O Estado de S. Paulo

Cresce exportação de gado vivo

Pecuária. De olho na demanda por animais vivos em países de religião islâmica, frigorífic­os como o Minerva trabalham para ganhar mercados como Malásia e Indonésia, em uma atividade que cresce 20% ao ano; ONGs, no entanto, querem voltar a barrar embarques

- Fernando Scheller

Na mira de entidades de defesa animal, atividade registra expansão de 20% ao ano, impulsiona­da por negócios com países de religião islâmica.

A venda de gado vivo por frigorífic­os brasileiro­s ganhou os holofotes no início deste mês, quando duas organizaçõ­es não governamen­tais conseguira­m decisões judiciais que impediram que um navio carregado com 25 mil animais seguisse viagem à Turquia. A embarcação acabou sendo liberada, em função de um recurso do governo federal. O caso jogou luz sobre um setor que vem crescendo cerca de 20% ao ano e se tornou alternativ­a de receita para pecuarista­s e empresas de alimentos, como a Minerva Foods. Entidades ligadas ao bem-estar animal, porém, pretendem continuar a tentar barrar a atividade.

Embora a venda de gado vivo seja uma prática antiga, esse segmento da pecuária ganhou força no início desta década, quando as vendas externas chegaram a 690 mil animais. De 2010 a 2012, o principal destino dos bois brasileiro­s eram os frigorífic­os da Venezuela. Com a severa crise econômica do país vizinho, as vendas despencara­m em 2015. Para viabilizar o negócio, pecuarista­s acharam um novo cliente: o mercado de religião islâmica. De 2016 para cá, as vendas voltaram a subir, até atingirem US$ 263 milhões em 2017, segundo o Ministério do Desenvolvi­mento, mas ainda bem longe do auge em volume (veja quadro nesta página).

É um número pouco relevante diante dos abates anuais no País, que somam entre 35 milhões e 40 milhões de cabeças por ano, diz César Castro Alves, analista de pecuária da MB Agro. A fatia de 1% dos abates, na visão do especialis­ta, não deve subir de forma significat­iva, pois o mercado global de bovinos vivos não cresce de forma significat­iva – o total movimentad­o está estacionad­o em cerca de 5 milhões de cabeças por ano. “É um nicho alimentado por questões religiosas. Pode ser boa opção para quando os preços estão ruins, pois vender boi vivo não agrega valor ao produto”, aponta Alves.

Alvo. Apesar de o mercado como um todo não crescer, tanto empresário­s quanto o Departamen­to Americano da Agricultur­a (USDA) preveem altas de 20% a 30% nas exportaçõe­s brasileira­s em 2018. A Minerva Foods, dona da carga que foi retida em Santos, domina cerca de

40% das vendas de animais vivos – segmento em que as líderes em bovinos no País, JBS e Marfrig, não atuam. Procurada, a Minerva não deu entrevista.

Uma explicação para o interesse no negócio é o fato de os países muçulmanos pagarem prêmios sobre a cotação de referência do gado. Uma fonte ligada às exportador­as esclarece que os compradore­s exigem raças específica­s – o gado Nelore, símbolo do plantel brasileiro, não é aceito em países muçulmanos, que preferem a raça Zebu. Diante das exigências, é necessário esforço para angariar animais para a venda externa, o que acaba se refletindo no preço pago pelo comprador. Entre as outras empresas nacionais com atuação relevante na exportação de gado vivo estão Mercúrio e Agroexport.

Para crescer, os empresário­s se movimentam para abrir novos mercados. Hoje, mais da metade das vendas brasileira­s são para a Turquia. Missões comerciais, no entanto, já buscam clientes na Malásia e na Indonésia – dois países hoje atendidos sobretudo pela Austrália. A avaliação é que, se a estratégia der certo, as vendas de gado vivo podem crescer mais 50%, para 600 mil unidades por ano, até 2023.

Reação. Porém, entidades como o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal e a Agência de Notícias de Direitos dos Animais (Anda), que conseguira­m suspender a venda de boi vivo por alguns dias, não estão dispostas a arredar pé da tentativa de paralisar o setor. “Nossa luta é pelo respeito aos animais, que não estão contemplad­os nas regras de exportação brasileira­s, que se limitam a aspectos sanitários”, diz Vânia Plaza Nunes, médica veterinári­a e diretora técnica do Fórum Animal. A briga com os frigorífic­os é de longo prazo. Segundo ela, novos recursos para voltar a paralisar as vendas de gado vivo serão apresentad­os nas próximas semanas.

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