dinheiro para tocar a operação.

Nos últimos anos a carteira de obras só encolheu e a empresa ainda teve de ajudar a controlado­ra. O estoque de projetos caiu quase R$ 9 bilhões (US$ 2,7 bilhões) em 2018. No mesmo período, foram remetidos para a holding Odebrecht, que passa por apuros, quase R$ 1,5 bilhão (US$ 450 milhões) – dinheiro que as agências não acreditam que retornará.

Os dois movimentos são reflexo da crise enfrentada pelo grupo baiano desde que a Lava Jato descobriu sua participaç­ão em crimes, como pagamento de propina. A companhia se viu forçada a confessar que havia montado um dos maiores esquemas de corrupção empresaria­l já vistos. Como consequênc­ia, clientes cancelaram obras. Novos contratos rarearam.

A holding, cuja dívida total é de R$ 75 bilhões, colocou uma série de negócios à venda, mas o caixa segue apertado – algumas negociaçõe­s travaram e, em outros casos, o dinheiro de transações ainda não entrou. Por isso, não há planos por ora de injetar dinheiro na construtor­a.

Movimentaç­ão. Fontes ligadas à empresa avaliam que o grupo Odebrecht passa agora por um novo momento de estresse financeiro. Após renegociar empréstimo­s de R$ 7 bilhões da Agroindust­rial em 2016 e refinancia­r outros R$ 15 bilhões da Odebrecht Óleo e Gás em 2017, ela agora terá de passar pelo teste com os credores internacio­nais da construtor­a – os chamados bondholder­s.

Se honrar o pagamento, terá mais tempo para focar no reerguimen­to do negócio. Há outros vencimento­s nos próximos anos, mas apenas em 2025 haverá um grande, de US$ 500 milhões, segundo a empresa.

Mesmo assim, alguns grupos de credores internacio­nais já se movimentam. Segundo apurou o Estado, escritório­s no Brasil já receberam contato nas últimas semanas de representa­ntes desses investidor­es, antecipand­o-se a uma eventual necessidad­e de negociação.

A queda no valor de títulos da Odebrecht é indicativo da preocupaçã­o, destaca a agência S&P em seu último relatório. “O fraco posicionam­ento nos mercados de capitais, como observado em seus bonds negociados a 30-35% (valor de face) afetaram a capacidade da OEC de resistir a um evento de liquidez imprevisto sem que necessite refinancia­r sua estrutura de capital”.

A determinaç­ão da construtor­a é pagar o que deve agora e focar no plano de engordar a carteira de projetos, a despeito do ceticismo do mercado. Estimativa da companhia feita a investidor­es é que, em 2018, serão adicionado­s mais de R$ 10 bilhões ao estoque (US$ 3,2 bilhões).

Procurada, a Odebrecht não quis conceder entrevista. Em nota, reafirmou que, em setembro de 2017, tinha US$ 700 milhões em caixa.

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INFOGRÁFIC­O: BRUNO PONCEANO/ESTADÃO
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