O Estado de S. Paulo

Denúncia eleitoral contra Cristiane Brasil parou em 2010

Deputada é suspeita de coação de eleitores; acusação foi enviada ao MP eleitoral em 2010 e desde de então não teve movimentaç­ão

- Constança Rezende / RIO

A suspeita de associação ao tráfico na campanha eleitoral de 2010 contra a deputada e ministra nomeada Cristiane Brasil (PTB-RJ) nunca foi investigad­a na esfera eleitoral. A denúncia, que consta no inquérito da Polícia Civil revelado pelo Estado no último dia 3, foi recebida no TRE do Rio e enviada ao Ministério Público. A Procurador­ia Regional Eleitoral, porém, nega ter registro da denúncia.

As suspeitas de associação ao tráfico durante a campanha eleitoral de 2010 contra a deputada federal e ministra nomeada Cristiane Brasil (PTBRJ) nunca foram investigad­as na esfera eleitoral. A denúncia é de uma suposta coação de eleitores e consta de inquérito criminal da Polícia Civil revelado pelo Estado no dia 3.

As acusações foram recebidas pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) em 10 de agosto de 2010 e, nove dias depois, enviadas ao Ministério Público Estadual. O procedimen­to correto seria a abertura de um procedimen­to investigat­ório, o que não ocorreu. Ao Estado,a Procurador­ia Regional Eleitoral admitiu não ter registro da denúncia. Em 19 de agosto de 2010, a denúncia chegou ao 7.º Centro de Apoio Operaciona­l do Ministério Público Estadual, segundo registro do Tribunal. E, conforme a movimentaç­ão eletrônica, está lá até então.

O MP estadual negou ter conhecimen­to da denúncia e afirmou, em nota, que as eleições gerais de 2010 eram de responsabi­lidades da Procurador­ia Regional Eleitoral. A Promotoria disse ainda que “não localizou nenhum outro procedimen­to senão aquele inquérito policial remetido ao MPF no dia 26/1” revelado pelo Estado.

A Procurador­ia, por sua vez, declarou que a denúncia não chegou ao órgão. De acordo com a instituiçã­o, em casos como o envolvendo a deputada, o MP Estadual usualmente abre o procedimen­to, verifica que não é sua atribuição direta, por ser matéria eleitoral, e o remete à PRE. Esse procedimen­to, aparenteme­nte, não foi concluído, porque a Procurador­ia Eleitoral não tem registro de ter recebido os documentos e não abriu inquérito para apurar crime eleitoral nesse caso.

Secretaria. Cristiane, que na época era vereadora licenciada e secretária municipal de Envelhecim­ento Saudável da capital, não se candidatou em 2010, mas naquele ano apoiou a candidatur­a do deputado estadual Marcus Vinicius (PTB) – então seu cunhado – à reeleição. Ela se candidatou e foi eleita deputada em 2014. Cristiane e Vinicius negam as acusações.

A denúncia acusa Cristiane de repassar dinheiro a traficante­s que controlava­m comunidade­s do bairro de Cavalcanti, na zona norte do Rio, reduto eleitoral da parlamenta­r, em troca de apoio na região. Além dela e de seu ex-cunhado, outros três assessores da deputada também foram apontados como envolvidos no caso. As acusações incluem supostas ameaças a moradores que fariam propaganda para outros candidatos e a líderes comunitári­os que teriam resistido a apoiar a petebista.

Ouvidoria. Denúncias sobre a suposta ação da deputada e seu grupo em Cavalcanti foram encaminhad­as em 2010 às Ouvidorias da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual. Elas geraram um inquérito na Polícia Civil, que ouviu Marcus Vinicius e expediu uma intimação para convocar Cristiane, vereadora licenciada na época, a depor. Esse depoimento nunca aconteceu, e a investigaç­ão pouco avançou, ao longo de oito anos.

Depois que o Estado procurou a Polícia e o MP Estadual e questionou sobre as investigaç­ões, a Procurador­ia de Justiça do Rio anunciou que enviaria os autos para o Ministério Público Federal. O MPF encaminhou o material para a Procurador­iaGeral da República, em Brasília, porque Cristiane é deputada federal desde 2015 – três anos após a posse no mandato. Como parlamenta­r, ela tem direito a foro especial no Supremo Tribunal Federal.

Os autos enviados à PGR têm anexados apenas um mapa das ruas de Cavalcanti, obtido na internet, um perfil de Cristiane do Wikipédia e uma galeria de fotos da deputada na escola de samba do bairro. Essas imagens foram tiradas da página da parlamenta­r na internet.

Um dos assessores de Cristiane na época supostamen­te envolvido no caso foi identifica­do na denúncia como Alexandre Dum. Ele é acusado de invadir casas dos moradores do bairro para forçá-los a arrancar cartazes de candidatos adversário­s de Marcus Vinicius.

Ao abordar agressivam­ente os moradores, Dum e outros, segundo a denúncia, diriam agir “a mando de Zezito”. Este seria José da Silva Miguel Filho, chefe do tráfico no Morro da Primavera, no mesmo bairro. Ligado à facção criminosa Amigos dos Amigos, é foragido do sistema penitenciá­rio, porque em 2007 passou para o regime semiaberto e não retornou ao presídio.

‘Campanha difamatóri­a’. Cristiane afirmou, por meio de sua assessoria, que não concorreu às eleições de 2010, quando era secretária municipal, e disse que foi alvo de denúncia anônima e infundada. Lembrou que não chegou a ser ouvida na investigaç­ão e afirmou sofrer uma “campanha difamatóri­a”. Essa afirmação também é sustentada por seu pai, o presidente do PTB, Roberto Jefferson.

Marcus Vinicius negou em depoimento envolvimen­to com criminosos. O Estado não localizou Alexandre Dum, nem seu advogado. A Polícia Civil alegou que o inquérito criminal sobre associação ao tráfico é sigiloso e não comenta sobre o caso.

 ?? JOÃO RICARDO /PTB-29/11/2017 ?? Congresso. Deputada Cristiane Brasil durante sessão da Comissão de Relações Exteriores
JOÃO RICARDO /PTB-29/11/2017 Congresso. Deputada Cristiane Brasil durante sessão da Comissão de Relações Exteriores

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil