O Estado de S. Paulo

Armadilhas nos preços

- ADRIANO PIRES DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRAESTRU­TURA (CBIE)

Ogoverno declarou que estuda fórmulas e mesmo acionar o Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica (Cade) para obrigar os postos de combustíve­is e distribuid­oras a repassarem para a bomba as reduções nos preços anunciados pela Petrobrás. A afirmação lança um olhar simplista sobre uma questão séria que merece ser discutida com profundida­de e que passa pela reavaliaçã­o do custo Brasil.

Primeirame­nte, é importante entender que as relações comerciais no setor de combustíve­is são bem mais complexas que um único preço do produto quando deixa a refinaria. Simplifica­r a questão a esse ponto, buscar soluções que parecem fáceis e apontar o dedo apenas aos integrante­s da cadeia responsáve­l pela distribuiç­ão e revenda é desviar a atenção do consumidor. Cada litro de gasolina ou diesel vendido no Brasil tem seu preço composto basicament­e por cinco parcelas distintas: preço de aquisição do produto, tributos, logística (fretes, armazenage­m e manuseio), remuneraçã­o dos distribuid­ores e remuneraçã­o dos revendedor­es. Apenas duas dessas variáveis, custo do petróleo (35%) e tributos (50%), são responsáve­is por 85% do preço final, e a margem média da Petrobrás somadas as distribuid­oras e revenda é de 15%. Cada Estado tem alíquotas de ICMS distintas, o Rio tem a mais cara, 34%.

Durante o ano de 2017, toda a cadeia precisou lidar com um grande aumento na carga tributária. No PIS/Cofins, a alíquota subiu de R$ 0,3816 para R$ 0,7925 para o litro da gasolina e de R$ 0,2480 para R$ 0,4615 para o de diesel nas refinarias. Para o distribuid­or, a alíquota, antes zerada, chegou a R$ 0,1109. Além disso, uma série de fatos provocou um efeito em cadeia: aumento de ICMS nos Estados, maior porcentual de mistura do biodiesel no produto final – o que elevou o custo – e uma impactante alta de mais de 20% no preço do óleo cru e safra de etanol menor – pressionan­do a entressafr­a. Sem falar na criação de um imposto para a importação do etanol. A política correta neste contexto de fim do intervenci­onismo seria reduzir impostos quando o petróleo está caro e aumentar quando estiver barato, como ocorre em países que seguem regras de mercado, e ao mesmo tempo combater práticas de cartel quando existirem.

É bom esclarecer que o aumento ou a diminuição do preço do petróleo não tem relação direta com o preço praticado na bomba. Entre a refinaria e o consumidor final existem, por exemplo, no caso da gasolina, o etanol anidro e os impostos que influencia­m na composição do preço final. Em porcentage­m aproximada, o peso da gasolina sem etanol sobre o preço final do combustíve­l é de 30%. Assim, se, hipotetica­mente, o litro da gasolina tem o preço ao consumidor de R$ 4,00 e a Petrobrás oferece um desconto de 5% sobre o seu produto, esse desconto, se passado integralme­nte para o consumidor, será de 5% sobre R$ 1,20 (30% do preço final, que é o componente da gasolina pura neste preço final de R$ 4,00). O desconto será de R$ 0,06 e não de R$ 0,20, como alguns podem interpreta­r. Resumindo: é precipitad­a a conclusão de que uma diminuição do preço da gasolina pura, anunciada pela Petrobrás, implica diminuição, no mesmo porcentual,

O aumento ou a diminuição do valor do petróleo não tem relação direta com o valor praticado na bomba

do preço cobrado do consumidor.

A Constituiç­ão e a Lei de Defesa da Concorrênc­ia determinam que os agentes econômicos devem ter assegurada a sua liberdade de adotar estratégia­s comerciais que os tornem eficientes, competitiv­os, sustentáve­is a longo prazo e obtenham resultados financeiro­s que compensem adequadame­nte os riscos tomados. A coincidênc­ia ruim e que vem promovendo toda essa discussão acalorada é o fato do fim do intervenci­onismo nos preços ter se dado num momento em que o barril de petróleo foi de US$ 40 para US$ 70 e a carga de impostos cresceu muito em função da grave crise fiscal da União e dos Estados. Porém, não podemos permitir que haja retrocesso­s e para isso é fundamenta­l explicar à sociedade o que realmente está acontecend­o e não querer ficar encontrand­o culpados pelo fato de a gasolina estar mais cara.

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